Jornal Estado de Minas

DA ARQUIBANCADA

Obrigado, Skank! Nunca mais será só uma partida de futebol



Quando um ídolo pendura as chuteiras, estando ainda no auge de uma carreira consagradora, fica uma interrogação no lugar dedicado à paixão dentro do nosso peito. Uma espécie de choro preso; de pedido em forma de oração para tudo não passar de um “até breve”. Quando o Skank – a banda mais cruzeirense de todos os tempos – nos disse “adeus” em plena Toca da Raposa 3 – o Mineirão, domingo passado, senti vontade de pedir um bis ao modo da arquibancada: “Mais um! Mais um!”

A combinação entre música, futebol-arte, genialidade e alegria sempre esteve no âmago da relação umbilical do Cruzeiro com sua torcida. Desde o lindíssimo hino da Società Sportiva Palestra Italia, composto por Tolentino Miraglia e Arrigo Buzzacchi, e que diz “Porque se de fato / Na luta renhida / Tão bela partida / Soubemos ganhar / Não temos conosco /Razão que nos há / De cortar a amizade / e os ódios gerar”.





Continuou na obra-prima do maestro palestrino Jadir Ambrósio, que ao compor o hino do Cruzeiro, previa o porvir das nossas “páginas heroicas e imortais”. Na sequência, descoberta por ele também, veio o furacão Clara Nunes com sua eterna paixão pelo azul e branco.

Contamos ainda com a maior voz da música brasileira, Milton Nascimento, cruzeirense do interior mineiro. Assim como o saudoso Gonzaguinha, velado sob o seu amado manto sagrado das cinco estrelas (e de quem Samuel Rosa gostaria de ver a Nação Azul entoando suas canções).

Seguimos também com o chorinho de Ausier Vinícius, o trompete de João Vianna e o rock de Maurinho Berro D’água. Ainda fomos brindados com a incrível versão contemporânea da banda Virna Lisi – de César Maurício – para o nosso hino. Até o rap de Das Quebradas.





Esses são apenas alguns das centenas de músicos, artistas geniais e alegres cruzeirenses que fizeram nossa imagem resplandecer como acordes celestiais. Não coloco o Skank (e tampouco a própria banda aceitaria tal ousadia) acima de nenhum deles. Porém, é inegável que Samuel Rosa, Henrique Portugal, Lelo e Haroldo souberam materializar o termo popular “jogar por música”.

Henrique, inclusive, de 2011 a 2017, emprestou o seu dedilhar a esse espaço do Jornal Estado de Minas, o qual eu herdei dele a missão de manter vivo com meus rabiscos. Em suas crônicas apaixonadamente azuis celestes, ele sempre exaltava de forma leve a dádiva de ser Cruzeiro, mesmo tendo do outro lado Da Arquibancada sistemáticos ataques homofóbicos e provocações baixas e bobas da Turma do Sapatênis. Ele escrevia como o mesmo talento natural do Skank para espalhar alegria para todas e todos.

Já no concreto do Mineirão, outro integrante do Skank se tornou eterno símbolo do maior patrimônio do Cruzeiro: a sua torcida. Samuel Rosa honra o legado deixado por Salomé, a maior torcedora do mundo. Vê-lo nas arquibancadas é bailar como Joãozinho; guerrear como Sorín; ser genial como Ronaldo; romper qualquer barreira como Ninão Fantoni e gritar gol com a fúria de um petardo de Nelinho. Samuel, se Alberto Rodrigues me permite, é o Vibrante das Arquibancadas.





A “ficha” do pendurar palhetas, teclados e baquetas do Skank ainda não caiu, assim como os inacreditáveis gols de Joãozinho, Mário Tilico e Geovanni. Mesmo alegres, ainda estamos pasmos como o adeus.

Ao se despedir desse espaço, no dia 12 de julho de 2017, Henrique Portugal, escreveu: “...meu ciclo neste espaço chegou ao fim. Assim como às vezes precisamos trocar de técnico, está na hora de um outro torcedor ocupar o meu lugar”.

Pois é nessa mesma arquibancada das letras que herdei dele que, em nome da Nação Azul, deixo o nosso “muito obrigado” a essa banda, que assim como a camisa do Cruzeiro, já entrou para a história como Patrimônio Imaterial de Minas Gerais. O Skank sempre será a trilha sonora das mais lindas partidas de futebol.