As denúncias do deputado Luis Miranda (DEM-DF) e de seu irmão – Luis Ricardo – pegaram o governo Bolsonaro completamente desprevenido. Nessa mesma semana, não por acaso, o ministro Ricardo Salles deixou o governo e o Ministério da Economia apresentou mais detalhes relevantes da sua proposta para a reforma tributária. As manchetes na imprensa terminaram divididas com tantos fatos relevantes, mas a estranha operação de compra da Covaxin deixou a sombra da corrupção sobre o governo Bolsonaro, que justamente se vangloria de retidão no trato da coisa pública.
Luis Miranda, que até recentemente era parceiro de motociata do presidente, está longe de ser acima de qualquer suspeita. Antes de ser político era conhecido por ter um canal no YouTube no qual dava dicas de como empreender e morar no exterior – ele próprio residia nos Estados Unidos.
Em 2019, o programa Fantástico, da TV Globo, ouviu 25 pessoas que diziam ter sido enganadas por Miranda. Ele teria prometido lucros de investimentos que nunca ocorreram. Ainda assim, Miranda obteve 65 mil votos, com um discurso muito alinhado com o do atual presidente. Na próxima eleição, Miranda dificilmente subirá no palanque de Bolsonaro.
Em 2019, o programa Fantástico, da TV Globo, ouviu 25 pessoas que diziam ter sido enganadas por Miranda. Ele teria prometido lucros de investimentos que nunca ocorreram. Ainda assim, Miranda obteve 65 mil votos, com um discurso muito alinhado com o do atual presidente. Na próxima eleição, Miranda dificilmente subirá no palanque de Bolsonaro.
Em relação às eleições, os fatos trazidos pelos Mirandas chegam no mesmo momento em que o ex-presidente Lula aparece vencendo a próxima eleição no primeiro turno, segundo a pesquisa do Ipec liberada na última sexta-feira. Nenhum desses dois fatos – nem a denúncia e nem o resultado da pesquisa – estão sob o controle do governo. Já a saída de Salles e a liberação da nova proposta do Ministério da Economia para a reforma tributária, sim.
Todos sabem que a presença de Salles no governo só se sustentava pela necessidade de manter um ministro alinhado com a base de apoio mais ideológica de Bolsonaro, bem como pela teimosia do presidente. O inquérito que corre no Supremo Tribunal Federal (STF) já havia tornado a permanência de Salles no Ministério completamente insustentável.
Além do cargo, Salles perdeu por decisão do STF o passaporte e havia perdido o celular e os sigilos fiscal e bancário. Com a saída de Salles do governo, seu inquérito poderia passar para primeira instância, se livrando do ministro Alexandre de Moraes. No entanto, Moraes avalia manter o inquérito no STF, o que representa um risco real de a situação de Salles se complicar bem rapidamente perante a Justiça.
Além do cargo, Salles perdeu por decisão do STF o passaporte e havia perdido o celular e os sigilos fiscal e bancário. Com a saída de Salles do governo, seu inquérito poderia passar para primeira instância, se livrando do ministro Alexandre de Moraes. No entanto, Moraes avalia manter o inquérito no STF, o que representa um risco real de a situação de Salles se complicar bem rapidamente perante a Justiça.
Entregar um aliado para tirar o foco de um fato mais grave não é novidade nem nesse governo e muito menos na política em geral, mas o esforço para pautar o noticiário foi além. O ministro da Economia, Paulo Guedes, fez pessoalmente a entrega da segunda fase da reforma tributária ao Congresso Nacional. O texto propõe o retorno da tributação do Imposto de Renda sobre a distribuição de lucro e dividendos com alíquota de 20%. A tributação irá financiar a recente isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física, que passará de R$ 1,9 mil para R$ 2,4 mil por mês.
A vida da maioria dos leitores muda pouco com a saída de Salles, mas provavelmente todos serão impactados ou pela isenção do IRPF e/ou pela tributação de dividendos. Assim, é impossível ignorar a proposta do governo. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), foi rápido em se manifestar favoravelmente ao texto, inclusive já nomeando os dois relatores que deverão tratar do tema. Considerando o empenho de Lira em pautar temas de interesse do governo, existe chance de que a proposta do governo de fato avance.
Voltando às denúncias, as acusações dos irmãos Miranda terminam por dar fôlego para a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), que começava a perder o interesse do público. Antes, a CPI era centrada na incompetência, no negacionismo do governo Bolsonaro e nas intermináveis discussões sobre cloroquina.
Agora, trata-se de uma apuração de supostos atos de corrupção, antes adstrita aos governos estaduais. Os efeitos colaterais dessa estranha operação de aquisição da Covaxin parecem ter sido a queda de um ministro e a retirada do armário da reforma tributária, além de ressuscitar uma CPI. Mais ainda pode estar por vir.
Agora, trata-se de uma apuração de supostos atos de corrupção, antes adstrita aos governos estaduais. Os efeitos colaterais dessa estranha operação de aquisição da Covaxin parecem ter sido a queda de um ministro e a retirada do armário da reforma tributária, além de ressuscitar uma CPI. Mais ainda pode estar por vir.