Foi a miss�o de ensinar que apontou meu destino. Como professora de escola rural, “vi” meus alunos escondendo no mato a merenda que traziam. Senti-me no direito de “vasculhar” esses guardados e compreendi que nossa cultura alimentar estava ali, mas que t�nhamos vergonha dela. Dali pra frente me tornei determinada a colocar cada um daqueles alimentos rel�quias sobre a mesa. Com a ajuda dos seus pais, com�amos tudo coletivamente. Fazendo isso, aprendi muito mais do que ensinei.
Antes de “apear”, aqui, definitivamente, em 1990, andei Brasil afora fazendo festivais. Levamos nossos sabores mais aut�nticos para Bel�m do Par�, S�o Paulo, Piau�, Bras�lia e Rio de Janeiro, entre outras cidades.
Mas minha viagem de estreia foi para a capital. Nos anos 70, fizemos um festival de comida mineira no antigo hotel Serrana Palace. Uma ousadia �quele tempo. Pelo menos para mim. Sair de minha terra natal trazendo panelas de pedra e ferro, colheres de pau, cozinheiras, tempero, carne de lata, urucum, ora-pro-n�bis colhido de v�spera e escolhido folha a folha... Que sucesso!
Naquela �poca, falava-se pouco de cozinha mineira, respeitavam-na menos ainda. At� parentes e conterr�neos me achavam corajosa demais por mostrar, para fora, o que se comia quase �s escondidas... Seja pelo modo como apresentava nossas iguarias, seja por raz�es do meu destino, sempre achei portas abertas. Outras fui abrindo.
Quando inauguramos nossa primeira casa, o sucesso foi imediato. Batizada com meu nome – sinalizado pela frase “A arte da cozinha mineira”, em ambiente que retrata nossa arquitetura colonial e uma cozinha cem por cento nativa –, logo fomos acolhidos pela imprensa local, artistas, intelectuais, fam�lias e turistas de todos os cantos.
Muitos me perguntam: de onde vem esse ideal de preservar, divulgar aos quatro ventos nossa cozinha de raiz?. Respondo: � s� dela que sei. Ela � a “menina dos meus olhos”.
Cruzamos mares. Segui em frente preservando como uma guardi�. � nisso que acredito. Sinto-me realizada: vejo registrado em livro e vejo meus filhos seguirem minhas pegadas. Am�m!
*Dona do restaurante Dona Lucinha, nasceu no Serro (MG) e � conhecida por preservar a cozinha de raiz