Esperança dos familiares dos brasileiros mortos no Peru, em julho, o exame laboratorial feito em Lima foi inconclusivoO resultado dos laudos do Instituto de Medicina Legal da capital peruana enviado no dia 14 aos parentes do engenheiro Mário Augusto Bittencourt e do geólogo Mário Gramani Guedes mostram que os exames histopatológicos e químico-toxicológicos tiveram resultados negativos para as substâncias investigadas e amostras de tecidos estudados – cérebro, fígado, baço, pâncreas, coração, pulmão e rimIsso porque apresentavam autólise (processo pelo qual uma célula se autodestrói espontaneamente)O inquérito ainda não foi concluído e um dos suspeitos prestará novo depoimento segunda-feiraEsste foi mais um golpe para as famílias, já que os laudos dos institutos médicos legais de BH e de Campinas também não apontaram as causas da morte.
Exames nas roupas
O advogado criminalista peruano Adolfo Sánchez, contratado pela empresa Leme Engenharia, para a qual os brasileiros faziam um levantamento sobre a viabilidade de instalar uma usina hidrelétrica na selva peruana, também deverá entregar à Fiscalia Geral da cidade de Cumba, órgão semelhante ao Ministério Público, responsável pelas investigações, o resultado de um exame pericial particular feito nas roupas das vítimas As análises teriam detectado grande quantidade de resíduos gástricos e fecais nas peças de roupas, o que seria compatível com vômitos e diarreia intensosEm e-mail encaminhado aos familiares do engenheiro mineiro e do geólogo paulista, a Embaixada do Brasil em Lima afirma que o fato “fortalece a hipótese de envenenamento”.
O documento também afirma que há falhas no processo de investigação no que diz respeito à cena do crime, uma estrada abandonada perto do Rio Marañon, onde os corpos foram encontrados, e os cuidados com as amostras de tecidos encaminhadas à períciaNo documento, uma representante da embaixada ressalta o mau estado de conservação do material enviado para Lima – nove dias depois, sem conservação – e também para o Brasil e diz que o longo tempo para a realização dos testes pode ter contribuído para os resultados inconclusivosÀs famílias, a embaixada diz que a polícia local não solicitou perícia nas roupas dos brasileiros nem análise do conteúdo das câmeras fotográficas deles.
As informações sobre a perícia particular foram repassadas pelo advogado Adolfo Sánchez em encontro com diplomatas brasileiros e policiais federaisSegundo o Itamaraty, o embaixador do Brasil em Lima, Carlos Alfredo Lazary Teixeira, cobrou mais empenho do fiscal-geral da Nação, uma espécie de procurador-geral da União daquele país
A viúva do geólogo Mário Guedes continua acreditando em envenenamento
O sobrinho do engenheiro Mário Bittencourt, Felipe Bittencourt, diz que a família continua à espera de uma conclusão para o caso“Não sei qual o reflexo desse resultado inconclusivo para as investigações”, acredita.
Grupo descarta hidrelétrica
Sandra Kiefer
O grupo francês Suez, que, por meio da empresa belga Tractebel comprou a mineira Leme Engenharia, especializada em projetos de barragens, retirou de suas prioridades o projeto que estava em estudo sobre a construção de uma hidrelétrica no Rio Marañon, Norte do PeruEm nota, a empresa informa que decisão foi tomada em respeito ao engenheiro Mário Bittencourt e ao geólogo Mário Guedes
“Eles (os peruanos) conseguiram o que queriamTiraram a Suez da jogada Parece coisa de filme, uma conspiração para matar os brasileiros e acabar com os projetos de construção de hidrelétricas pelo Brasil no Peru
Desde o início, as famílias demonstraram desconfiança em relação ao mistério dos corpos, encontrados exatamente no dia da posse de Olantta Humala, em 27 de julhoO presidente peruano foi eleito com a bandeira de repensar contratos binacionais firmados entre Peru e Brasil para a construção de 20 hidrelétricas naquele país.
Análise da notícia
Famílias ficam sozinhas
Paulo Nogueira
O novo laudo inconclusivo das mortes do engenheiro mineiro e do geólogo paulista, agora do Instituto de Medicina Legal de Lima, é mais um duro golpe para as duas famíliasMais do que nunca, cabe agora aos parentes cobrar do Itamaraty que exija investigação rigorosa das autoridades peruanasAfinal, os exames foram insuficientes e a investigação parece não avançarÉ muito difícil acreditar que os dois tiveram mortes naturais quase simultâneas, uma coincidência que não combina com as suspeitas de homicídioComo um terrível quebra-cabeça, essas mortes podem ser esclarecidas com empenho e responsabilidade.
Entenda o caso
23 de julho
O engenheiro mineiro Mário Augusto Soares Bittencourt , de 61 anos,
e o geólogo paulista Mário Gramani Guedes, de 57 anos, desembarcaram em Lima e seguiram de avião para Chiclayo, no Norte do país, e de lá para Jaén, de carro, a 600 quilômetros
Eles foram fazer estudos de viabilidade para construção de uma usina hidrelétrica na região da floresta amazônica peruana.
25 de julho
O trabalho de campo começou cedoA dupla brasileira, um engenheiro e um geólogo peruanos caminharam por uma estrada abandonada por cerca de duas horas e meiaSegundo o depoimento dos peruanos, Bittencourt sentiu dor no joelho e se sentou à beira da estrada
Guedes e os colegas seguiram por um trecho de subidaQuando voltaram, meia hora depois, o engenheiro mineiro já não estava mais láGuedes, então, decidiu esperar no local pelos peruanos, que tentaram acesso por outra trilha para chegar ao Rio Marañon
Os peruanos contaram à polícia que retornaram uma hora depois e Guedes também não estava no localSegundo eles, a impressão foi de que os dois brasileiros teriam retornado para o carro e estacionado no início da estrada, onde o motorista os aguardava
De acordo com o inquérito peruano, os funcionários da SZ Engenharia só perceberam o desaparecimento quando um outro colega, responsável pela logística, levou água aos pesquisadores e comentou que não havia cruzado com os brasileiros na estrada
27 de julho
Os dois corpos foram encontrados pela polícia peruana às 8h a 100 metros da estrada principal em área de cerradoA distância entre os dois era de 200 metrosNada foi roubado e não havia marcas de violência, segundo a polícia.
Segundo o engenheiro e o geólogo peruanos, dois camponeses são investigados pela morte de Bittencourt e GuedesUm deles, Juan Zorrilla Bravo, é líder comunitário e participou de manifestações contra usinas hidrelétricasEle teria atrapalhado as equipes de busca, segundo depoimento dos peruanosO outro, Jésus Sanchéz, teria oferecido água aos brasileiros, no início da caminhada
Os corpos foram examinados no Peru, mas não havia indícios de violênciaA pedido das famílias, amostras foram trazidas para serem analisadas no BrasilSemana passada, autoridades peruanas fizeram reconstituição, com a participação de ZorrillaOs acusados já prestaram depoimento e negam envolvimento nas mortes.
31 de agosto e 1º de setembro
Amostras de vísceras e tecidos das vítimas examinadas nos IMLs de Brasília e de Belo Horizonte são inconclusivos, uma vez que o material estava em estágio avançado de putrefação.
14 de setembro
Familiares dos dois recebem o resultado do Instituto de Medicina Legal de Lima, capital peruana, recebe laudo com resultado inconclusivo sobre causa da morte.