Na frente do palco, o tecido pesado e escuro se descortina revelando mais que a plateiaOs aplausos extrapolam a cena: são o reconhecimento a crianças, jovens e adultos que no teatro resgatam sua autoestima e identidade, tornando-se protagonistas da própria históriaA improvisação, o jogo de cena, o drama e a comédia têm transformado a vida da gente simples de comunidades como o Morro do Papagaio, no Aglomerado Santa Lúcia, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, onde iniciativas como a Casa do Beco valoriza a diversidade cultural e estimula o envolvimento dos moradores em ações culturais.
O grupo, apoiado pela Secretaria de Estado de Cultura de Minas Gerais, quer promover o desenvolvimento humano e a transformação social por meio da arte, especialmente o teatroO espaço surgiu a partir do trabalho do Grupo do Beco, criado em 1995 para pesquisar o cotidiano dos moradores da favela e retratá-lo em peças, sempre colocando em debate os estereótipos de violência e os estigmas da misériaHoje, em oficinas como a Adolescer ou não, alunos do projeto Grupo de Amigos da Criança (GAC) e da Escola Estadual Dona Augusta Gonçalves Nogueira se apropriam da realidade da comunidade e fazem dela uma encenação.
A proposta deu visibilidade ao grupo, que viaja pelo Brasil com suas montagensUm dos projetos é o Teatro na Lage, em que as peças são apresentadas em cima de telhados de casas da periferiaO projeto acaba de formalizar parceria com o Instituto Unimed BH, reconhecido pelo Ministério da Cultura como o maior grupo de fomento à cultura no país a partir de recursos de pessoas físicas.
A verba que a Casa do Beco passa a receber este ano vem da doação de mais de 3 mil cooperados, que para 2013 repassaram R$ 6,7 milhões para os 23 projetos atendidos via Lei RouanetPara Orestes Miraglia Júnior, diretor institucional do Instituto Unimed BH, a ideia é dar apoio a longo prazo em vez de fazer uma grande doação e se retirar de cena“Admiramos a continuidade”, diz ele
Oficinas
Outro contemplado pelo instituto é o Galpão Cine Horto, que desde o final de 2011 desenvolve o projeto Ações Formativas na Escola Estadual Henrique Diniz, no Bairro Santa Efigênia, Região Leste da capital mineira
Voltado para crianças e adolescentes das comunidades Vila Ponta-Porã, Taquaril, Torres Gêmeas e Saudade, o projeto levou oficinas teatrais para preparar os professores para usar técnicas em diversas atividades escolares
A recém-formada Dienifher Davila Barros, de 18, foi uma das alunas envolvidas no projeto e acredita que a iniciativa mudou não só o ambiente escolar mas também aspectos pessoais de cada aluno“Fiquei mais centradaFoi uma diversão fazer teatroEle tirou aquela seriedade e pressão da escolaNa primeira vez que entrei em cena fiquei muito nervosa, mas foi muito bom ver como o público gosta da gente.”
Mudança de realidade no interior
As ações de responsabilidade social das empresas a partir da cultura estão também em outras regiões do estado
Segundo Mariana Martins Alves, diretora do Instituto Usiminas, o projeto ajuda na sensibilização e acesso aos bens culturais por um público muito carente dessa questão“Isso favorece a reflexão, provoca um pouco os adolescente a perceberem sua capacidade de imaginaçãoÉ importante na formação e desenvolvimentos das pessoasUsamos a cultura como ferramenta desse crescimento humano de cada um.” A grande vitória é ver o efeito multiplicador da iniciativa também de formação de público“Esses meninos chegam em casa e provocam os pais e mães a voltaremOcorre uma reflexão dentro de casa”, acrescenta.
Já nos vales do Jequitinhonha, do Rio Doce e do Rio São Francisco quem está promovendo a cultura e o exercício da cidadania é a Fundação ArcelorMittal BrasilSão 11 localidades beneficiadas pelo programa Desenvolvimento Comunitário, Educação e Cultura, que há cinco anos capacita gestores culturais e artistas, além de estimular a formação de grupos de teatro locaisSegundo o gerente de Arte e Cultura da fundação, Marcelo Santos, por meio do teatro as comunidades dão importância a seus valores locais
“Estimulamos a diversidade cultural e a promoção da identidade a partir da própria comunidadeO grupo Babilônia, de Marliéria, no Vale do Rio Doce, a 194 quilômetros de Belo Horizonte, é um dos que receberam a oficina de 200 horas de capacitaçãoSenhoras de 80 anos se juntam a jovens de 16 para contar histórias da cidade“Esse grupo já conseguiu um espaço para seus ensaios, elegeu uma de suas participantes vereadora e está produzindo cultura a partir da identidade localÉ um exercício de diversidadeSão jovens e idosos juntos, se apresentando nas igrejas e espaços públicos, lidando com empresas e plateia, tudo isso no mesmo arranjo.”