Deixar para trás o colo da mamãe e a comidinha com hora certa para encarar uma cidade desconhecida, além de tarefas domésticas até então inimagináveisEsses são apenas alguns dos desafios de quem está saindo de casa para começar, longe do conforto do lar, uma nova etapa da vida escolarNesses tempos de Sistema de Seleção Unificada (Sisu), em que vagas na universidade são disputadas como leilão na internet, estudar fora se torna cada vez mais natural para os brasileiros.
Em 2012 e 2013, as matrículas em instituições sediadas fora do estado de origem dos estudantes representaram 13% do total de novos registros acadêmicos, informa o Ministério da Educação (MEC)Em números absolutos, Minas Gerais foi a unidade da federação que mais recebeu alunos e, depois de São Paulo, a que mais mandou estudantes para outros estados
Detentora da maior concentração de universidades federais participantes do Sisu, Minas Gerais atrai cada vez mais estudantes de foraEm 2011, foram 1.407; ano passado, 2.437 (73% a mais), o equivalente a 22% das 11.085 matrículas feitas no primeiro semestre de 2013 em território mineiroOs dados relativos a 2014 não estão fechados, mas a expectativa é de números ainda maiores, impulsionados pela adesão da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) ao Sisu
Com a seleção mais concorrida deste ano, a UFMG registrou 52,65 candidatos por vaga e foi a segunda instituição em quantidade de inscrições (186.123)A maioria dos calouros que se mudarão para Minas virá de São PauloAno passado, foram 1.501 paulistas, seguidos por cariocas (316) e capixabas (197)Apenas na UFMG, os paulistas representam quase 10% do total de aprovados este ano.
Migração Embora Minas Gerais esteja entre os maiores “exportadores” de alunos, os números mostram que os mineiros preferem permanecer em casa
De malas prontas
O jovem Matheus Soares Cherem, de 25 anos, está de mudança para o ParanáEle conquistou o primeiro lugar geral na Universidade Federal de Integração Latino-Americana (Unila), em Foz do IguaçuVai cursar engenharia civil de infraestrutura, depois de estudar no cursinho Chromos, no ano passadoFormado em ciências sociais pela UFMG em 2011, inicialmente sua intenção era tentar uma vaga em MinasDepois de conhecer o projeto político e pedagógico da Unila, mudou de ideia
O calouro aproveitou o período de matrícula para conhecer o câmpus
Pela primeira vez Cherem vai deixar o “ninho”“Meus grandes amigos, familiares e minha história social e afetiva estão em BHSão 1,4 mil quilômetros de distânciaEssa situação é complicada e reflete o Sisu, com suas enormes falhas e também benesses”, ressaltaPor enquanto, o plano é dividir a casa com dois colegasA primeira turma da Unila ainda não se formou e, por isso, as repúblicas estão lotadasO calouro mineiro já toma as primeiras providências: guardar dinheiro e solicitar um livro de receitas às amigasPassar roupa está fora de cogitação, mas Matheus sabe que terá de lavá-las – sem escapatória
“Não tive criação de filho que recebe tudo na mãoFaço algumas tarefas domésticas, mas agora é para mim e outras duas pessoasO impacto maior é ficar longe de casa, não a labutaA gente tem de ir, tem de ralarA recepção dos colegas foi positiva, dá para contar com eles para ficar numa casa, pegar dicas de supermercadoÀs vezes, o melhor é errar e acertar depois”, diz.
Como boa mãe, Ana Laura Soares Cherem, de 57, está com o coração apertado, mas dá a maior força para MatheusQuando o caçula, o último a sair de casa, decidiu estudar tão longe, recebeu todo apoio“Até sair o resultado, a gente fica pensando se ele vai passar, se vai desistirMas ficamos muito alegres, porque é o sonho dele, uma vitória muito grande”, conta
Via-sacra em BH
Nayara de Oliveira Santos, de 18 anos, aluna do 2º período de ciências sociais da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), faz parte do contingente de 4.839 calouros que deixaram São Paulo em 2013 para estudar fora de casaA maioria veio para MinasSão Paulo é o campeão da mobilidade estudantil promovida pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu)A garota é prova de que o início pode não ser fácil, mas tudo se supera com persistência.
Quando Nayara prestou vestibular, a UFMG não havia aderido ao SisuA opção se deu pela fama do curso, considerado o melhor entre as faculdades públicasO primeiro desafio foi fazer as provas da segunda etapa, durante dois dias, sem conhecer nada nem ninguém em BHEla passou e pensou em desistir, mas acatou os conselhos para aproveitar a oportunidade
A via-sacra começou no segundo semestre do ano passadoNayara passou um mês procurando república, porque não tinha condição de arcar com os aluguéis cobrados na capitalEm três meses, Nayara morou em cinco casas – em algumas, de favorO alívio veio com a bolsa-moradia da Fundação Universitária Mendes Pimentel (Fump), no valor de R$ 400, permitindo a permanência dela em BH“Já tive de me virar com R$ 200 por mês para comer e pegar ônibus”, relataAgora, a jovem aguarda a entrevista que poderá lhe dar vaga na moradia estudantil da UFMG.
“O bom da faculdade pública é que ela oferece tudo para você ficar, mas é preciso paciênciaIa diariamente ao plantão, pedia pelo amor de Deus para me atenderem”, relembra
DICAS PARA A FAMÍLIA
Pais
» Antes da mudança, proponha tarefas domésticas básicas, como pagar uma conta, para o jovem saber como agir quando estiver sozinho
» Crie condições para desenvolver
a autonomia e a responsabilidade do jovem
» Ajude seu filho a desenvolver habilidades para resolver problemas
» Não reproduza no novo ambiente as condições de vida que seu filho tinha antes de se mudar
Filhos
» Antes de procurar ajuda familiar, tente resolver o problema, pois aprenderá a ter autonomia
» Construa uma rede de apoios no lugar para onde se mudou
Faça amizades para contar com outras pessoas
» Não se isole
» Abra-se para a nova vida
» Encare as mudanças como um novo ciclo, que lhe trará conhecimento e diversidade culturalSeu comportamento será enriquecido
FONTE: Hérika Sadi, coordenadora do curso de psicologia da Universidade Fumec