Jornal Estado de Minas

EM AGOSTO

Prédio que abrigou famoso cinema de BH é restaurado e vai virar centro comercial

Imóvel em estilo art-dèco agora será ocupado por 180 boxes ou lojas (de quatro a 31 metros quadrados), 10 quiosques e área de alimentação

Cinema popular nos anos 1990: projeto original do imóvel, no Centro, é de autoria do arquiteto italiano rafaello Berti - Foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A.Press - 19/04/1991

O imóvel em estilo art-dèco que abrigou um dos cinemas mais famosos de Belo Horizonte é restaurado para dar lugar, a partir de 1º de agosto, ao Shopping Belô, um centro comercial popular. O interior do ex-Cine México, um dos símbolos desse tipo de empreendimento no estado e que era frequentado pelas classes menos abastadas, agora será ocupado por 180 boxes ou lojas (de quatro a 31 metros quadrados), 10 quiosques e área de alimentação. Também haverá duas varandas panorâmicas.

O antigo cinema, erguido na esquina da Avenida Oiapoque com Rua Curitiba, na zona boêmia da capital mineira, foi inaugurado, em 1944, com o nome de Vitória e projeto assinado pelo renomado arquiteto italiano Rafaello Berti. São dois mil metros quadrados de área construída. O desenho original apresentava em cada torreão da fachada, em sentido vertical, a inscrição popular.

As obras, iniciadas em 23 de junho do ano anterior, foram executadas pela Sociedade Construtora Minas Moderna Ltda. O filme de estreia foi O grande motim, baseado na história real do navio H.M.S. Bounty, da marinha britânica. O enredo, que remonta a 1787, trata de um motim dos marujos contra os métodos rígidos do capitão.
A película, que ganhou o Oscar de melhor filme em 1936, foi dirigida por Frank Lloyd (1867-1959) e estrelada por Clark Gable (1901-1960).

Pouca gente sabe, porém, que o México foi inaugurado com o nome de Vitória. Apenas em 1961, depois de as exibições serem suspensas para reforma da construção, o empreendimento foi rebatizado de México. A empresa dona do cinema contratou a Pelmex Películas Mexicanas. A distribuidora exigia exclusividade de apresentação no local, o que levou os proprietários do prédio a alterarem o nome.

A crítica da época classificou a aparelhagem de som e a projeção do empreendimento como uma das mais modernas do país. Era o auge dos cinemas em BH. Outros empreendimentos do gênero eram vizinhos ao México, como o América, o Avenida e o Democrata. Todos destinados aos consumidores de renda mais baixa. As famílias com salários mais vantajosos frequentavam o Brasil e o Metrópole. Apesar de toda sua importância, o México também não resistiu ao avanço das videolocadoras e fechou as portas.

Tombamento


A construção foi tombada em nível municipal em 1994. Um estudo da prefeitura sobre o imóvel concluiu que “a importância do México deriva não só de sua atividade como ponto de lazer e encontro, mas como exemplo de uma época de novas propostas arquitetônicas. É o principal exemplar da arquitetura marajoara em Belo Horizonte, como afirma a arquiteta Celina Borges Lemos.

O texto ainda destaca que o México é “representante do geometrismo do déco, que racionalizou as alegorias indígenas, sua composição pode ser vista como uma fantasmagoria arqueológica. Sua fachada não é mais que um panorama onde se projetam várias interpretações do imaginário coletivo. Por estar localizado na zona boêmia, passou a reunir todos os tipos de pessoas, que lá iam com as mais variadas intenções, sendo que o que menos interessava era a sessão corrida de filmes”.

A decadência dos cinemas de ruas em todo o país encerrou as atividades do México, que deu lugar a um estacionamento privado na década de 1990.

Agora, o local será ocupado por um shopping popular. De olho nas cerca de duas milhões de pessoas que frequentam a região diariamente, segundo estimativa da prefeitura, empresários decidiram apostar no Shopping Belô.

“Além de ser um centro de compras, queremos que o local se torne uma nova opção de lazer e cultura em Belo Horizonte. O prédio está localizado em uma região de fácil acesso com um ambiente agradável e organizado. Ele é um pedaço importante da história da cidade e carrega as boas memórias do antigo cinema. Nossa intenção é realizar ações culturais gratuitas no Shopping Belô e levar entretenimento à população.”, comenta Eduardo Pereira, gerente geral do empreendimento.

Reforma


A restauração do local foi viabilizada pela BHC Comercial. Já o projeto ficou sob a responsabilidade dos arquitetos Eduardo Beggiato e Edwiges Leal, com a coautoria de Frederico Bicalho. Todos da B & L arquitetura. Eles decidiram pela retirada de todas as intervenções feitas em cima da fachada original. Também optaram por recuperar o revestimento original.

Tanto o piso quanto a parede do hall, espaços característicos do antigo cinema, foram restaurados. “No interior do edifício tivemos a preocupação em valorizar o espaço onde ficava a tela do cinema, como um palco, trazendo para o cenário atual as lembranças do México.
Também restauramos todos os elementos arquitetônicos que se destacam, como os frisos na parede”, explica Eduardo Beggiato.

As fachadas do imóvel ganharam painéis com imagens da Belo Horizonte da primeira metade do século passado: “Foram colocadas nos locais em que eram estampados cartazes dos filmes”, explica Eduardo. As fotos despertam a curiosidade de quem passa pela calçada, como ocorreu com o aposentado Francisco Dourado, de 71 anos, morador do Bairro Lagoinha. “Dá uma saudade grande daquela época. BH era muito mais linda!”.

LINHA DO TEMPO

20 de janeiro de 1943
O arquiteto Rafaello Berti conclui o projeto do Cine Theatro Popular

23 de junho de 1943
Início das obras do imóvel

14 de outubro de 1944
O cinema é inaugurado com O grande motim, produção de Frank Lloyd

1961
Cinema é fechado para reforma e é reaberto com o nome de Cine México

Década de 1990
O imóvel dá lugar a um estacionamento privado

10 de novembro de 1994
O prédio é tombado por lei municipal

2015
A construção passa a abrigar uma feira popular

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