O imóvel em estilo art-dèco que abrigou um dos cinemas mais famosos de Belo Horizonte é restaurado para dar lugar, a partir de 1º de agosto, ao Shopping Belô, um centro comercial popular. O interior do ex-Cine México, um dos símbolos desse tipo de empreendimento no estado e que era frequentado pelas classes menos abastadas, agora será ocupado por 180 boxes ou lojas (de quatro a 31 metros quadrados), 10 quiosques e área de alimentação. Também haverá duas varandas panorâmicas.
O antigo cinema, erguido na esquina da Avenida Oiapoque com Rua Curitiba, na zona boêmia da capital mineira, foi inaugurado, em 1944, com o nome de Vitória e projeto assinado pelo renomado arquiteto italiano Rafaello Berti. São dois mil metros quadrados de área construída. O desenho original apresentava em cada torreão da fachada, em sentido vertical, a inscrição popular.
As obras, iniciadas em 23 de junho do ano anterior, foram executadas pela Sociedade Construtora Minas Moderna Ltda. O filme de estreia foi O grande motim, baseado na história real do navio H.M.S. Bounty, da marinha britânica. O enredo, que remonta a 1787, trata de um motim dos marujos contra os métodos rígidos do capitão.
Pouca gente sabe, porém, que o México foi inaugurado com o nome de Vitória. Apenas em 1961, depois de as exibições serem suspensas para reforma da construção, o empreendimento foi rebatizado de México. A empresa dona do cinema contratou a Pelmex Películas Mexicanas. A distribuidora exigia exclusividade de apresentação no local, o que levou os proprietários do prédio a alterarem o nome.
A crítica da época classificou a aparelhagem de som e a projeção do empreendimento como uma das mais modernas do país. Era o auge dos cinemas em BH. Outros empreendimentos do gênero eram vizinhos ao México, como o América, o Avenida e o Democrata. Todos destinados aos consumidores de renda mais baixa. As famílias com salários mais vantajosos frequentavam o Brasil e o Metrópole. Apesar de toda sua importância, o México também não resistiu ao avanço das videolocadoras e fechou as portas.
Tombamento
A construção foi tombada em nível municipal em 1994. Um estudo da prefeitura sobre o imóvel concluiu que “a importância do México deriva não só de sua atividade como ponto de lazer e encontro, mas como exemplo de uma época de novas propostas arquitetônicas. É o principal exemplar da arquitetura marajoara em Belo Horizonte, como afirma a arquiteta Celina Borges Lemos.
O texto ainda destaca que o México é “representante do geometrismo do déco, que racionalizou as alegorias indígenas, sua composição pode ser vista como uma fantasmagoria arqueológica. Sua fachada não é mais que um panorama onde se projetam várias interpretações do imaginário coletivo. Por estar localizado na zona boêmia, passou a reunir todos os tipos de pessoas, que lá iam com as mais variadas intenções, sendo que o que menos interessava era a sessão corrida de filmes”.
A decadência dos cinemas de ruas em todo o país encerrou as atividades do México, que deu lugar a um estacionamento privado na década de 1990.
“Além de ser um centro de compras, queremos que o local se torne uma nova opção de lazer e cultura em Belo Horizonte. O prédio está localizado em uma região de fácil acesso com um ambiente agradável e organizado. Ele é um pedaço importante da história da cidade e carrega as boas memórias do antigo cinema. Nossa intenção é realizar ações culturais gratuitas no Shopping Belô e levar entretenimento à população.”, comenta Eduardo Pereira, gerente geral do empreendimento.
Reforma
A restauração do local foi viabilizada pela BHC Comercial. Já o projeto ficou sob a responsabilidade dos arquitetos Eduardo Beggiato e Edwiges Leal, com a coautoria de Frederico Bicalho. Todos da B & L arquitetura. Eles decidiram pela retirada de todas as intervenções feitas em cima da fachada original. Também optaram por recuperar o revestimento original.
Tanto o piso quanto a parede do hall, espaços característicos do antigo cinema, foram restaurados. “No interior do edifício tivemos a preocupação em valorizar o espaço onde ficava a tela do cinema, como um palco, trazendo para o cenário atual as lembranças do México.
As fachadas do imóvel ganharam painéis com imagens da Belo Horizonte da primeira metade do século passado: “Foram colocadas nos locais em que eram estampados cartazes dos filmes”, explica Eduardo. As fotos despertam a curiosidade de quem passa pela calçada, como ocorreu com o aposentado Francisco Dourado, de 71 anos, morador do Bairro Lagoinha. “Dá uma saudade grande daquela época. BH era muito mais linda!”.
LINHA DO TEMPO
20 de janeiro de 1943
O arquiteto Rafaello Berti conclui o projeto do Cine Theatro Popular
23 de junho de 1943
Início das obras do imóvel
14 de outubro de 1944
O cinema é inaugurado com O grande motim, produção de Frank Lloyd
1961
Cinema é fechado para reforma e é reaberto com o nome de Cine México
Década de 1990
O imóvel dá lugar a um estacionamento privado
10 de novembro de 1994
O prédio é tombado por lei municipal
2015
A construção passa a abrigar uma feira popular .