Brasília – Elas somam 7,5 milhões de pessoas, todas com um idioma próprio, uma cultura peculiar e um sonho compartilhado pela maioria: o de se tornarem parte do 48º país da Europa. O desejo da Catalunha de conquistar a autonomia é alimentado por um forte ressentimento em relação à Espanha. “Há anos, o governo espanhol pratica uma política ‘etnocida’, de destruição da cultura catalã”, afirma o empresário Xavi Domenech Llobet, de 37 anos, morador de Mataró, cidade a 25 quilômetros de Barcelona. “Por motivos sentimentais e culturais, eu me sinto unicamente catalão”, acrescentou. Na última quarta-feira, Dia Nacional da Catalunha, milhares de catalães deram as mãos e formaram uma corrente humana de 400 quilômetros de comprimento, como parte de uma campanha pela independência. As mais recentes pesquisas indicam que entre 75% e 80% da população da região espanhola desejam um referendo secessionista e que ao menos 50% votariam pela independência. "O que existe aqui é uma mobilização de rechaço, um movimento popular. Os partidos políticos se uniram a esse tsunami humano", explica Lluis Ferran Requejo Coll, cientista político da Universitat Pompeu Fabra (Barcelona), em entrevista por telefone.
De acordo com Requejo, a revolta aprofundou-se depois de 2006 na região situada, no Nordeste da Espanha. A sociedade mal teve tempo de comemorar a aprovação da reforma do Estatuto de Autonomia da Catalunha – a lei constitucional que rege as competências, instituições e direitos dos catalães. O Parlamento da Espanha rebaixou as atribuições do autogoverno. “O Partido Popular, que naquele momento fazia parte da oposição, apresentou um recurso de inconstitucionalidade, o que provocou uma reação clara e enfática. As pessoas se mobilizaram para expressar um rechaço sobre a forma com que o poder central espanhol trata as leis da Catalunha”, comenta o especialista. O déficit fiscal, uma diferente de 16 bilhões de euros entre o montante enviado pelos catalães a Madri e a devolução em forma de serviços, agravou a insatisfação. “Outra questão que reforça a postura independentista é a falta de investimentos de Madri em infraestrutura na região”, acrescenta Requejo.
Sociólogo da Universitat Autònoma de Barcelona, Salvador Cardús i Rios admite que a Espanha não concebe uma Catalunha com toda uma diversidade interna, além de adotar um projeto político assimilador e de agir como predador econômico. “A crise financeira provavelmente ajudou a acentuar o sentimento de maltrato fiscal, com uma injusta divisão das riquezas, que têm prejudicado, de forma sistemática, a Catalunha”, afirma. Segundo ele, a vontade de independência supera a dimensão econômica e se coloca como o vislumbre da possibilidade de melhorar a democracia, o bem-estar e a justiça social – algo que, na sua opinião, a Espanha é incapaz de assegurar. A Catalunha amarga um índice de desemprego de 23,85% e uma dívida de 51 bilhões de euros somente no primeiro trimestre de 2013.
Cardús aponta que as causas imediatas da ânsia separatista estão no fracasso da proposta da Catalunha para melhorar as relações com Madri, por meio da reforma do estatuto. “A maioria dos catalães considera que a Espanha se fechou ao diálogo e, por isso, eles devem buscar caminhos alternativos”, observa. Ele reconhece, porém, que o modelo autonômico ficou obsoleto, à medida que o governo espanhol recusou-se a atualizá-lo. Morador de Barcelona, Pere Arbell, de 46 anos, diz almejar a autonomia para que seu povo pare de ser tratado como “a última colônia do Reino de Castela”, uma alusão à Espanha. “Queremos deixar de padecer de um espólio sistemático e um genocídio cultural, um desprezo que vem desde o século 18”, afirma.