Vinicios Silva Melgaço
Especial para o EM
O surto de COVID-19 teve início na China e logo chegou aqui aos Estados Unidos, um dos países que mais têm movimento de pessoas e produtos, vindos de todo o mundo, bem como em saída. E, justamente por isso, quando a onda de contágios atingiu nosso país, nada parou. O comércio continuou a funcionar, as pessoas continuaram a circular e, infelizmente, o vírus também. Somente com o agravamento da pandemia é que as medidas de proteção e prevenção vieram.
A falta de leitos afetou os serviços de saúde e aqueles que buscavam por exames e consultas. Os hospitais já não estavam tendo recursos para enfrentar a pandemia. Portanto, navios foram enviados a Nova York para oferecer apoio aos cidadãos da cidade e redondezas, com a criação de mais leitos.
Além disso, médicos e enfermeiros estão realizando atendimento virtual, por telefone, visto que essa é uma forma mais segura. A partir disso, os pacientes podem informar o aparecimento de sintomas e a necessidade de procurar um sistema de saúde é indicada ou não. Parques, que antes eram destinados ao lazer, hoje são usados como centros de tratamento e testes, servindo como centros de apoio.
Finalmente, as atividades supérfluas foram proibidas e, hoje, apenas serviços essenciais à população seguem em atividade por aqui, como hospitais, farmácias, supermercados e profissionais de segurança pública, como policiais e bombeiros.
Voos não são mais permitidos, apenas particulares e em casos de emergência. Conforme recomendação, após a viagem, há a necessidade de isolamento total por 14 dias. Estão fazendo o que podem para tentar controlar o avanço da doença e acolher as pessoas da melhor forma possível, mas, mesmo assim, a situação ainda é bem difícil por aqui. Mesmo os Estados Unidos sendo um país de grande porte, ainda encontra dificuldade em cobrir tudo o que vem acontecendo.
Eu ainda estou trabalhando, visto que atuo na área de aviação e pequenos voos de emergência ainda acontecem, bem como voos particulares e, como trabalho na área privada deste segmento, ainda estou em atividade. Neste período de pandemia, tornei-me um funcionário indispensável, já que como gerente de limpeza, sou eu o responsável pela desinfecção das aeronaves e demais medidas de prevenção da doença. Durante a realização do serviço e toda a circulação de pessoas, todos precisam utilizar máscaras, luvas e óculos para que a prevenção seja feita.
Após as 20h, aqui está proibido sair às ruas. E a circulação de pessoas só volta a ocorrer no dia posterior, a partir das 5h. Ficar em casa virou ordem.
Durante o dia, ainda é possível ver uma movimentação nas ruas, já que algumas pessoas ainda precisam sair para trabalhar. No entanto, aquelas que saem sem necessidade, ou para fazer algo sem importância, estão sendo multadas. A única coisa que ainda pode se fazer, além de compras essenciais, é levar os animais domésticos para um passeio e suas necessidades fisiológicas. Fora isso, mais nada.
Assim, eu, ao sair do trabalho, vou ao supermercado e compro algumas coisas de necessidade para minha casa. Mas tem sido bem difícil encontrar alimentos, porque não tem abastecimento mais. Ainda se tem um limite na hora da compra. Só se pode comprar determinada quantidade de um produto por pessoa. Pessoas da mesma família, que dividem a moradia, não podem comprar se você já tiver comprado a quantidade limite. Isso para que todos possam ser atendidos.
Cuidado redobrado
Depois disso, vou para casa, sempre muito preocupado comigo e com as pessoas que moram em meu lar, pois tenho contato com gente vinda de todos os países no trabalho. Então, tenho tomado medidas de precaução, pois temo contrair e/ou transmitir a doença a alguém, já que nunca sei como estarei ao chegar em casa – se estarei, de fato, bem ou infectado. Assim que chego, tiro as roupas ainda na parte externa, coloco-as em sacolas, tomo um banho e ponho outra roupa. Aquelas que usei no trabalho vão para a lavagem.
Comecei a regrar minhas atitudes e contatos para evitar contaminar alguém ou mesmo ser contaminado. Tem algumas semanas que não vejo minha irmã e meu sobrinho, que também moram aqui nos Estados Unidos, para não os expor, tendo em vista a minha necessidade de ainda manter contato com outras pessoas e com a rua, devido ao meu trabalho.
Estamos perdendo muitas vidas, e a crise financeira está prestes a se instalar. Mas, mesmo com esse impacto direto nas nossas vidas e na economia do país e do mundo, consigo enxergar algum pequeno benefício que seja. As pessoas não estão dirigindo mais e a poluição diminuiu consideravelmente. Isso faz bem ao mundo e a nós. Percebemos, então, que somos nós os destruidores desse mundo. E, fica uma lição. Se, mesmo para além dessa pandemia, nos cuidarmos melhor e tivermos cautela em nossas ações, o mundo pode mudar.
Outra coisa é que reclamamos por diversas vezes das pessoas que temos por perto. Agora, que não podemos sair de casa, sentimos falta da presença humana. Começamos, assim, a perceber que não dávamos o valor correto aos nossos amigos, familiares e qualquer pessoa que seja, que sempre fez parte do seu cotidiano. Felizmente, em meio a um caos da saúde pública, nós, ao menos, valorizamos mais o próximo.
Desenvolvemos mais a empatia. Sou imensamente grato, hoje, a todas essas pessoas que estão fazendo plantão. Médicos, enfermeiros, policiais, todos transmitindo segurança nesta época tão difícil e, além de tudo, expondo sua família ao voltar para casa todos os dias sem saber se estão contaminados ou não, para nos proteger. As pessoas deveriam ser mais solidárias, não só em tempos de dificuldade como este, mas sempre. Olhar para o próximo e pensar em formas de ajudar o outro. Olhar para si e buscar a sua solidariedade e compaixão para com o outro. De fato, serem mais humanas.
PERFIL
- NOME: Vinicios Silva Melgaço
- IDADE: 25 anos
- PROFISSÃO: gerente de limpeza de aviação
- ONDE NASCEU: Newark, Nova Jersey, EUA (filho de pais brasileiros)
- ONDE MORA: Harrison, Nova Jersey, EUA