Ângela Mathylde
Psicanalista
O tabagismo é considerado uma epidemia global, combatida fortemente no Brasil. O tratamento do Sistema Único de Saúde (SUS) contra o vício, as campanhas de conscientização e as datas comemorativas, como o Dia Nacional do Combate ao Fumo, são algumas ações para conter o avanço do problema. Conforme relatório da Organização Mundial de Saúde (OMS), das 171 nações comprometidas em cumprir um plano para restringir o consumo de tabaco, só dois países atingiram as metas estabelecidas, e o Brasil é um deles. A entidade estima que 4,9 milhões de pessoas morrem, anualmente, decorrentes do cigarro, que provoca cerca de 50 doenças. Mesmo com o conhecimento sobre dados tão alarmantes e o forte combate nacional ao fumo, simplesmente, muitos brasileiros não conseguem parar de fumar.
A nicotina absorvida através do cigarro chega ao cérebro em segundos, sendo eliminada rapidamente. Quando os neurônios percebem que ela está saindo do corpo, geram ansiedade e nervosismo, a famosa crise de abstinência. Abandonar o cigarro é complicado, porque fumar é mais que um costume: é uma dependência. Quem fuma procura compensar algo que falta em sua vida através do cigarro. Enquanto o fumante não consegue trabalhar a esfera emocional, compreendendo que o problema é mais profundo que apenas um desejo, é muito difícil parar de fumar. Uma porcentagem de até 70% dos fumantes querem parar de fumar, mas, infelizmente, poucos conseguem ter sucesso. A dependência da nicotina é uma desordem de extrema complexidade que está inter-relacionada a variáveis significativas e de grande importância, como hereditárias, fisiológicas, ambientais e psicológicas.
Para conseguir se livrar desse hábito, além do tratamento medicamentoso também é preciso um acompanhamento psicológico para descobrir o que causa a dependência. O primeiro passo é reconhecer o vício e trabalhar os impactos do fumo, não só com o fumante, mas com a família, que também é afetada. Outra forma de auxílio emocional é o grupo de apoio para fumantes, já que a troca de experiências pode ser uma ferramenta valiosa para a pessoa entender a causa do problema e perceber que não está sozinha nessa luta.
Um aspecto crucial é saber reconhecer o gatilho que desperta a vontade de acender o cigarro. É comum a pessoa sentir o desejo de fumar em situações de estresse ou em momentos com carga emocional mais alta. É preciso identificar esses momentos e estar ciente de que se trata de um gatilho.
O acompanhamento psicológico é importante, não somente na luta para parar de fumar, mas também na prevenção do início do vício. As crianças com transtornos de aprendizagem não tratados, como o TDAH, por exemplo, têm mais chance de se tornar adultos fumantes, apoiando-se no cigarro para compensar a falta da estabilidade que não tiveram na infância. É recomendável trabalhar as frustrações e transtornos desde cedo para evitar o risco de desenvolver a dependência. Parar de fumar requer ter em mente que esse hábito é bem mais profundo e complexo do que o vício na nicotina e que, tratando o problema no âmbito comportamental e cognitivo, as chances de abandonar o cigarro são consideravelmente mais altas.