Brasília – Mesmo durante os anos de crescimento econômico mais expressivo, os governantes brasileiros nem sempre se propuseram a tomar decisões consideradas essenciais para pôr fim ao gigante degrau que existe entre os mais ricos e os mais pobres.
A dúvida, agora, é se o presidente eleito em 2018 adotará políticas que podem ser impopulares, e que só terão efeitos de longo prazo, em detrimento de soluções imediatas ou demagógicas. Resolver a situação dos milhões de brasileiros que não têm condições dignas é uma das demandas mais urgentes do eleitorado, mas não costuma ser prioridade dos governantes.
Oferecer sugestões imediatistas não resolve o problema da desigualdade de renda, concordam os especialistas consultados pelo Estado de Minas.
Para o economista Marcelo Neri, diretor da Fundação Getulio Vargas (FGV) Social, o maior desafio do Brasil é conciliar o lado econômico com o social – fato que é facilmente observado nos discursos políticos, que costumam se concentrar em um desses lados, como se fossem incompatíveis.
Nesse sentido, o erro do país, na opinião de Neri, foi fazer uma estratégica social descolada da econômica. “A produtividade não aumentou, e a população vive mais, mas não teve reforma da Previdência. Tem que trabalhar os dois lados da moeda”, explica.
Reformas
Além do investimento nos alicerces bases da sociedade, como saúde pública e educação, o governo também terá que se comprometer com as reformas tributárias e da Previdência, afirmam os especialistas.
Para o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Luis Henrique Paiva, ex-secretário do Bolsa Família, os discursos de candidatos que dizem querer combater a desigualdade social, mas não se comprometem a fazer reformas básicas, tendem a ser demagógicos.
“Não dá para ficar prometendo que o país vai crescer e resolver os problemas de renda se não adotar um modelo que indique que o Estado tem condição de seguir equilibrado”, explica.
Paiva lembra que qualquer medida que venha a ser adotada dependerá da possibilidade orçamentária do governo, atualmente engessada pelos gastos obrigatórios.
Um sinal disso seria a aprovação da reforma da Previdência, que, embora não dê grandes resultados a curto prazo, “abre espaço para pensar no futuro”.
Hoje, os gastos com benefícios previdenciários ocupam 57% do orçamento primário do país. “Se tem uma despesa que é muito alta e não contribui para distribuir renda é a despesa previdenciária”, diz Paiva.
Já a reforma tributária, é necessária para que os mais pobres sejam proporcionalmente menos taxados que os mais ricos, ao contrário do que acontece hoje. O Brasil tem um sistema regressivo: a alíquota diminui quanto maiores os valores tributados.
“Para resolver o problema da concentração de renda, isso precisa mudar. É uma clara questão da equidade, de onerar menos as famílias mais pobres.
Continuidade
Tanto a reforma tributária quanto a da Previdência são necessárias para normalizar a economia, defende o professor de finanças públicas da Universidade de Brasília (UnB) José Matias-Pereira. Mas lembra que “é coisa para dois ou três governos resolverem, porque precisa ter continuidade”.
Como em todos os outros setores importantes, como educação e saúde, um dos grandes obstáculos na adoção das medidas necessárias pelos governantes é a necessidade que muitos veem de deixar um “legado”.
Adriano Pitoli, da Tendências, defende que é preciso manter a reforma trabalhista. Alguns candidatos afirmam que revogarão a medida, aprovada no ano passado pelo Congresso Nacional.
A pesquisadora do Centro de estudos da Metrópole e professora da Universidade de São Paulo (USP) Renata Bichir, considera a reforma um dos vários fatores que aumentam a desigualdade no país. “É um desincentivo para a formalização do trabalho”, diz.