No despacho do inquérito, o promotor, Luís Augusto de Rezende Pena aponta que, entre julho de 2017 e fevereiro de 2019, o médico realizou 775 procedimentos urológicos no SUS. Nesse período, o município desembolsou cerca de R$ 146 mil para arcar com o serviço prestado por intermédio da Instituição de Cooperação Intermunicipal do Médio Paraopeba (Icismep), que inclui 541 procedimentos realizados por outro profissional.
A nova informação chegou ao promotor por meio de documentos encaminhados pelo Conselho Municipal de Saúde e reforçam a ação civil pública ajuizada em fevereiro deste ano contra o médico, o prefeito e o secretário de Saúde, Geraldo de Almeida, por improbidade administrativa. “Apesar de reforçar a narrativa de abusos e de desvio do serviço e dinheiro público em benefício particular, demanda investigação paralela”, argumenta Pena.
A ação
O cargo de confiança exige dedicação exclusiva, com jornada de trabalho de 8 horas diárias, durante cinco dias na semana. Enquanto exercia outras atividades laborais, o médico, também servidor efetivo do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Minas Gerais (Ipsemg), embolsava cerca de R$ 3,8 mil/mês da prefeitura, segundo o promotor, “sem nunca ter aparecido para trabalhar”.
Nomeação
Távora foi cedido à prefeitura após solicitação do prefeito ao Ipsemg, onde atuava como médico efetivo. A cessão onerosa tem data inicial de 8 de maio de 2017. Entretanto, até 31 de outubro do mesmo ano, a Prefeitura de Lagoa da Prata não pagou nenhum centavo ao profissional. “Nenhum pagamento foi realizado porque, obviamente, nenhum serviço foi prestado, já que esse era o trato secreto feito com o prefeito”, argumenta o promotor, tratando o caso como “golpe ao Ipsemg”.
“Cheguei à conclusão que essa nomeação era para livrar o médico dos encargos funcionais que ele tinha no Ipsemg onde tinha carga horária de seis horas”, explica.
Prefeitura nega acusações
O secretário de Saúde de Lagoa da Prata nega as acusações. Disse que “o cargo de assessor não determina que o nomeado tenha que cumprir jornada fixa de 8 horas diárias e sim que ele esteja disponível quando necessário independentemente do dia e horário”.
Afirmou que a função do médico era atender a gestão nas demandas solicitadas dando suporte técnico na condução das políticas públicas de saúde. Na cidade, ele atuava, segundo o secretário, na Policlínica l, no Centro de Especialidades, na Secretaria da Saúde. Em Belo Horizonte, ele ficava na Casa de Apoio e dava suporte via telefone sempre que solicitado.
Almeida frisou que José Eduardo prestou serviço ao município apenas como assessor e no período em que não recebeu, trabalhava voluntariamente. Sobre atendimentos em clínicas particulares, alegou que “o fato de um profissional exercer uma função de assessoria não o impede de executar outras atividades laborais”.
Vingança pessoal
O secretário ainda acusou o promotor de “vingança pessoal” por medidas administrativas adotadas pelo município ao fiscalizar lotes permutados com o Hospital São Carlos. Disse que ele tomou as dores da administração da unidade e, desde então, está perseguindo o governo.
A exoneração, conforme Almeida, ocorreu a pedido do médico por se sentir “perseguido após inúmeras denúncias sem fundamentos”.
'Denúncias sem provas'
O médico disse ter aceito o cargo porque já estava envolvido na cidade vizinha, de Santo Antônio do Monte, com o projeto da Saúde do Homem. “Da repercussão satisfatória divulgada pela população, a Prefeitura de Lagoa da Prata me convidou, por ser atividade de minha área, com o intuito de se aplicar a atividade social naquela comunidade”, argumenta.
Ele pontuou como atribuição o encaminhamento de pacientes graves para cidades polos e classificou a atuação como “prestação de serviço de excelência”.
Disse que a carga horária prevista era de 20 horas semanais. “Asseguro com certeza que extrapolei absurdamente tal (...) pois, no momento da urgência, era acionado independentemente de onde estivesse e qual horário fosse para o encaminhamento necessário. Nessa hora trata-se de salvar-se vidas e amenizar sofrimentos”, argumentou.
Na policlínica, ele fazia as triagens para Saúde do Homem e na UPA ajudava na transferência. Seguindo a linha do secretário, tratou a ação pública como “vaidades de cunho pessoal”. “Denúncias sem provas prejudicam o Executivo de exercer com liberdade o sagrado dever de socorrer seus munícipes”, finalizou.
Exoneração
O médico foi exonerado em março desde ano após o ajuizamento da ação. Nela, o promotor pede indisponibilidade de bens do prefeito, do secretário de Saúde e do médico, em R$ 63.454,30, para ressarcir os cofres públicos nos valores que foram pagos indevidamente na condição de assessor técnico administrativo. Requer ainda o sequestro dos bens até o montante R$ 8.050 do médico pelos plantões pagos na UPA.
Férias-prêmio
De acordo com o Portal da Transparência do Ipsemg, José Eduardo voltou a receber em maio desde ano a remuneração de R$ 3,4 mil. Em nota, o órgão informou que, no mesmo mês, “o servidor requereu o usufruto de férias-prêmio” e não comentou sobre a ação.
(Amanda Quintiliano, especial para o EM)