Jornal Estado de Minas

VOLTA DO PÚBLICO

Para evitar gols contra



Uma reunião amanhã vai avaliar a realização das duas primeiras partidas de futebol em Belo Horizonte com presença de público após o início da pandemia de COVID-19. Dois jogos, na última quarta-feira, entre Atlético e River Plate, e na sexta-feira, entre Cruzeiro e Confiança, marcaram a retomada de torcedores aos estádios na capital de Minas Gerais. O encontro, organizado pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH), vai contar com a presença de representantes do Executivo municipal, dos clubes de futebol – América, Atlético e Cruzeiro – e do Mineirão, estádio que recebeu os dois eventos-teste. Um relatório será apresentado ao Comitê de Enfrentamento à COVID-19 para definir se o público seguirá em moldes similares, será barrado ou até ampliado. Recuos não estão descartados.





O primeiro teste aconteceu na última quarta-feira, na partida entre Atlético e River Plate, da Argentina, pela volta das quartas de final da Copa Libertadores. Mesmo com uma série de restrições e regras preestabelecidas, a partida registrou aglomeração e desobediência às normas. O público estava limitado a 30% da capacidade total do Mineirão – 61.890 lugares –, situado na Região Pampulha. Contudo, o número de torcedores foi questionado pelo prefeito da cidade belo-horizontina e ex-presidente do Galo, Alexandre Kalil (PSD). Segundo a administração do estádio, 17.030 pessoas assistiram à partida in loco. O Mineirão não informou o público presente no jogo do Cruzeiro.

Diante do observado na quarta, a Prefeitura de BH se reuniu com os representantes para breves correções visando à partida entre Cruzeiro e Confiança, pela 20ª rodada da Série B do Campeonato Brasileiro. Com isso, as enormes aglomerações vistas no jogo entre Atlético e River Plate não se repetiram e as arquibancadas não ficaram tão cheias como na quarta-feira. Apesar disso, o retorno da torcida do Cruzeiro ao Mineirão, na sexta-feira, após um ano e cinco meses, também teve momentos que podem colaborar para a disseminação da COVID-19, com cenas semelhantes às do jogo entre Atlético e River, mas em menor escala.

Em que pese o fato de os testes impressos para a doença terem se destacado em meio à multidão – a ponto de serem convertidos em adereços de mão nos cânticos de apoio ao time no entorno do estádio –, falhas do clube na logística de acesso à Esplanada, longas filas, pequenas multidões e o desrespeito ao uso obrigatório de máscara deram o tom antes da vitória sobre o Confiança.





Antes de vibrar com o gol de Marcelo Moreno, o único na vitória por 1 a 0 sobre os sergipanos, os cruzeirenses que resolveram voltar ao Gigante da Pampulha precisaram de doses de paciência. O processo de entrada sofreu atrasos, foi longo e gerou uma fila que ia até a metade da pista da Avenida Abrahão Caram. Na Avenida das Palmeiras, onde fica o tradicional Bar do Peixe, foram vistas as maiores concentrações de público. A alegria pelo reencontro com o time do coração, o papo com os amigos e a cerveja geraram combinação preocupante: rostos desprotegidos e aglomeração.

Como na vitória do Atlético por 3 a 0 sobre o River Plate, o Estado de Minas e o Superesportes listam os erros na noite de sexta-feira.

1) Atraso na abertura dos portões

A reportagem chegou à Pampulha pouco antes das 18h, a cerca de três horas e meia do apito inicial. A solidão das ruas vazias logo foi sendo substituída pela chegada dos primeiros torcedores. Para evitar as aterrorizantes cenas de aglomeração vistas no jogo da Copa Libertadores, os fãs celestes foram incentivados a chegar mais cedo, a fim de diminuir as filas e preservar algum distanciamento.

O plano, no entanto, fracassou logo no primeiro ato: os portões, marcados para serem abertos às 18h30, só foram liberados cerca de 50 minutos depois. Atraso, também, no acesso dos motoristas ao estacionamento. Houve buzinaço em forma de protesto. "Pediram para evitar a aglomeração, dizendo que estaria aberto às 18h30, mas já são 19h e olha aí: fechado. Você tenta agilizar e não aglomerar, mas encontra isso”, lamentou Carlos Magno, de 46 anos, torcedor que se programou para pisar no Mineirão tão logo fosse possível.




Segundo apurou o EM, era responsabilidade da Raposa conferir os exames dos torcedores. Os funcionários responsáveis pelo trabalho, porém, não chegaram aos portões às 18h30. Para evitar mais tempo perdido, a Minas Arena, concessionária do estádio, assumiu a tarefa.

2) Bebidas alcoólicas

Mesmo com a proibição para a venda de cervejas e a ausência de ambulantes comercializando bebidas alcoólicas, o consumo de "latinhas" era visto por todos os lados. Empolgados pelo retorno ao estádio, os cruzeirenses passaram a aumentar o número de “rodas” de conversa com o passar das horas. Por volta das 20h30, era possível ver uma grande aglomeração de pessoas na Avenida das Palmeiras, onde fica o Bar do Peixe. Sem máscaras, muito próximos e com cervejas nas mãos, os grupos desrespeitavam as recomendações para evitar as “resenhas” pré-jogo. Petiscos como os espetinhos de churrasco também eram vistos.

3) Filas e aglomerações

Os preciosos minutos perdidos para a abertura dos portões geraram longa fila na entrada principal da Esplanada. A demora fez com que o plano inicial de fechar os acessos às 21h, meia hora antes do início do jogo, não pudesse ser cumprido. A ordem dada aos fiscais do Cruzeiro foi de continuar o trabalho. Por volta das 22h, ainda havia gente entrando tranquilamente no estádio.




A emoção em estar de volta, combinada à demora, fez com que as filas, além de longas, fossem feitas por pessoas muito próximas umas das outras. Não houve respeito ao distanciamento.

4) Fiscalização ruim

A demora fez com que muitos torcedores se indignassem. Os fiscais passaram a ser jocosamente chamados de “atleticanos”. Por muitos minutos, só passavam dois torcedores por vez. A grande demanda, no entanto, fez com que o número de agentes fosse aumentado para cinco.
Mesmo assim, houve equívocos. Durante a conferência dos testes e ingressos de alguns torcedores, um dos fiscais não pediu a apresentação de documento de identificação. Os exames eram dobrados e colocados em uma caixa.


5) Testes invalidos

As horas pré-jogo de alguns torcedores ganharam injeções de emoção. Isso porque, na tarde de sexta, os celestes descobriram que os testes fornecidos a R$ 25 pela Máfia Azul não atendiam aos requisitos estabelecidos pela Secretaria de Saúde. Para entrar no Mineirão, era preciso resultado negativo do exame do “cotonete”, mas a organizada ofereceu, de forma irregular, o teste rápido, feito via coleta de sangue.




Muitos se aglomeraram na sede da Máfia Azul, no Barro Preto, em busca do teste. O espaço acabou interditado. A compra de um exame equivocado gerou transtornos para alguns. Foi o caso do casal Denia Flausino e Nilo Lacerda: eles não desistiram de ver o jogo e precisaram desembolsar mais dinheiro em prol do diagnóstico correto. “Hoje (sexta), quando estava no almoço, no serviço, vi que o teste não era válido. Saí do serviço mais cedo, para depois pagar em horas, e fui a uma farmácia fazer o teste de cotonete (de antígeno). O resultado saiu em 30 minutos. A tarde toda a gente pensou em cancelar a compra do (ingresso no) cartão de crédito, mas o amor pelo Cruzeiro foi maior", contou o rapaz.

6) Aglomeração

Apesar do público menor em relação ao visto no duelo entre o Galo e os argentinos, boa parte dos aficionados pela Raposa no Mineirão não cumpriu a ordem de respeitar o distanciamento entre os assentos. Sobretudo nos setores em que ficam as organizadas, foi possível ver muitos grupos juntos. E, em alguns casos, com máscaras no queixo.
A Federação Mineira de Futebol (FMF) e o Cruzeiro não responderam aos questionamentos da reportagem sobre os procedimentos no jogo contra o Confiança.

7) Barreiras

A prefeitura adotou estratégias para diminuir potenciais aglomerações, o que não impediu a concentração de torcedores nos arredores do Mineirão. Na Avenida Abrahão Caram, barreiras foram instaladas a fim de impedir a passagem de veículos e pessoas que não fossem ao Mineirão. Moradores do entorno foram as únicas exceções. O controle, iniciado às 19h, foi rígido.

*Estagiária sob supervisão do subeditor Marcílio de Moraes





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