Jornal Estado de Minas

Eu me amo

Fazer foto de si mesmo caiu no gosto do povo e selfie foi eleita palavra do ano

Fazer fotos de si mesmo em diferentes situações e lugares é tentação que pega de presidentes a simples mortais e ganhou até nome

Shirley Pacelli
Se hoje Narciso estivesse à beira do lago se contemplando, não definharia na relva à espera do ser amado – a si próprio, no caso. Sacaria logo seu smartphone e faria uma selfie (self-portrait ou autorretrato). O termo criado para designar um autorretrato compartilhado na internet foi eleito a palavra do ano pelo Dicionário Oxford. Segundo os editores da publicação, o uso da palavra aumentou 17.000% desde 2012. Também não é para menos: fazer foto de si mesmo caiu no gosto do povo e até mesmo das celebridades.
Fazer fotos de si mesmo em diferentes situações e lugares é tentação que pega de presidentes a simples mortais - Foto:
Durante o funeral do líder sul-africano Nelson Mandela, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, o primeiro-ministro britânico, David Cameron e a primeira-ministra dinamarquesa, Helle Thorning-Schmidt, foram flagrados sorridentes tirando um selfie juntos. O piloto Fernando Alonso, da Ferrari, também pegou seu smartphone para se retratar no pódio do Grande Prêmio de Monza, na Itália, embora milhares de fotógrafos registrassem o momento. Uma jovem estampou a capa do New York Post depois de ser surpreendida pelo fotógrafo do jornal fazendo um selfie ao avistar uma tentativa de suicídio na Ponte do Brooklyn, em Nova York (EUA).
Egocentrismo?

Foi difícil convencer a fotógrafa Letícia Alves (foto), de 22 anos, a dar entrevista para o Informátic@. “O assunto é um tabu. Há uma linha muito tênue para não cair no egocentrismo ou ser vista pelos outros como exibicionista”, ressalva. Mesmo cheia de temores sobre possíveis julgamentos, Letícia contou que faz suas selfies sempre que se sente bem em se fotografar. Uma rápida pesquisa em seu perfil no Instagram (@lettsousa) prova que ela não tem problemas com sua aparência e muito menos seus 1.519 seguidores, que distribuem curtidas em suas fotos.

Letícia tem algumas técnicas especiais para tirar autorretratos. Ela prefere postar fotos de perfil. Mas, a despeito de tutoriais na rede, como da rainha do selfie, Kim Kardashian, ela aposta em fotos mais espontâneas – nada de “biquinho”. Cada post revela o humor do momento. “Como fotógrafa, afirmo que todos têm um ângulo melhor. Uma vez encontrado: bingo!”, diz. Além disso, ela costuma usar dois aplicativos para tratar as imagens: o Mextures e o VSCO. O primeiro, como o próprio nome indica, é uma mistura de filtros e efeitos que dão leveza às imagens ou a deixam mais “poéticas”.  Os recursos de cores, segundo ela, ajudam na leitura da foto; o preto e branco dão uma impressão mais melancólica para a imagem, mais triste do que as coloridas.

A fotógrafa conta que já foi alvo de comentários negativos de terceiros sobre suas selfies. As pessoas geralmente associam o retrato de si mesmo com a necessidade de autoafirmação e egocentrismo, diz ela. “Mas você tira uma selfie porque tem vontade e nada mais. Não é porque é fútil, ‘se acha’, ou ‘uhul, estou linda, preciso mostrar para o mundo’”, se defende. Há quem discorde, como a psiquiatra e psicanalista Gilda Paoliello. Para ela, apontar demais a câmera na própria direção é sinal de insegurança.