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Por Alexia Diniz
Se você viveu os anos 90, sabe que quem tinha talão de cheque era quase como se tivesse a carteira assinada da vida adulta. Assinar um cheque era um ritual de poder: caneta boa, letra bonita, data bem alinhada, e aquele cuidado para não errar, porque rasurar era uma humilhação pública. O Brasil chegou a compensar 3,3 bilhões de cheques em 1996, um número que faz qualquer gerente de banco suar frio hoje em dia.
Mas a tecnologia não pediu licença. Ela simplesmente chegou, entrou pela porta e avisou: “acabou o glamour do cheque”. Em 2024, apenas 137 milhões de cheques foram compensados, uma queda de 96%. Praticamente um museu de papel. E enquanto o cheque descia a ladeira, o Pix subia como um foguete.
A mudança foi tão radical que parece até roteiro de documentário futurista. Em 2025, só no primeiro semestre, o país fez 37 bilhões de transações via Pix. Em um único dia de setembro, foram quase 290 milhões, no mês passado o queridinho completou 5 anos.
Cheque, cartão, aproximação… e então veio o Pix para acabar com a conversa
O Brasil passou por quatro grandes fases de pagamento, cada uma com seu próprio drama.
E todas elas explicam por que o pix dominou o país com a mesma velocidade que uma fofoca no WhatsApp.
A primeira fase foi a do cheque, que além de ser moderno para a época, era um verdadeiro exame de confiança. Um cheque pré-datado valia como juramento. Já a segunda fase trouxe os cartões, que começaram tímidos, mas se tornaram estrelas da economia. Pagamento no crédito virou estilo de vida, e o débito virou o “pode passar” mais usado do país.
Depois, veio a era da transição digital. Internet banking virou moda, app de banco virou extensão do corpo e as carteiras digitais chegaram trocando aquele “pagar amanhã” por “pagar agora, mas sem ver o dinheiro saindo”. A pandemia acelerou tudo, tirou a burocracia pela força e deixou o terreno pronto.
Então, em novembro de 2020, o Banco Central lançou o Pix, e o resto é história.
Pix: rápido, gratuito e irresistível (o combo que conquistou o país)
O Pix não virou febre por acaso. Ele tem três características que o brasileiro considera sinais claros de amor verdadeiro: rapidez, facilidade e custo zero. Em um país que detesta burocracia, o Pix foi recebido quase como libertação espiritual.
A transferência cai na hora. O comerciante recebe na hora. O pedreiro, a manicure, o vendedor, a tia da quentinha, todos recebem na hora. Não tem intermediário, não tem enrolação, não tem "vou compensar amanhã". É um sistema tão eficiente que até o cartão se sente ameaçado, e está tentando correr atrás do prejuízo.
O mais engraçado é que o Pix virou até comportamento social. Ninguém mais pergunta “posso te pagar amanhã?”. Agora a frase é “me passa a chave”. O Pix entrou no vocabulário como café, futebol e feriado prolongado… “E o pix, nada ainda?”
O Pix mudou o comportamento financeiro dos brasileiros?
Antes do Pix, havia todo um ritual para pagar contas. Era fila, senha, cartão, operação digitada, conferência. Hoje, tudo cabe em um clique. Essa praticidade remodelou hábitos de consumo. As pessoas compram mais, transferem mais, movimentam mais. E sentem menos o peso do dinheiro, porque não veem mais o dinheiro.
Para o comércio, o Pix trouxe vantagem real. Pagamento na hora, sem taxa abusiva. Para os autônomos, trouxe formalidade. Para quem estava fora do sistema, trouxe inclusão. O Pix virou ponte. E a ponte boa não tem volta.
Pix virou dedo-duro? A Receita Federal confirma que virou sim
Um capítulo à parte da história recente é o relacionamento entre o Pix e a Receita Federal. O contribuinte brasileiro achou que o Pix era invisível. Achou que transferência rápida significava transferência secreta. Achou errado.
Em 2025, a Receita começou a cruzar movimentações feitas via Pix com declarações do imposto de renda. A consequência foi direta: multas e malha fina para quem movimentou mais do que declarou. A transparência do Pix é uma bênção para o sistema, e uma dor de cabeça para quem sempre viveu no “jeitinho”.
O Pix não só é rastreável como é rastreado. E isso transformou a fiscalização tributária em algo muito mais eficiente. A praticidade virou responsabilidade. O contribuinte não pode mais ignorar que cada transferência deixa rastro.
“Pix é perigoso?” Uma pergunta que vem mais do medo que dos fatos
Muita gente desconfia do Pix, como se ele fosse o “primo rebelde” do mundo financeiro. Mas, tecnicamente, o Pix é tão seguro quanto qualquer outro meio de pagamento moderno. Ele usa criptografia pesada, autenticação em múltiplas etapas e padrões internacionais que não deixam nada a desejar comparado ao cartão, ao internet banking ou aos sistemas bancários tradicionais. O problema é que, quando o assunto é segurança, o vilão quase nunca é a tecnologia, é o usuário apressado.
Na prática, o Pix só parece mais arriscado porque é rápido demais para o brasileiro pensar antes de clicar. Mas o risco sempre existiu em todos os meios de pagamento. O cheque, por exemplo, vivia sendo clonado, sustado, fraudado. Já o cartão sempre foi alvo de golpes de maquininha adulterada, compra internacional inesperada e a famosa ligação do “analista do banco” pedindo seus dados. Até a aproximação, que parecia o auge da praticidade, virou porta de entrada para golpe quando o dono do cartão nem percebia que encostaram uma maquininha na mochila dele.
A tecnologia funciona bem em muitos casos. O que falha, historicamente, é o comportamento humano. O golpe não entra pelo aplicativo. Entra pelo WhatsApp, pelo “faz agora”, pelo “tô em apuros”, pelos links salvadores. No fundo, o Pix não é o perigoso da história. O perigoso é clicar sem respirar.
Por que o Pix colocou o Brasil no topo da inovação mundial?
Os gringos ficam chocados quando descobrem que a gente transfere dinheiro em segundos, de graça, 24 horas por dia. Para muitos países, isso é ficção científica. A combinação de inclusão, velocidade e universalidade transformou o Brasil em referência.
O Pix colocou mais de 71 milhões de pessoas no sistema financeiro. Democratizou o acesso bancário. Facilitou o comércio local. Reduziu custos para pequenos empreendedores. Criou oportunidade para trabalhadores autônomos. E colocou pressão em instituições que se acomodavam há anos.
Hoje, sistemas parecidos surgem na Índia, na Europa e em outros mercados. Mas nenhum deles tem a escala e a força cultural que o Pix alcançou aqui. O mundo olha e pensa: “O que esse país está fazendo?”. A resposta é simples: inovando sem medo.
O que vem depois do Pix? Prepare-se, porque não vai ser pouco
O Brasil está entrando em uma nova etapa. Vem aí o Pix Automático, que vai substituir débito automático, e já chegou até o Pix Parcelado. O Real Digital promete integração instantânea com contratos inteligentes. E o Open Finance deve transformar toda relação entre bancos, empresas e usuários.
O Pix não é o fim da inovação. É o começo. A próxima década deve tornar os pagamentos ainda mais invisíveis, rápidos e integrados. E, se a história dos últimos 30 anos ensinou algo, é que o Brasil gosta de ousar quando o assunto é dinheiro digital.
Conclusão: o Pix não é só tecnologia, é uma mudança de cultura
O Pix não acabou apenas com o cheque. Ele acabou com fila, atraso, desculpa, burocracia e, em alguns casos, até com paciência. Ele mudou a forma como o brasileiro envia, recebe, cobra, negocia e até briga (porque tem gente que discute por causa de um Pix não pago).
A adoção foi tão natural que parece que sempre existiu. Mas é um fruto de 30 anos de evolução, crise, inovação e uma pitada de habilidade brasileira em simplificar as coisas. A história do Pix é a história de um país que descobriu que pode ser tecnológico, eficiente e rápido, tudo ao mesmo tempo.
E, olhando para tudo isso, fica claro que não tem volta. O aniversariante do mês virou hábito, virou vício, virou atalho para resolver quase tudo. Mais do que um meio de pagamento, virou um retrato do que o Brasil consegue fazer quando mistura tecnologia, eficiência e um pouco de urgência nacional. E, pelo jeito, vai continuar puxando o ritmo do nosso dia a dia por muito tempo.
As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.
