Paris e sua região expandida, chamada Ile de France, tem uma das mais compreensivas e extensas redes de transporte público, com 16 linhas, 219 quilômetros de trilhos e 302 estações. O sistema de trens de subúrbio, o RER (Réseau Express Régional), compreende 5 linhas, 602 quilômetros de trilhos e 257 estações, além de 1.900 linhas e 9.500 ônibus.

O sistema é integralmente público, e a operação é, claro, deficitária, exigindo subsídio para operação, e recursos públicos para melhorias e expansão do sistema. O custo anual do sistema é de cerca de 10 bilhões de euros (mais 3 para melhorias e expansão), mas o subsídio não supera os 25% do orçamento, sendo 15% das municipalidades e 10% do governo francês, por diversos canais estatais.

A maior parte do sistema vem dos usuários (48%) e reembolsos de empresas aos funcionários (27%), instituído por legislação específica (versement mobilité) onde a empresa “devolve” metade do custo mensal a cada um de seus funcionários, somado ao salário.

De uma forma geral, toda população tem uma “assinatura” mensal (Navigo) que garante uso irrestrito do sistema de transporte público, a um módico custo de 88 euros (ou 88 “dinheiros”) mensais, menos de 5% do salário mínimo francês, de 1.801 “dinheiros” (1.426 “dinheiros” líquidos).

Qualquer pessoa pode, portanto, usar indiscriminadamente um dos melhores e mais completos sistemas de transporte públicos do planeta por menos do que 5% do salário mínimo vigente. Eventualmente, metade desse valor é reembolsado pelo empregador, resumindo o custo de transporte público a 2,5% do salário mínimo.

O orçamento da cidade de Paris é de 11 bilhões de “dinheiros”, e somada ao da Ile de France, chega aos 17 bilhões. Paris e Ile de France, juntos, consomem pouco mais de 10% de seus orçamentos para subsidiar transporte público compreensivo e de qualidade para toda a sua população (melhoria e extensão são financiados pelo governo central, agências e financiamento).

No Brasil, como regra geral, temos um salário mínimo - atualmente - de 1.518 "dinheiros”, e o bilhete único mensal em São Paulo 440 “dinheiros", para um sistema longe de se completo, compreensivo, extenso e de qualidade, a ponto que uma parte relevante da população precise comprar manter carros ou motocicletas para se deslocar para o trabalho. Nessa equação, autônomos e informais têm um gasto ainda maior, quando compram bilhetes individuais, e não têm direito ao desconto legal, caso onde o custo para
o trabalhador é limitado a 6% do salário (ou 91 “dinheiros”).

A cidade de São Paulo, tem um custo anual com subsídio da ordem de 6,5 bilhões de “dinheiros”, com um sistema várias vezes menor do que o parisiense, apesar de uma população várias vezes maior, não obstante um orçamento de 125 bilhões de “dinheiros”.

A diferença na performance, na oferta e no serviço prestado são evidentes e acachapantes, e nos levam a perguntas absolutamente óbvias e previsíveis: como é possível que uma nação pertencente a uma zona muito mais complexa, mais regulamentada e com padrões de qualidade muito mais elevados consegue entregar tanto mais, e um custo tão inferior?

Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia

Como uma região metropolitana como a de Paris e Ile de France consegue expandir e melhorar o sistema continuamente com valores anuais tão inferiores aos brasileiros?

Como é possível que a maior parte das metrópoles brasileiras sequer tenha passes mensais integrando todos os modais de transporte?

Como é que, com as performances deprimentes e sistemas de transporte público vergonhosos, o país esteja discutindo gratuidade para o transporte público (senão por um populismo barato e desonesto)?

compartilhe