Sempre que alguém me fala “Deus te pague” fico emocionalmente mais feliz que quando ouço um “quanto ou o que te devo?” ou “depois te pago”. Me refiro às relações pessoais e não as de fundo comercial. Isso porque o que está em jogo não é um favor passível de ser medido e monetizado, mas uma ação de valor incomensurável. O que observo é que a maioria das pessoas tem dificuldades com a gratidão, uma virtude muito confundida com dívida eterna.


Nada de errado em buscar fazer de tudo pelos nossos pais, professores inspiradores, amigos de toda e qualquer hora. O problema é acreditar que podemos recompensá-los. Não é possível pagar uma noite de vigília ao seu lado enquanto você chora ou surta, quando quem te acompanha, além de impedir que você se acabe, é movido por querer seu bem e acreditar que você mereça aquela dedicação simplesmente por ser quem é. Não é possível pagar nem mesmo com a mesma moeda.


Também não há moeda que pague uma indicação certeira, uma mão estendida em hora crucial ou até mesmo um sorriso com piscadela quando você acha que está tudo perdido. O que te levanta e te nutre emocionalmente transcende a matéria. Toma lá, dá cá de favores move o cenário político e o esportivo (em especial o do futebol). Daí tanto conchavo e destrato. Tudo por dinheiro, poder e todas as ilusões que os permeiam.


Por isso aprendi que, quando o que está em jogo é afeto, usar a expressão popular “Deus te pague” vale mais a pena, independente de quem quer que seja esse Deus ou até mesmo se você acredita em Sua existência. É a essência que importa.


O mais engraçado é que foi o ramo das religiões quem mais incutiu na humanidade a ideia de ter que pagar o que se deve, sob o risco de contrair a temerosa dívida eterna. Nada contra reconhecer dívidas; o difícil é identificar o que é uma dívida. Fácil, claro, quando compro algo, contrato ou sou contratada para um serviço. Gratidão te isenta de culpa. Muitas vezes um “muito obrigada/o” pode parecer simplista demais, quando de fato é o que mais puro se tem a dar.

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