Paulo Rabello de Castro
Paulo Rabello De Castro

Um Nobel pros Correios

Custo social de ser dinâmico é medido pela capacidade de aposentar todas as tarefas e ações que vão ficando obsoletas em razão do avanço constante das inovações

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Os três ganhadores do prêmio Nobel em Economia de 2025 – o historiador econômico Joel Mokyr e os economistas matemáticos Phillipe Aghion e Peter Howitt – teriam muito a recomendar se o conselho de administração da ECT – Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – decidisse contratá-los para opinar sobre a grave crise administrativa e financeira que ameaça a empresa de uma próxima insolvência e eventual interrupção dos serviços prestados à população.

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Os nobelistas de 2025 foram agraciados, justamente, por haverem mostrado que o desenvolvimento dos povos decorre de inovações que começam na imaginação de inventores e nos laboratórios de pesquisadores e vão parar no pensamento prático de pessoas criativas de chão de fábrica, capazes de “fazer rodar” as novas ideias e conceitos revolucionários.


Esse “algo a mais” das economias muito dinâmicas – que são as novas tecnologias aplicadas – está na raiz da expansão dos investimentos, das oportunidades no mercado de trabalho e das melhorias salariais baseadas em saltos na produtividade das pessoas. O contrário disso é o cenário da “mesmice” – as economias estagnadas ou em franco declínio – em que prevalece a repetição de atividades e tarefas, a estagnação dos investimentos e o congelamento de ganhos salariais.


O custo social de ser dinâmico é medido pela capacidade (e a coragem) de aposentar todas as tarefas e ações que vão ficando obsoletas em razão do avanço constante das inovações. A máquina de lavar roupas aposenta o tanque e o esfregão. O automóvel e a moto aposentam as montarias e carruagens. E por ai vai. A esse fenômeno permanente e mundial de substituição do velho pelo novo, do antigo pelo moderno, do menos pelo mais eficiente, a esse giro perpétuo de transformação econômica o genial economista Joseph Schumpeter batizou de “destruição criativa”.


O termo destruição é forte, quase agressivo, porque representa o deslocamento de tudo que será substituído pelos métodos e pelas pessoas mais inovadoras. Ou seja, para se impor, qualquer processo criativo “destrói” ou aposenta o que antes estava no seu lugar. E isso é, muitas vezes, custoso, e até doloroso, mormente quando se trata de pessoas que precisam se reinventar e buscar outras atividades para se ocupar.


A destruição criativa está no centro da explicação do que se passa hoje com os Correios. No mundo inteiro, a atividade postal mudou de processo e até de significado. Por um lado, ganhou um novo e enorme mercado de entregas de mercadorias. Por outro lado, vem perdendo dramaticamente todo o mercado de correspondências (as cartas, avisos, anúncios etc) que hoje trafegam, eletronicamente, em meio digital. São os e-mails, os zaps, as demais mídias, inclusive o PIX, que revolucionou as transferências financeiras.


Nesse turbilhão de inovações no campo das comunicações, o serviço postal realizado pelos Correios, no Brasil e no mundo, tem sofrido um deslocamento irreversível que levará, inevitavelmente, à eliminação de meios convencionais pela vasta adoção dos meios digitais. Na destruição criativa das comunicações, os Correios já deveriam ter realizado um radical desvio de curso, para redefinir sua atividade principal, minimizar repercussões financeiras negativas e reduzir ao máximo o impacto traumático sobre sua principal força de trabalho, nossos simpáticos “carteiros”.


O que, no entanto, tem se assistido é ao enterro dramático dos Correios pela avolumação do seu desequilíbrio operacional. Enquanto as receitas da atividade principal estagnam e encolhem (como mostra o quadro), as despesas gerais e administrativas explodem, sem qualquer justificativa plausível. Os Correios ainda não fizeram um passivo bancário relevante. O compromisso pesado é com precatórios trabalhistas e com encargos previdenciários, para os quais falharam uma política de pessoal mais flexível e a construção de lastro adequado para pagar aposentadorias.


Mas agora, pelo que se lê no noticiário, o governo Lula entraria pela porta de bancos para tomar cerca de R$ 20 bilhões, a fim de injetar numa atividade que hoje abre rombos de cerca de R$ 5 bilhões anuais, embora com projeções cadentes de receitas futuras. A operação de “resgate” concebida nessas bases representará, literalmente, dinheiro do contribuinte jogado pelo ralo enorme da cegueira de gestão. Não especulemos sobre intenções menores, como adiar o enfrentamento da crise administrativa para escamotear providências eleitoralmente custosas. Preferimos achar que o governo Lula seria incapaz de decidir sobre os Correios com um olho nas eleições do próximo ano.


O contribuinte brasileiro (você) não escapará, entretanto, de pagar essa conta indigesta, fruto da inaptidão dos governantes de tomar decisões baseadas na lógica da efetiva superação de uma crise empresarial. Nossos governantes, nos três Poderes, mais decidem para acomodar, camuflar e escamotear do que para enfrentar, inovar e transformar.


Prova disso é o outro custo fiscal – este muitíssimo maior do que o buraco nos Correios – que são os encargos sobre a enorme dívida pública nacional. Gastamos com a “rolagem” desta dívida, algo como R$ 1 trilhão, anualmente. Contudo, dada a enormidade do encargo com juros, o Executivo, o Congresso e os Tribunais jogam esse trilhão de reais para debaixo do tapete, ao redefinir o resultado fiscal anual como sendo apenas o “resultado primário”, isto é, em total desconsideração da conta de juros!


A contabilidade financeira do Brasil criou um conceito esquisito de déficit fiscal que faz sumir o que mais interessa avaliar. O Brasil pratica um caso clássico de “criação destrutiva” nas suas contas fiscais, quando cria uma definição cor-de-rosa de déficit que destrói, com essa falsa criatividade, a solidez financeira da nação.


A destruição criativa de Schumpeter e dos Nobelistas de 2025, embora meio dolorosa, seria muito benéfica para os Correios, assim como para as contas públicas e para o Brasil como um todo. Mas nossos governos, de pensamento estéril, preferem as “criações destrutivas”, pelas quais as imagens fantasiosas de um futuro promissor são criadas para iludir mas, logo em seguida, desapontar.

As opiniões expressas neste texto são de responsabilidade exclusiva do(a) autor(a) e não refletem, necessariamente, o posicionamento e a visão do Estado de Minas sobre o tema.

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