A COP30, em Belém, acabou como as outras: com grande atraso, várias frustrações e alguns avanços. Cumpriu seu mandato para criar indicadores de implementação e avaliação da adaptação à mudança climática. A maior frustração foi, na verdade, um paradoxo. Foi uma decepção não ter no documento final um mapa do caminho para o abandono progressivo dos combustíveis fósseis, com roteiro e metas. Mas, esta pauta não estava na agenda oficial. Ora, como pode frustrar a não decisão sobre algo que não estava na pauta de decisão?


O presidente da COP30, André Corrêa do Lago, ao perceber que o tema dos combustíveis fósseis seria vetado na agenda, criou uma rota paralela de discussões sobre este e outros temas, sob responsabilidade da presidência. Lançou a engenhosa ideia de um “mutirão global contra a mudança climática”.


A ênfase estava no significado de esforço coletivo do mutirão. Foi curioso ouvir “mutirão” nos mais de 190 sotaques diferentes nos corredores da COP30. A ideia pegou. E foi por meio dele que o que não estava na agenda foi o tema mais debatido e que mais deixou os negociadores insones. Fora da agenda formal, se tornou o item principal da agenda virtual.


A tarefa do presidente Corrêa do Lago será robustecer o mapa do caminho, ao longo de 2026, para entregá-lo maduro ao presidente da COP31, em novembro de 2026. Com adesão, até ontem de 85 países, não se pode dizer que o tema foi abandonado. Estava em todas as entrelinhas do comunicado final aprovado, “Global Mutirão”.


A marca desta COP foi este paradoxo. O tema da transição para sair dos combustíveis fósseis, aprovado oficialmente na COP28, em Dubai, e esquecido na COP29, em Baku, foi a questão mais discutida nos bastidores e nas plenárias da COP30. Portanto, esteve, sem estar. Houve avanço importante na definição dos direitos sociais a serem respeitados na transição para a descarbonização, com menção explícita aos direitos de gênero, comunidades originárias e afrodescendentes.


Deu trabalho para convencer os europeus a aceitarem a referência a afrodescendentes por causa dos problemas que enfrentam atualmente com imigrantes. Nenhum tema é fácil. Todas as questões exigem enorme esforço negociador, para sempre obter um resultado subótimo, por causa da regra da unanimidade.


O que é unânime entre mais de 190 país muito diferentes entre si, de produtores de petróleo a ilhas em iminente risco existencial, sempre será um compromisso aquém do necessário, do consenso científico e do desejo da maioria das partes. Mas, o aquecimento global não espera.


Houve, claro, outras marcas próprias da COP de Belém. As negociações estavam aquecidas, no penúltimo dia oficial, quando um incêndio no estande do East African Community Pavilion forçou a retirada dos delegados. O incidente certifica em definitivo a incompetência da Casa Civil de Rui Costa, já objeto de críticas seguidas da UNFCC, o programa da ONU para o Clima.


O planejamento de Rui Costa para a logística da COP30 foi deficiente desde o início. O local construído era espaçoso, mas com sérios problemas de refrigeração, por exemplo. O contexto geopolítico-econômico era adverso. Muitos conflitos regionais. Ausência dos Estados Unidos. Uma Europa muito mais recalcitrante. Limites fiscais como obstáculo ao financiamento. Países petroleiros intransigentes.


O contexto econômico, de baixo crescimento e novos desafios, restringe orçamentos e dificulta o avanço no financiamento pelos países ricos aos mais pobres. O local da COP30 estava sendo desmontado, e ainda se aguardava a plenária final. Foi preciso muito engenho diplomático para superar os impasses que teriam levado o evento ao colapso. O trabalho insone do presidente André Corrêa do Lago foi imprescindível, com ajuda dos negociadores, Maurício Lyrio e Lilian Chagas. Diplomata brasileiro sempre tem uma carta manga. Foi a carta do embaixador Lyrio que resolveu o impasse entre Turquia e Austrália, sobre a sede da COP31, dando à Austrália o comando das negociações.


A ministra Marina Silva foi decisiva nos bastidores e nas reuniões formais. Não arredou o pé do evento, primeira a chegar e última a sair, pôs o peso de sua reputação e legitimidade nas negociações para manter viva a ideia dos mapas do caminho para saída justa dos combustíveis fósseis e para o desmatamento zero. Serão, para ela, como as NDCs, cada país fará o seu, voluntariamente. O tema terá decisão oficial em alguma próxima COP.

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