Hoje, 1º de março, faz exatos seis meses que “Ainda estou aqui” ganhou o mundo. Dos 10 minutos de aplausos no Festival de Veneza, em 1º de setembro de 2024, até este sábado, véspera de Oscar, o planeta deu algumas voltas para toda a equipe do filme de Walter Salles.


Para Fernanda Torres, a Terra deu umas voltinhas a mais. Crescimento de 535% do número de seguidores no Instagram; prestígio internacional, tanto entre os pares quanto na imprensa especializada; fazedora de modas, seja da alta-costura (Chanel, Dior e Bottega Veneta a vestiram na temporada de premiações), seja de frases (“Eu me sinto o Pikachu”, “A vida presta” passaram a ser usadas cotidianamente); procura enorme por produções estreladas por ela. Encerrada uma década atrás, a série “Tapas e beijos” (“Slaps and kisses” lá fora) teve aumento de 209% de streaming no Globoplay.



Isso tudo ocorreu com Fernanda Torres em meio ano. Menos, se pensarmos que a carreira de “Ainda estou aqui” cresceu de maneira exponencial a partir de dezembro, quando o filme e a atriz foram indicados ao Globo de Ouro. Naquela altura, o nome dela já era conhecido no meio cinematográfico norte-americano.

Foto de Fernanda Torres no perfil da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, que concede o Oscar

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É só lembrar o 18 de novembro. “She is Mother”, o perfil da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (Ampas) cravou, diante da repercussão da divulgação da foto da atriz no Governors Awards, evento anual que homenageia personalidades do cinema. Os números atuais desta postagem (2,9 milhões de curtidas, 845 mil comentários) revelam o alcance que nenhum outro post do mesmo evento sonhou se aproximar.


Rede social é coisa séria entre os brasileiros, e Fernanda soube lidar com isso durante a campanha. “O Brasil é uma potência na internet. Somos usuários intensos, muito intensos. Dez anos atrás, eu não queria estar online”, declarou à “Variety”, a mesma publicação especializada que cravou que ela venceria o Globo de Ouro de Melhor Atriz – desbancando o quarteto da “Lista A” de Hollywood: Angelina Jolie, Nicole Kidman, Kate Winslet e Tilda Swinton.


A partir daquele discurso, um improviso perfeito, emocional e inteligente em igual medida – “A arte pode durar pela vida, até durante momentos difíceis”, referiu-se não só à luta de Eunice Paiva como também à vida hoje no Brasil, nos EUA e em todo o mundo –, não houve mais como segurar. Fernanda Torres virou a sensação entre as atrizes desta temporada.

A estrela americana Ariana Grande passou a seguir Fernanda Torres nas redes sociais e postou a foto das duas no Festival de Santa Barbara, nos EUA

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No Brasil, a indicação ao Oscar de Melhor Atriz, em janeiro, foi até mais comemorada do que um feito inédito. Além de Melhor Filme Internacional (categoria à qual o país havia concorrido em quatro ocasiões), “Ainda estou aqui” foi indicado à estatueta de Melhor Filme.

Blackface e desculpas


A campanha se intensificou, a presença de Fernanda se multiplicou na imprensa e na TV, já que as redes sociais ela já dominava. A superexposição trouxe à tona velhas controvérsias. A maior delas foi a esquete exibida no “Fantástico” em 2008 na qual ela fez blackface (usou maquiagem para interpretar personagem negra, prática considerada hoje muito ofensiva).


Fernanda se saiu bem com o pedido de desculpas publicado no site “Deadline”: “Eu sinto muito por isso... Na época, apesar dos esforços dos movimentos negros, a consciência sobre a história do racismo e o simbolismo do blackface ainda não eram tão conhecidos.”


A saia-justa virou nota de rodapé na campanha vitoriosa em que Fernanda, com vivacidade, inteligência e humor, soube se apresentar para o circuito que, até então, não a conhecia.


Ela fez não só Jimmy Kimmel como a plateia de um dos mais prestigiosos talk shows da TV americana rirem ao contar o imbróglio do troféu do Globo de Ouro. Ao deixar Los Angeles às pressas diante dos incêndios que devastaram a cidade, foi aconselhada a levar o prêmio na bagagem de mão. Foi parada na revista do aeroporto em Nova York e teve de explicar por que levava um troféu na mala.

Fernanda Torres deu entrevista divertida ao talk show de Jimmy Kimmel, que tem grande audiência nos EUA

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No Festival de Santa Barbara – aquele em que encantou Ariana Grande, ao cumprimentá-la fazendo a mexida de cabelo “toss toss” de Glinda, personagem em “Wicked” –, Fernanda corrigiu, ao vivo, o apresentador Dave Karger. Ele falou que Walter Salles havia trabalhado primeiro com Fernanda Montenegro (em “Central do Brasil”, de 1998).

“Eu trabalhei com ele antes, sorry, fui a primeira”, esclareceu a atriz, dirigida por Salles em 1995, no longa “Terra estrangeira”.

Pretinho básico

Fernanda reconfigurou o pretinho básico nos tapetes vermelhos. O vestido do estilista belga Olivier Theyskens que usou no Globo de Ouro virou unanimidade – o arremedo dele já foi visto até em blocos de carnaval (aliás, nem precisa dizer que a fantasia “Fernanda Torres” está em alta nestes dias).

A brasileira também encantou seus pares. A satisfação de Tilda Swinton ao vê-la ganhando o Globo de Ouro foi realmente genuína. Mariah Carrey e Sarah Paulson são fãs assumidas, como provam postagens de ambas nas redes sociais.

Mas ela não se deslumbrou. Hollywood Reporter a chamou de “diva pé no chão” diante de suas declarações. O The New York Times fez um dos melhores textos desta temporada, a entrevista cheia de afetos com as duas Fernandas, mãe e filha.

O jornal mais importante do mundo prevê a vitória dela neste domingo (2/3). Várias bolsas de apostas, no entanto, colocam as candidaturas de Demi Moore (“A substância”) e Mikey Madison (“Anora”) na frente.

Fernanda afirmou que chegar ao Oscar é como “escalar o Everest”. Preparada para atingir o pico da maior montanha do mundo, ela já está. 

Fernanda Torres participou de "Jogo de cena" (2007), dirigido pelo aclamado documentarista Eduardo Coutinho. Vinte e três mulheres foram filmadas no Teatro Glauce Rocha, no Rio de Janeiro, falando da própria vida. Com base nos depoimentos, atrizes interpretaram as histórias a seu modo, inclusive acrescentando experiências pessoais a elas. Matizar Filmes/reprodução
Série de comédia de imenso sucesso na TV Globo, "Os normais" (2001-2003) deu origem a dois filmes homônimos, dirigidos por José Alvarenga Júnior, com roteiro de Fernanda Young e Alexandre Machado. Sucesso de bilheteria, os longas de 2003 e 2009 acompanham o casal Rui (Luiz Fernando Guimarães) e Vani (Fernanda Torres) metidos em confusões e situações esdrúxulas. Globo Filmes/reprodução
Fernanda Torres brilhou no divertido "Saneamento básico – O filme" (foto), de Jorge Furtado. O cineasta gaúcho e sua trupe (Fernanda, Wagner Moura, Lázaro Ramos, Camila Pitanga e Paulo José, entre outros) conseguiram fazer graça com tema espinhoso: a falta de esgoto numa pequena cidade interiorana. Casa de Cinema de Porto Alegre/reprodução
As duas Fernandas – Torres e Montenegro – atuaram em "Gêmeas" (1999) e "Casa de areia" (2005, foto), filmes de Andrucha Waddington, marido de Torres. A família voltou a se reunir no set de "O juízo" (2019), com roteiro de Fernanda Torres, direção de Waddington e Fernanda Montenegro contracenando com o neto Joaquim, filho do casal. Conspiração Filmes/reprodução
Em 1998, o Oscar cruza pela primeira vez o caminho de Fernanda Torres. "O que é isso, companheiro?", de Bruno Barreto, concorreu ao prêmio de Melhor Filme Estrangeiro, mas foi derrotado por "Karakter", do belga-holandês Mike van Diem. Fernanda interpretou a guerrilheira Maria. Selton Mello, seu companheiro em "Ainda estou aqui", fez o papel do militante de esquerda Oswaldo. Miramax/reprodução
O primeiro filme de Fernanda Torres com o diretor Walter Salles foi "Terra estrangeira" (1995), codirigido por Daniela Thomas. Ela faz o papel de Alex, brasileira que vive em Portugal – imigrante que enfrenta um pesadelo ao lado de Paco (Fernando Alves Pinto), outro desgarrado do Brasil da era Collor. Video Filmes/reprodução
Aos 21 anos, jovem Nanda conquistou um prêmio cobiçado por estrelas mundiais: Melhor Atriz no Festival de Cannes, em 1986, por seu trabalho em "Eu sei que vou te amar", longa de Arnaldo Jabor sobre a dor da separação de um jovem casal. Em cena, apenas Fernanda e Thales Pan Chacon. Como gravava a novela "Selva de pedra" (era a protagonista Simone), a atriz voltou da França antes da cerimônia de premiação. Jabor recebeu a pequena palma dourada em nome dela. Embrafilme/reprodução
Em 1985, Fernanda Torres ganhou o prêmio de Melhor Atriz no Festival de Gramado por sua atuação em "A marvada carne", comédia dirigida por André Klotezel. Contracenando com Adilson Barros (foto), ela, aos 20 anos, era profissional com experiência no teatro e TV. Já havia atuado nas novelas da Globo "Baila comigo", de Manoel Carlos; "Brilhante", de Gilberto Braga; e "Eu prometo", de Janete Clair. Embrafilme/reprodução
Filha dos atores Fernando Torres e Fernanda Montenegro, Fernanda Torres nasceu em 15 de setembro de 1965. Estreou nos palcos aos 13 anos, participando da peça "Um tango argentino", de Maria Clara Machado, que comandou o Tablado, celeiro carioca de talentos. O primeiro filme, aos 17, foi "Inocência" (1983), de Walter Lima Junior. Fez o papel da interiorana Inocência, que se apaixona pelo médico Cirino (Edson Celulari, foto), a contragosto do pai. Embrafilme/reprodução
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