Um Oscar muda uma carreira? Sim, certamente. Porém, a resposta é diferente para filmes, atores e atrizes, a ponta mais visível da máquina em torno da premiação mais importante da indústria cinematográfica.

Essa mudança, vale reforçar, nem sempre é positiva, conforme os 97 anos de história da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas estão aí para provar.

Mais relevante do que a estatueta em si são as indicações, que fazem a diferença para a bilheteria de uma produção, em especial para aquelas nomeadas na categoria principal, a de Melhor Filme. Assim que a lista é anunciada, os concorrentes têm o circuito de salas expandido. Isto, logicamente, poderá reverter em aumento significativo de espectadores.


“Ainda estou aqui” estreou em 7 de novembro no Brasil, em cerca de 600 salas. Hoje, 17 semanas mais tarde e 5,3 milhões de espectadores depois, segue em cartaz em mais de 700. Pelo menos 2,3 milhões de espectadores assistiram ao filme neste ano, quando a campanha do Oscar estava a pleno vapor. Um grande estímulo ocorreu no início de 2025, quando Fernanda Torres venceu o Globo de Ouro de Melhor Atriz.

Fernanda Torres no Festival de Veneza Reprodução
Fernanda Torres no lançamento no Rio Reprodução
Fernanda Torres no BFI London Reprodução
Fernanda Torres no Governors Awards Reprodução
Fernanda Torres e Walter Salles no Festival de Palm Springs Reprodução
Fernanda Torres no Festival Internacional de Cinema de Santa Bárbara (SBIFF) Reprodução
Fernanda Torres no lançamento em São Paulo Reprodução
Fernanda Torres no lançamento em Roma Reprodução
Fernanda Torres no desfile da coleção de alta costura da Chanel durante a semana de moda de Paris Reprodução
Fernanda Torres no jantar em homenagem aos indicados ao Oscar 2025 Reprodução
Fernanda Torres na festa pré-BAFTA Reprodução
Fernanda Torres no lançamento em Londres Reprodução
Fernanda Torres no Globo de Ouro Reprodução
Fernanda Torres na festa da V Magazine Reprodução
Fernanda Torres no BAFTA Reprodução
 

Boa parte da bilheteria do filme veio na esteira das indicações (que ocorreram poucas semanas após a consagração de Fernanda no Globo de Ouro), e não do Oscar propriamente dito. O prêmio da Academia consagra carreiras e encerra a temporada de premiações. Desta maneira, as coisas costumam ocorrer antes da cerimônia em si.

Mas, logicamente, há terrenos a serem explorados com um Oscar em mãos. No mundo (estreou em 32 países, além do Brasil), “Ainda estou aqui” já fez US$ 30 milhões (cerca de R$ 176 milhões), segundo o site Mojo Box Office.

 


Chegada ao streaming


Com toda a repercussão do Oscar de Melhor Filme Internacional, o primeiro do Brasil, o filme continuará sua carreira ao longo deste mês. Mas a chegada em breve ao streaming (“Ainda estou aqui” estreia em 6 de abril no Globoplay) poderá fazer com que a força nas salas arrefeça gradativamente.

Um caso emblemático do fator indicação ao Oscar para a bilheteria de um filme é de 2000, ou seja, antes do streaming (o que era o cenário ideal para produções feitas para o cinema). Após a indicação em oito categorias do Oscar (cinco das quais acabou vencendo), “Beleza americana” (1999), de Sam Mendes, aumentou em 43% sua bilheteria. Isto somente nos EUA.

Com os atores e atrizes, o impacto de um Oscar se reflete não em bilheteria diretamente, mas na continuidade e relevância da carreira. Claro que existem os hors-concours. Mas um Oscar está longe de ser uma garantia de sucesso. Para cada Meryl Streep ou Daniel Day-Lewis, há um vencedor da estatueta de quem pouco se ouve falar.

O italiano Roberto Benigni, por exemplo. Em 1999 ele se tornou o “algoz” de “Central do Brasil”, primeira indicação de Walter Salles ao Oscar de Filme Internacional. Benigni, que dirigiu “A vida é bela”, também recebeu naquele ano a estatueta de Melhor Ator. Não teve nenhuma atuação relevante desde então.

Desenho animado da Letônia, 'Flow' acompanha gato que teve o lar destruído por enchente e passou a viver em um barco com outros animais. Dirigido por Gints Zilbalodis, concorre ao Oscar de Melhor Filme Internacional e de Melhor Animação. Dream Well Studio/divulgação
Produção francesa e mexicana, 'Emilia Pérez' é dirigido por Jacques Audiard. Com Karla Sofía Gascón, Zoe Saldana e Selena Gomez. Indicado a 13 Oscars em 2025, inclusive de Melhor Filme Internacional. Chefão de cartel decide se aposentar e desaparecer do radar das autoridades, com ajuda de advogada, para realizar o desejo de assumir sua verdadeira identidade trans como Emilia Pérez. Pathé/divulgação
'A semente do fruto sagrado', de Mohammad Rasoulof, é um longa iraniano, mas representa a Alemanha no Oscar de Melhor Filme Internacional. Isso porque o Irã perseguiu Rasoulof enquanto rodava o longa. Indicado a uma estatueta em 2025. Na trama, juiz luta contra a paranoia numa Teerã em ebulição política depois da morte de uma jovem. Run Way Pictures/divulgação
O sombrio dinamarquês 'A garota da agulha' aborda dilemas morais em torno da compra e venda de bebês na Copenhague pós-Primeira Guerra. Candidato ao Oscar de Melhor Filme Internacional, é dirigido por Magnus von Horn e protagonizado por Victoria Carmen Sonne. Na trama, costureira pobre encontra parceira para comandar agência de adoção clandestina. Lukasz Bak/divulgação
Produção franco-brasileira, 'Ainda estou aqui', dirigido por Walter Salles deu o primeiro Oscar da história do Brasil, premiado na categoria Melhor Filme Internacional. O longa é protagonizado por Selton Mello e Fernanda Torres Sony Pictures/divulgação

Nicolas Cage é um case em Hollywood de má gestão de carreira. Recebeu o Oscar de Melhor Ator em 1996 por “Despedida em Las Vegas” e, desde então, emenda um projeto atrás do outro. Todos absolutamente comerciais, sem nenhum prestígio cinematográfico. Até os dias de hoje, a única negra a vencer o Oscar de Atriz (principal), Halle Berry, depois do prêmio por “A última ceia” (2002), vem somando momentos de pouca expressão no cinema.

Marion Cotillard (Melhor Atriz por “Piaf – Um hino ao amor”, em 2008) e Cate Blanchett (oito indicações, duas delas que resultaram em Oscars) são bons exemplos de atrizes que conseguiram se manter bastante produtivas e relevantes após receber o prêmio. Já Hilary Swank, também detentora de dois Oscars (o mais recente deles há 20 anos, por “Menina de ouro”), hoje está longe da Lista A de Hollywood.

Um caso interessante é o de Anne Hathaway. Em 2013, a atriz levou a estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante por “Os miseráveis”. O prêmio foi uma das surpresas naquele ano. Sua atuação foi muito criticada – muitos a consideravam artificial demais. Surpreendida mesmo ficou a atriz quando, ao fazer uma busca no Google pelo próprio nome, se deparou com a seguinte pesquisa: “Por que todo mundo odeia Anne Hathaway?”.

Esta história foi relatada pela atriz à “Vanity Fair”, em 2024. “Muitas pessoas não me ofereciam papéis porque estavam muito preocupadas com o quão tóxica minha imagem havia se tornado on-line”, disse Anne Hathaway. Quem a “salvou”, segundo ela, foi Christopher Nolan, quando a escalou para o sucesso “Interestelar”.



Fernanda Torres não levou o Oscar, mas sua trajetória, mais do que estabelecida, sofreu um enorme desvio nos últimos seis meses. É cedo para dizer se toda a repercussão, aqui e lá fora, diante de sua candidatura, vai resultar em produções relevantes. Caso ela faça escolhas com a segurança que apresentou ao longo da campanha pelo Oscar, “Ainda estou aqui” terá representado um primeiro capítulo de uma nova temporada.

compartilhe