O guitarrista norte-americano Pat Metheny, um gigante do jazz mundial, desembarcou em Belo Horizonte no início dos anos 1990 com um pedido surpreendente. Fascinado pela música brasileira, especialmente pela obra de Milton Nascimento, ele não queria apenas tocar na cidade: sua missão era visitar o lendário Clube da Esquina.

Havia, no entanto, um detalhe crucial: o Clube da Esquina nunca existiu como um lugar físico. Não era um bar, uma casa de shows ou um estúdio com placa na porta. A equipe local precisou explicar ao músico que se tratava de um movimento artístico, o nome de um álbum icônico e, acima de tudo, um grupo de amigos que revolucionou a música – entre eles Lô Borges, que morreu nesse domingo (2/11), aos 73

A revelação poderia ter frustrado qualquer um, mas não Metheny. Com a admiração de um verdadeiro fã, ele insistiu. Se não havia um clube, ele queria ao menos conhecer a esquina onde tudo acontecia, o ponto de encontro que deu origem ao movimento e inspirou o nome daquele coletivo de artistas geniais.

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O destino foi o cruzamento das ruas Divinópolis e Paraisópolis, no Bairro Santa Tereza. Ali, em uma esquina aparentemente comum para os moradores, o guitarrista encontrou o epicentro de uma revolução sonora que o havia influenciado a milhares de quilômetros de distância.

A emoção foi imediata. Entrevistado pelo jornal Folha de S.Paulo em 1997, Salomão Borges, pai de Lô e do compositor Márcio Borges, disse Pat Metheny ficou visivelmente tocado ao chegar ao local. Ele confidenciou que a sensação era a mesma de um fã dos Beatles ao visitar Liverpool pela primeira vez, pisando no solo sagrado onde seus maiores heróis criaram sua arte. "Ele ficou emocionado. Disse que se sentiu como quando foi à cidade dos Beatles", disse Salomão, que morreu em 2014.  

Encontros e promessas 

O guitarrista estava acompanhado por poucas pessoas, entre elas Milton Nascimento e Tavinho Bretas. A primeira parada no bairro foi feita na casa da família Borges, onde estavam Lô Borges, sua irmã Solange e seus pais, Maricota e Salomão. Passaram a tarde juntos.

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“A recepção foi com grande alegria e carinho. Depois de cafezinhos, pães de queijo, biscoitinhos, muitos casos e boas risadas, mesmo com o Pat não entendendo nada do que falávamos, Lô e Milton levaram ele até a tal esquina. Naquela época não tinha ainda qualquer placa indicativa como referência, como hoje tem a do Museu Clube da Esquina. O Pat olhava para aquele lugar sem entender nada e a gente olhava para ele sorrindo e com aquela expressão de ‘é isso mesmo que você está vendo’”, lembra Bretas.

Talvez o guitarrista não se lembre, mas acabou deixando duas “dívidas” para trás. Uma delas foi feita nessa mesma visita aos Borges. Em entrevista ao Estado de Minas em 2014, Lô lembrava: “Naquela tarde, ele falou comigo que o 'Clube da esquina', de 1972, é um dos discos de cabeceira dele e que o incentivou a tocar e compor. Disse que queria gravar comigo, mas isso nunca aconteceu. Acho que isso foi mais uma gentileza dele”.

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Outro “credor” é Toninho Horta, que anos 1980 gravou suas músicas 'Moonstone' e 'Prato feito' (nos discos Moonstone e Toninho Horta, respectivamente) com o norte-americano. O mineiro afirma que, desde então, os dois conversam sobre fazer um disco inteiro juntos. 

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“Estou esperando até hoje”, brinca Horta. E o mineiro aproveita para mandar recado: “Músicos que têm vontade de gravar juntos às vezes não conseguem fazer isso por causa do business. O Pat tem muito compromisso, é do jazz mais pop. Já eu, sou facinho, facinho”, garante.

Uma ferramenta de IA foi usada para auxiliar na produção desta reportagem, sob supervisão editorial humana.

Com informações de reportagem do Estado de Minas de 07/05/2014.

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