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O que não pode faltar nas ceias de chefs? Pratos clássicos acionam memórias

Descubra como chefs e donos de negócios gastronômicos participam dos encontros de fim de ano em família

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Os abraços, as trocas de presentes e, sobretudo, de carinho típicos do fim de ano são sempre acompanhados de sabores que ficam na memória. As ceias deste período são momentos de reencontro, retrospectiva e recomeço, que provam o valor sentimental e cultural que a comida pode ter dentro das famílias.

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Muito além do sabor, esses preparos nos fazem lembrar de pessoas queridas que já se foram – mantendo viva as lembranças delas – e nos instigam a levar para os mais novos um pouco da tradição familiar.


Nesta edição do Degusta, mostramos como funcionam as ceias de chefs e profissionais da gastronomia, que passam todo o ano trabalhando tanto para servir os outros.

Afeto vira profissão

Junto com a tia, Houda, Gláucia Macaroun prepara o arroz marroquino, prato que desperta lembranças da sua avó, Zaquie
Junto com a tia, Houda, Gláucia Macaroun prepara o arroz marroquino, prato que desperta lembranças da sua avó, Zaquie Giselle Dietze/Divulgação

A paixão pela cozinha árabe foi passada para Gláucia Macaroun por sua avó, Zaquie, que chegou do Líbano em 1945, ao lado de seu marido. O ofício, no entanto, demorou a se tornar a fonte de renda da chef, que já trabalhou no comércio de roupas e até como professora de matemática (sua formação acadêmica é nessa área).

Foi em 2020 que Gláucia abriu sua empresa, a Rayak Cozinha Árabe, onde trabalha com eventos e delivery. Desde que começou, ela percebe que essa cozinha é, para nós, brasileiros, ligada aos momentos de celebração. “Ela é gostosa, prática e visualmente atrativa”, explica, destacando que a gastronomia árabe sempre foi cotidiana em sua vida.

Justamente por aliar o sabor, a praticidade e a beleza, a comida libanesa feita por Gláucia é muito pedida no fim de ano, o que faz com que a chef, assim como boa parte dos profissionais da área, trabalhe ainda mais que o usual.

“Todo Natal, como faço comida o dia inteiro, penso que gostaria de experimentar a comida de outras pessoas, mas não consigo não fazer nada. Cozinhar para mim não é só trabalho, é vida.”

Sabores natalinos

Namura é um doce árabe feito com sêmola de trigo e amêndoa e embebido em calda de açúcar e laranja
Namura é um doce árabe feito com sêmola de trigo e amêndoa e embebido em calda de açúcar e laranja Miryam Alice/Divulgação

Muitos dos produtos tipicamente ligados ao Natal na culinária árabe são os que mais estão na memória de Gláucia, e que conquistam também o paladar de seus clientes. O hraibe, biscoitinho amanteigado polvilhado com pistache triturado, é exemplo disso.

“Para mim, ele é mágico, tem cheiro de Natal. Ao contrário do que costumamos ver, de gengibre ou canela, na minha casa esse sempre foi o cheirinho que marcou essa época do ano.”

A receita de Gláucia é feita com manteiga ghee (clarificada). Resultado de um processo de cocção da manteiga, ela apresenta sabor amendoado. A bandeja com nove unidades é vendida por R$ 25.


Outro prato que traz lembranças das ceias ao lado da avó é o arroz marroquino. A receita combina carne moída, bastante manteiga, especiarias, lascas de frango e “snoubar” (nome em árabe para o pinole). O prato custa R$ 180 o quilo.

O que Gláucia costuma fazer em todas as celebrações de Natal da sua família é o doce. Ela sempre opta pelo namura (R$ 120, bandeja com 800g), que parece um bolinho, feito com sêmola de trigo e amêndoa e embebido em calda de açúcar e laranja. “Esse doce é memória pura da minha avó. Ela fazia sempre, não só no Natal.”

Pernil do avô

'Para mim, a ceia tem carne de porco, arroz, tutu de feijão e farofa'- Kelma Zenaide, Território Kitutu de Aquilombamento
"Para mim, a ceia tem carne de porco, arroz, tutu de feijão e farofa"- Kelma Zenaide, Território Kitutu de Aquilombamento Leandro Couri/EM/D.A.Press

As festas de fim de ano na casa de Mestra Kelma Zenaide, fundadora do Território Kitutu de Aquilombamento, que fica no Centro de BH, sempre foram muito grandes. Isso porque sua família morava em um mesmo terreiro. “Meu avô fez questão de que os três filhos morassem em seu quintal. Cada um tinha sua casa com sua família naquele espaço e, no meio, unindo as quatro casas, havia um fogão de lenha”, explica.

Na ceia de Natal, cada casa levava um item para a mesa e o avô de Kelma, Raimundo Conceição, ficava responsável pelo pernil. “Eu, que sou a neta mais velha, adorava ficar vendo ele macerar os temperos e preparando a carne.”

Ceia com amigos

Hoje, quatro anos após a morte do avô, Kelma se lembra desses momentos e sabores e passa a trazer novos sentidos e temperos para sua celebração de Natal, sem nunca esquecer dessa tradição. “Para mim, a ceia tem carne de porco, arroz, tutu de feijão e farofa”, explica, destacando que atualmente usa mais o lombinho que o pernil.

O arroz também pode ganhar nova roupagem. Kelma o prepara com passas, banha de porco e bacon – seus familiares costumam usar vagem e cenoura também. No tutu, ela utiliza urucum, pimenta-do-reino e bastante alho. Por cima, molho de tomate e ovo cozido.

A farofa também é terreno fértil para a especialista em culinária afro-brasileira, que costuma acrescentar azeite de dendê. “Tradicionalmente, fazíamos com o caldinho do pernil.” Para acompanhar, Kelma sugeriu uma salada de batata com maionese e cebola roxa.

Essa combinação ganhou novos sentidos na vida da profissional. Já sem a mãe (falecida há cerca de 30 anos) e o avô (que morreu há quatro), ela perdeu um pouco do contato com a família e com o Natal que costumava ter. Mas não abre mão de celebrar.

Kelma costuma preparar o prato com lombinho e esses acompanhamentos para um grupo de amigos no dia 25 de dezembro. “Faço esse prato no Território Kitutu em maio [época em que se iniciam as festas de congado]. É uma mistura de sabores muito ligada à cultura preta.”

Salada brasileira

A celebração de Natal de Marcos Proença, proprietário do bar Patorroco (que também é seu apelido) mudou muito ao longo dos anos. “Antigamente, só na minha casa éramos 17 pessoas. O Natal da família tinha umas 40 ou 50 pessoas…Neste ano, o nosso tem 12 pessoas no total”, explica.

Isso, evidentemente, influenciou a ceia. Se antes faziam leitão assado, hoje optam por um joelho de porco. “O único prato que todos fazem questão, que não pode faltar, é o salpicão, essa salada tão brasileira”, destaca Marcos.

A receita, que ele aprendeu com a mãe, leva frango defumado, carne de porco, presunto, salsão, cenoura, vagem, passas hidratadas no rum, azeitona, batata-palha, chuchu em conserva e fios de ovos. Hoje, Marcos faz algumas adaptações. Retira a vagem, por exemplo, para agradar mais a criançada. O pepino em conserva também costuma entrar no lugar do chuchu.

“Um salpicão bem-feito é um prato completo, é muito rico. Gosto de mostrar para os mais novos da família essa tradição”, completa Marcos, que ainda chama a atenção para o fato de ser um prato leve, fácil de comer durante toda a noite, até por ser frio.

O chef não serve o salpicão no Patorroco, bar no Prado, Região Oeste de BH, mas não descarta a possibilidade de, algum dia, levar para os clientes o gostinho da sua ceia natalina.

Tradições compartilhadas

Decorada com alface, a salada de frango defumado é um clássico de Natal dos chefs à frente da Casa Verona
Decorada com alface, a salada de frango defumado é um clássico de Natal dos chefs à frente da Casa Verona Arquivo pessoal

O casal João Bertolotti e Lara Tassis está à frente da Farinharia Pizza e Co. e da cafeteria e confeitaria Bolos de Julieta, que ficam na Casa Verona, Bairro São Luiz, Região da Pampulha (a pizzaria também tem uma unidade, inaugurada este ano, no Belvedere, Região Centro-Sul de BH).

A dupla aproveita o Natal para apresentar, à família um do outro, pratos tradicionais das ceias de suas casas. Lara, por exemplo, é responsável pela salada que sua mãe, já falecida, fazia todos os anos. Ela leva frango defumado, milho, creme de leite, abacaxi em calda, maionese e é decorada com alface.

João, por sua vez, investe no doce. Seu favorito, que evoca mais memórias ao lado de familiares, é a rabanada. “Tenho lembranças de ver a minha avó fazendo essa rabanada. Ela ainda colocava um pouco de vinho tinto na mistura de leite e ovo, em que o pão é embebido. Fazendo isso, levo um pedacinho da minha história para a mesa.”

O Natal de 2025 é especial para ele, pois sua filha com Lara, Cecília, de apenas dois anos, está comendo o doce pela primeira vez. “Vai ser memorável. É mais uma geração que vai conhecer a rabanada da minha família.”

Pizza no cardápio

Lara Tassis e João Bertolotti aproveitam a época para apresentar, à família um do outro, pratos tradicionais das suas ceias
Lara Tassis e João Bertolotti aproveitam a época para apresentar, à família um do outro, pratos tradicionais das suas ceias Casa Verona/Divulgação

Se na infância de João os pratos salgados eram esses bem tradicionais de famílias brasileiras, como peru, chester ou pernil, farofa e arroz com lentilha, hoje as ceias já são mais criativas. Além da salada tradicional da família de Lara e da rabanada, elas costumam ter espaço para receitas menos tradicionais, como churrasco e até mesmo a pizza, que foi feita pela primeira vez no último ano.

“As pessoas olham para mim e pensam em pizza. Tem criança na família que me chama de ‘tio pizza'”, comenta João. Nada mais justo, portanto, que ele comece a tradição da pizza no Natal de sua família. “A pizza é boa de levar para a ceia por ser democrática, atende diversos gostos, inclusive de crianças. Elas, aliás, podem ajudar na montagem das massas.”

Para fechar com chave de ouro

O doce não é, de forma alguma, menos protagonista que o salgado nas ceias de fim de ano. Levar a sobremesa é a escolha de alguns chefs pela praticidade ou simplesmente porque eles querem sair da rotina da produção de pratos salgados.

Regilene Coelho, dona do restaurante Maturi, no Bairro Santa Tereza, Região Leste de BH, é sempre responsável pelo doce nas ceias de sua família. “Isso começou muito por eu estar cansada nos dias 24 e 25. Por isso, sempre levo o marrom glacê, um doce que me traz muitas lembranças e que é prático. Faço durante a semana para estar prontinho no dia da ceia.”

'Comecei a fazer essa sobremesa sem saber bem o porquê, mas depois entendi que era a saudade de casa' - Regilene Coelho, dona e chef do Maturi
'Comecei a fazer essa sobremesa sem saber bem o porquê, mas depois entendi que era a saudade de casa' - Regilene Coelho, dona e chef do Maturi Leandro Couri/EM/D.A Press

A receita que Regilene prepara era feita na sua família com castanha portuguesa, mas, por ser um produto mais difícil de encontrar, eles passaram a usar batata-doce. O tubérculo é mergulhado em calda de açúcar caramelizado.

“No Natal da casa da minha mãe tinham outros doces, a exemplo do pudim, creme de bacuri ou de cupuaçu, mas o marrom glacê sempre foi o meu favorito”. Vale ressaltar que a família materna de Regilene é de Imperatriz, no Maranhão. Por isso, preparar o doce em terras mineiras, para a ceia natalina de seu marido, é ainda mais simbólico.

“Comecei a fazer essa sobremesa sem saber bem o porquê, mas depois entendi que era a saudade de casa. É um doce de celebração em Imperatriz, é muito comum lá”, diz, destacando que, sempre que faz, pensa na sua mãe, Raimunda.

O mais curioso é que, apesar de se lembrar de casa por meio do doce, Regilene só aprendeu a receita dele quando já morava em Belo Horizonte. “Isso deve ter uns 16 anos. Quando liguei um dia para a minha mãe dizendo que estava com saudade de comer o marrom glacê e ela me ensinou bem assim, à distância.”

Torta especial

As nozes são protagonistas na torta de Natal da confeitaria Eu Que Fiz, que faz parte da ceia do dono, Saulo Chiabi
As nozes são protagonistas na torta de Natal da confeitaria Eu Que Fiz, que faz parte da ceia do dono, Saulo Chiabi Eu Que Fiz/Divulgação

Uma sobremesa que é frequentemente escolhida para compor ceias natalinas e celebrações em geral é a torta. De sabores diversos, ela pode agradar gregos e troianos, além de servir um bom número de pessoas.


Na ceia da família de Saulo Chiabi, proprietário da doceria Eu Que Fiz, no Bairro Funcionários, Região Centro-Sul de BH, um sabor específico de torta de sua marca ganhou o coração de todos. Criada especialmente para a data, a Torta Especial Natalina é vendida em fatia (R$ 26) ou inteira (a partir de R$ 164).

O doce é composto por massa de brownie, caramelo com noz-pecã, ganache de nozes e ganache de chocolate. “Uma das lembranças mais fortes que tenho de Natal é de abrir nozes usando as portas de casa. Acho que por isso optei por trazê-las para essa torta. Já tinha criado uma versão com amendoim antes para a época da festa junina.”

Antes de se casar, Saulo não tinha muitas tradições envolvendo o Natal. Desde que começou a passar a data ao lado da família da esposa, ele leva um doce de sua empresa. A Torta Especial Natalina foi criada há pouco tempo, mas já virou tradição.

Anote a receita: salpicão com frango, pernil e presunto
(Marcos Proença – Patorroco)

Salpicão é receita da mãe de Marcos Proença, do Patorroco
Salpicão é receita da mãe de Marcos Proença, do Patorroco Leandro Couri/EM/D.A.Press

Ingredientes

  • 600g de frango defumado desfiado;
  • 600g de pernil cozido ou assado desfiado;
  • 400g de presunto em fatias mais grossas cortadas em tirinhas;
  • 120g de passas brancas (hidratadas no rum);
  • 550g de cenoura ralada fininha;
  • 1 talo de salsão em cubos;
  • 1 pimentão vermelho cortado em tirinhas;
  • Sal a gosto;
  • 1 pimentão amarelo cortado em tirinhas;
  • 100g de azeitonas picadas;
  • 2 maçãs-verdes com casca picadas em tirinhas;
  • Maionese a gosto;
  • Pimenta-branca moída na hora a gosto;
  • 150g de fios de ovos;
  • Cerca de 15 unidades de pepinos em conserva cortados em tirinhas;
  • 1 pacote de batata-palha extrafina.

Modo de fazer

  • Misture todos os ingredientes em um recipiente, reservando apenas os fios de ovos, a batata-palha, a pimenta e a maionese.
  • Acrescente a maionese aos poucos, até que o salpicão fique úmido, mas ainda “soltinho”.
  • Coloque a pimenta e acerte o sal.
  • Na hora de servir, adicione a batata-palha e use os fios de ovos na finalização.

Serviço

Rayak Cozinha Árabe (@rayakcozinhaarabe)
(31) 99511-6608

Território Kitutu de Aquilombamento (@kitutugastronomiaafrobrasileira)
Rua Aarão Reis, 496A, Centro
(31) 99839-2297
Sexta, das 19h às 23h; sábado, das 12h às 22h; domingo, das 12h às 20h

Patorroco (@patorroco)
Rua Turquesa, 865, Prado
(31) 3372-6293
De segunda a sexta, das 18h às 23h30; sábado, das 12h às 23h30

Farinharia Pizza e Co. (@farinhariapizza)
(Unidade Botânico Shopping)
Rua Jornalista Djalma Andrade, 177, Belvedere
Todos os dias, das 11h30 às 22h
(Unidade Casa Verona)
Rua Expedicionário Paulo de Oliveira, 10, São Luiz
De quinta a domingo, das 17h às 22h
(31) 97231-7370

Bolos de Julieta (@bolosdejulieta)
Rua Expedicionário Paulo de Oliveira, 10, São Luiz
(31) 97231-7370
Terça e quarta, das 13h às 19h; quinta e sexta, das 13h às 22h; sábado e domingo, das 9h às 22h

Maturi (@maturibh)
Rua Mármore, 169, Santa Tereza
Sexta, das 11h às 15h; sábado e domingo, das 11h às 16h30

Eu Que Fiz (@euquefiz.co)
Rua Santa Rita Durão, 1063, Funcionários
(31) 98410-4016
De segunda a sexta, das 10h às 18h30; sábado, das 9h às 15h

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*Estagiária sob supervisão da subeditora Celina Aquino 

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