Em março deste ano, a Sra. completou 10 anos de Ministério Público. Como foi sua trajetória na carreira até aqui?
Ingressei no MPMG em 2008, no cargo de analista. Ali nasceu o sonho de me tornar promotora de justiça. Em 2015, já como promotora de justiça substituta, iniciei minha jornada na comarca de Carlos Chagas, no Vale do Mucuri. Logo após, fui promovida para a comarca de Salinas, no Norte de Minas, onde tive a felicidade de trabalhar, como promotora titular, por pouco mais de cinco anos.
Carrego a comarca de Salinas no meu coração. Em Salinas, trabalhei em diversas áreas, especialmente na defesa do patrimônio público, dos idosos e deficientes, no controle externo da atividade policial, no apoio comunitário e na área criminal. Sempre gostei muito das áreas nas quais é necessário contato direto com a sociedade. O promotor de justiça só consegue desempenhar bem suas funções quando a sociedade o auxilia a entender o que deve ser priorizado em cada localidade.
A sociedade de Salinas foi muito generosa comigo, o que me proporcionou conhecer os seus maiores anseios, especialmente, naquelas questões em que havia possibilidade de atuação do Ministério Público. Em agosto de 2020, removi para Viçosa, onde permaneci aproximadamente dois anos. As áreas nas quais mais atuei em Viçosa foram a da infância e da juventude e a criminal, especialmente no Tribunal do Júri.
A área da infância e da juventude exige muita dedicação do promotor de justiça, mas, ao mesmo tempo, amplia a nossa visão de mundo, na medida em que somos conduzidos e compreender que a letra fria da lei não resolve todos os problemas da vida. A sensibilidade humana nunca será substituída por qualquer outro instrumento e compreender isso nos torna mais fortes para assumirmos nossas decisões.
Depois de Viçosa, tive uma breve passagem por Campos Gerais, no Sudoeste de Minas e, em 2024, promovi para Santa Luzia, comarca na qual trabalho atualmente na área criminal, especialmente no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher.
A Sra. é tida como uma promotora combativa e detentora de grande experiência em temas sensíveis. Qual deve ser o papel do MP no combate à corrupção, na sua opinião ? Este papel tem sido desempenhado?
O bom combate está na alma do membro do Ministério Público. No combate à corrupção, o Ministério Público deve agir rigorosamente. A adequada destinação de recursos públicos é fundamental para que o estado desempenhe suas obrigações junto à sociedade. Acredito que o combate à corrupção tem sido desempenhado, mas sempre há espaço para aprimoramento.
A violência doméstica ainda é uma triste realidade no Brasil. Em Minas Gerais, como a Sra. enxerga esse problema? Tem havido uma redução dos casos? Quais as medidas deveriam ser adotadas ou incrementadas para o seu combate?
A violência doméstica é a raiz de muitos dos problemas da sociedade em qualquer lugar do mundo. Violentar uma mulher significa violentar toda a família, e as feridas dessa violência reverberam por muito tempo nas vidas de todos os familiares, causando inúmeros problemas secundários graves. Falar em estatísticas na seara da violência doméstica, na minha visão, é muito complexo, uma vez que, quando há o aumento da quantidade de pedidos de medidas protetivas, geralmente, há diminuição dos crimes graves cometidos nesse contexto. A maioria das mulheres vítimas de feminicídio não possuía medida protetiva. A medida protetiva é o meio mais eficaz de reduzir os crimes graves cometidos em contexto de violência doméstica e familiar contra a mulher, mas há alguns obstáculos de natureza social, financeira e até cultural a serem vencidos para que as mulheres estejam fortalecidas e consigam buscar ajuda. Para vencer esses obstáculos é necessária a existência de uma rede de proteção forte, que acolha essas mulheres e atue de forma articulada e interdisciplinar. O Ministério Público seguirá, intransigente, no combate à violência doméstica.
A atuação feminina nos Tribunais do Juri são uma realidade ou ainda as promotoras, advogadas e até magistradas de júri ainda são uma minoria? Quais as dificuldades e desafios?
A maior dificuldade é exatamente o preconceito enraizado na sociedade e também no mundo jurídico. Apesar disso, a atuação das mulheres no Tribunal do Júri é uma realidade, embora a maioria dos promotores, advogados e magistrados que atuam nessa área sejam homens. Ainda existe uma cultura de enxergar a mulher como que se ela fosse menos capaz que o homem, mas isso só muda à medida que nós, mulheres, rompemos essas barreiras. Como romper essas barreiras? Indo lá, atuando no Tribunal do Júri e mostrando que gênero não determina competência, dedicação e comprometimento.