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O Sr. sempre teve atuação na área penal. Temos um Código Penal de 1940, que vem sendo “remendado” por atos legislativos. Na sua visão, já era hora de um Novo Código Penal e de Processo Penal ou a atuação dos parlamentares, conforme a necessidade da sociedade, tem conseguido gerar a segurança jurídica necessária para enfrentar a criminalidade?


De modo algum acho que seja o momento para se partir para uma reforma de grande monta da Legislação Penal e Processual Penal, ainda mais com a elaboração de novos Códigos. O momento político altamente polarizado é totalmente inadequado para que tal ocorra. Temos juristas e doutrinadores de escol, que certamente desejariam muito contribuir para “melhorar” o que existe, mas nem toda novidade supera a qualidade do que havia anteriormente, ainda mais com os riscos envolvidos na votação de matérias de tamanha importância, pois muitas vezes se propõe maravilhas, mas o que é votado, aprovado e sancionado costuma ser justamento o oposto. Um risco imenso.


Melhor ir trabalhando com o que temos, e já conhecemos. As mudanças devem ser feitas pontualmente, como vem sendo feito, na medida em que a sociedade modifica seus hábitos e conceitos. É muito mais prudente. O país, como já referido, vive um momento de imensa polarização social e política. Os Digestos anteriores foram produzidos em épocas que tinham suas conturbações, mas nada parecido com o que hoje se apresenta. O crime – este então – vive uma revolução de conceitos e tecnologia. Para nossas organizações criminosas, o céu parece ser o limite. Já militam em terras estrangeiras com exércitos divididos entre os comandantes, os CEOs, e seus agentes armados de infratores. Esses já dispõem de um “Código” muito peculiar, para julgar, condenar e “executar” seus desafetos, aqueles que se colocam no seu caminho. Risco imenso para juízes, promotores de Justiça, outras autoridades, ou qualquer um que se coloque como obstáculo. O combate à criminalidade organizada é prioridade absoluta. Para ontem. Temos os Gaecos operantes e instrumentos legais fortíssimos para serem utilizados. Definitivamente, a elaboração de um novo Código Penal em momento tão sombrio seria muito temerário. Abriria flanco para grande insegurança jurídica, grandes questionamentos de natureza Constitucional, o que poderia engessar e inviabilizar ações em curso. Seriam anos de adaptação em uma área que demanda celeridade e certeza nos passos a serem dados. A elasticidade nas interpretações da lei, muitas vezes excessiva, já causa insegurança jurídica, e amplia os debates de forma desarrazoada. Imagine ante a alteração como sugerido. A ideologização atual é um fator a ser considerado para desaconselhar o avanço de tais empreitadas.


Leis Especiais têm atualizado o Código Penal e o Código de Processo Penal, e são mais efetivas que uma nova condensação total. Vemos as especificidades da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), por exemplo, do Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), Lei de Organizações Criminosas (Lei 12.850/2013) e de Lavagem de Dinheiro (Lei 9.613/1998). Basta uma rápida busca no Google, e em segundos o texto legal será encontrado e disponibilizado para o usuário. Por tais razões, entendo que devam prevalecer as revisões parciais, atualizações técnicas ou ajustes derivados de novas demandas sociais e da jurisprudência. Deve haver um equilíbrio entre segurança jurídica e modernização do sistema penal. Não podemos estimular neste momento insegurança jurídica e retrocessos democráticos.


Atualmente, o crime organizado proliferou por várias regiões do Brasil e até para outros países. O que, no seu entendimento, causou esse crescimento da criminalidade no país? Há como enfrentar?


A sensação de impunidade, ou a certeza dela, é o fator que faz com que milhares de pessoas desrespeitem diariamente a Lei, para garantir enriquecimento ilícito. Quando foi aprovado o fim das “saidinhas”, e depois de derrubado o veto, passou a vigorar a matéria, um raio de esperança me atingiu. Mas percebemos que é extremamente difícil aprovar matérias desta natureza, sob uma gama imensa de argumentos, e, aprovadas, encontram todo o tipo de obstáculo. Para saber o porquê da proliferação vertiginosa do crime organizado, há que se estudar as razões que levam legiões de delinquentes a dominarem estados e regiões inteiras do nosso país. Leio esparsamente sobre a atuação do “Novo Cangaço” na região Nordeste. Um acinte. Foi muito rápida esta evolução. Temos que saber, para ontem, o que aconteceu. Como as coisas chegaram neste ponto. As causas são óbvias: a primeira, a vontade de se aproveitar do patrimônio alheio, e o alheio hoje é inclusive o patrimônio público, pois as organizações se expandem para se apropriar do transporte público, e outras áreas de atuação por concessão do Estado. Há que se apurar, e punir exemplarmente todos os envolvidos na cadeia do crime organizado. O segundo aspecto é a sensação de impunidade, como já mencionado, ou a certeza dela, e as razões que levam a isso é o que deve mover todos os que trabalham com o Direito Penal. Está óbvio que os agentes do crime consideram que o risco vale a pena. Por que isso? Há coisas muito estranhas nesta equação. Alguma coisa não está muito ajustada, já que o risco para a sociedade só faz progredir geometricamente. Quanto mais se sofistica o Processo Penal e mais se moderniza o Direito Penal, mais sofisticado se torna o crime e maior a audácia dos criminosos.


Imprescindível a melhoria constante da organização do sistema prisional, para dificultar ou evitar a possibilidade de recrutamento por comandos de facções criminosas, visando estruturação de novas redes, ou mesmo evitar que facções assumam o controle interno.


O combate incansável à corrupção e a evolução da inteligência policial podem dificultar bastante a proliferação do crime organizado. Há avanços, mas o que é bom, como já ouvi alhures, pode melhorar, e medidas que impliquem na redução da desigualdade social e aumente a presença do Estado nas comunidades muito podem auxiliar. O avanço das políticas penitenciarias de separação de presos por periculosidade, do controle da comunicação dentro dos estabelecimentos prisionais e – especialmente – um trabalho diuturno para reinserir no convívio social aqueles que podem se reintegrar, e que procuraram usar o tempo de segregação para o trabalho e estudo. Acredito muito que o futuro trará melhorias, e muito já se fez. Há pessoas muito sérias trabalhando em prol de tais desideratos. Atualmente não se ouve mais falar em grandes rebeliões. Há muita preocupação com a harmonia dentro dos presídios.


Nos últimos meses, duas das organizações criminosas mais conhecidas – PCC e CV – vêm sendo diuturnamente denunciadas pela imprensa nacional e estrangeira como infiltradas em diversos países do mundo, movimentando bilhões de dólares e “lavando dinheiro” em postos de combustíveis, produção de álcool e outras atividades. Parece ser apenas a ponta do iceberg. Algumas congêneres latino-americanas foram declaradas organizações terroristas e, nesta condição, encontrarão um trato estatal bem peculiar, inclusive por parte de governos estrangeiros, como temos visto na costa da Venezuela, o que parece ser um embrião de uma operação um tanto maior. De simples organização criminosa para organização terrorista. Este é o princípio de uma nova e instigante jornada. A verdade é que a criminalidade, segundo pesquisas, é a maior das preocupações dos brasileiros hoje. E as pesquisas, sabemos, movem os legisladores.

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