Desde os primórdios da nossa existência, o desenvolvimento cognitivo humano tem sido uma área fascinante de estudo. Um fenômeno particular que tem chamado a atenção dos pesquisadores é a “amnésia infantil”, um termo que descreve a incapacidade de recordar eventos dos primeiros anos de vida. A complexidade por trás desse fenômeno impulsionou tanto neurologistas quanto psicólogos a investigar sua origem e suas implicações.
Uma das perguntas centrais, que divide a opinião dos especialistas, é se durante os primeiros anos são de fato produzidas memórias que não podem ser acessadas posteriormente, ou se o cérebro simplesmente não é capaz de gerá-las nessas fases. Tradicionalmente, acreditava-se que os bebês não formavam lembranças devido a um hipocampo pouco desenvolvido, uma região essencial para o armazenamento de novas memórias.
O hipocampo dos bebês está pronto para as memórias?
Pesquisas recentes mediram a atividade cerebral de bebês enquanto lhes eram apresentadas imagens, e descobriram que o hipocampo é capaz de certo processamento de memórias desde o primeiro ano de vida. Essa evidência sugere que os circuitos neuronais necessários para a memória podem estar operacionais antes do que se pensava. Além disso, avanços recentes em técnicas de neuro-imagem têm permitido acompanhar com mais precisão o desenvolvimento do hipocampo nos primeiros anos, ampliando o entendimento sobre quando as memórias começam a ser formadas.

O que acontece com essas memórias precoces?
Se existem indícios de que os bebês podem formar memórias, surge a questão: o que acontece com essas memórias à medida que a criança cresce? Catherine Loveday, neuropsicóloga, afirma que as crianças são capazes de relatar eventos recentes, embora essas lembranças não persistam ao longo do tempo. A reflexão leva a questionar a durabilidade das memórias precoces e sua evolução para lembranças conscientes, que possam ser evocadas no futuro. Pesquisas comparativas entre países, como Canadá e China, também apontam que fatores culturais moldam a narrativa dos primeiros relatos infantis, influenciando a longevidade das memórias.
Podemos confiar em nossas primeiras lembranças?
Analisar a veracidade das primeiras memórias também adiciona uma camada complexa ao entendimento da memória infantil. A reconstrução de lembranças baseada em narrativas externas, mais do que em experiências genuinamente vividas, pode gerar memórias que parecem reais, mas não correspondem a vivências autênticas. Esse processo desafia nossa compreensão sobre consciência e reacende o debate sobre identidade pessoal. Estudos realizados pela equipe de Harvard University indicam que muitos adultos acreditam recordar cenas que, na verdade, foram influenciadas por relatos de familiares ou por fotos antigas, demonstrando a facilidade com que a memória pode ser moldada ao longo do tempo.
A amnésia infantil redefine quem somos?
A existência de um “vazio” na memória dos primeiros anos implica uma contemplação mais profunda sobre como nos concebemos. Ao questionar por que essas memórias se dissipam, os pesquisadores exploram uma parte fundamental da condição humana: o significado da memória e seu impacto na jornada do autoconhecimento.