O entendimento sobre como o cérebro tenta controlar o sofrimento físico tem avançado significativamente nos últimos anos. Pesquisas recentes revelam que o organismo possui mecanismos próprios para limitar a intensidade do desconforto, especialmente em situações de dor aguda. No entanto, quando a dor se torna persistente, esses sistemas podem falhar, contribuindo para o desenvolvimento de quadros crônicos que afetam milhões de pessoas.
Estudos realizados por equipes internacionais, incluindo pesquisadores da Universidade Hebraica de Jerusalém, têm destacado diferenças importantes entre a resposta do sistema nervoso à dor de curta duração e à dor crônica. Essas descobertas ajudam a explicar por que certos tipos de dor desaparecem naturalmente, enquanto outros se prolongam, tornando-se um desafio para a medicina moderna.
Por que a dor aguda e a crônica são tão diferentes? Um estudo explica o porquê.
Um estudo conduzido pela Universidade Hebraica de Jerusalém em parceria com centros nos Estados Unidos e no Brasil lançou luz sobre as razões biológicas para as diferentes naturezas da dor aguda e crônica. Os pesquisadores verificaram que a dor aguda, geralmente desencadeada por uma lesão ou inflamação passageira, ativa intensamente o mecanismo de “freio” natural do organismo, controlando rapidamente a transmissão dos sinais dolorosos. Em contraste, na dor crônica, esse sistema de controle se desgasta ou é interrompido, possibilitando que os estímulos dolorosos persistam mesmo após o fim do fator desencadeante. O estudo também aponta que fatores genéticos, ambientais e até psicológicos influenciam no modo como cada indivíduo experimenta a passagem da dor aguda para a dor persistente, o que pode explicar as variações entre pessoas submetidas a condições semelhantes.
Como o cérebro regula a dor?
O sistema nervoso central conta com regiões especializadas para processar e modular as sensações dolorosas. Uma dessas áreas é o tronco cerebral, onde neurônios atuam como uma espécie de estação de retransmissão para os sinais de dor vindos do corpo. Durante episódios de dor aguda, esses neurônios ativam mecanismos que funcionam como um “freio”, reduzindo a transmissão dos sinais e impedindo que o desconforto se intensifique.
Esse processo envolve correntes elétricas específicas, como a chamada corrente tipo A (IA), responsável por regular a excitabilidade das células nervosas. Quando o corpo enfrenta uma lesão ou inflamação passageira, a IA aumenta, limitando a propagação dos impulsos dolorosos. Assim, o organismo consegue proteger-se de estímulos excessivos, favorecendo a recuperação.

Por que o sistema de controle falha na dor crônica?
Em casos de dor crônica, que podem durar meses ou até anos, os mecanismos naturais de controle deixam de funcionar adequadamente. Pesquisas apontam que, nessas situações, as mesmas células nervosas que deveriam reduzir sua atividade acabam se tornando mais ativas, enviando um número maior de sinais ao cérebro. Isso contribui para a manutenção do sofrimento, mesmo após a resolução da causa inicial.
O principal fator envolvido nessa mudança é a falha no aumento da IA. Sem esse ajuste, as células permanecem hiperexcitadas, facilitando a perpetuação do quadro doloroso. Esse fenômeno pode explicar por que tratamentos convencionais nem sempre são eficazes em pacientes com dor persistente, como ocorre em casos de enxaqueca ou dores musculoesqueléticas crônicas. Pesquisas internacionais, como as realizadas em Israel, Estados Unidos e Brasil, vêm reforçando esses achados ao identificar alterações em nível celular e molecular nessas condições.
Quais são as perspectivas para o tratamento da dor crônica?
Compreender as diferenças entre os mecanismos de dor aguda e crônica abre caminho para o desenvolvimento de terapias mais direcionadas. Novas abordagens buscam restaurar ou imitar o sistema de “freio” natural do organismo, com o objetivo de impedir que a dor temporária se transforme em um problema duradouro.
- Medicamentos moduladores: Pesquisas investigam substâncias capazes de aumentar a IA ou regular a atividade dos neurônios envolvidos.
- Técnicas de neuromodulação: Métodos como estimulação elétrica ou magnética do cérebro estão sendo testados para reequilibrar o sistema de controle da dor. Em centros de referência, como no Hospital das Clínicas de São Paulo, esses métodos são alvo de estudos clínicos avançados.
- Abordagens personalizadas: A identificação dos mecanismos celulares específicos em cada paciente pode permitir tratamentos sob medida, aumentando as chances de sucesso. Plataformas digitais e softwares de análise integrados, como sistemas de inteligência artificial, auxiliam nesse processo ao interpretar dados clínicos e genéticos.
Estima-se que, em 2025, cerca de 50 milhões de pessoas convivam com dor crônica no mundo, sendo que aproximadamente um terço dos casos envolve enxaqueca. A busca por soluções mais eficazes continua sendo uma prioridade para a ciência, que agora conta com novas pistas sobre como o próprio corpo tenta – e às vezes não consegue – limitar o sofrimento. O avanço no conhecimento desses processos promete trazer esperança para quem enfrenta esse desafio diariamente.