O conceito de livre-arbítrio é amplamente debatido na psicologia e na neurociência, e para a psicóloga Andressa Leal (@psiandressaleal), esse poder de escolha pode não ser tão absoluto quanto imaginamos. Segundo ela, muitas das nossas decisões já estão condicionadas antes mesmo de nos darmos conta, moldadas por vivências, traumas e o contexto em que fomos criados. Ao entender isso, é possível desenvolver mais autocompaixão e compreender melhor nossos comportamentos.
Essa reflexão também se apoia em estudos de grandes nomes da neurociência, como Robert Sapolsky, que desafiam a ideia de que somos totalmente livres para escolher nossos caminhos. Em vez disso, sugerem que grande parte das nossas decisões são reativações baseadas em experiências passadas, contexto familiar e fatores biológicos. Isso não nos exime de responsabilidade, mas pode nos ajudar a olhar com mais empatia para nossas escolhas e as dos outros.
Existe livre-arbítrio ou somos apenas produto do ambiente?
Essa é uma das maiores questões da psicologia comportamental e das neurociências. Pesquisadores como Sapolsky afirmam que a ideia de um livre-arbítrio absoluto é ilusória. Nossas ações estão profundamente conectadas a fatores como histórico familiar, vivências na infância, traumas e até mesmo fome, sono e estresse no momento da tomada de decisão. Esses elementos afetam estruturas cerebrais responsáveis por julgar, decidir e agir.
Um estudo clássico da Universidade da Califórnia mostrou que o cérebro toma certas decisões até 7 segundos antes da pessoa estar consciente delas. Isso indica que boa parte das escolhas podem estar sendo feitas “nos bastidores” da nossa consciência, reforçando a hipótese de que nossas escolhas não são totalmente autônomas.
O que Robert Sapolsky diz sobre livre-arbítrio?
Robert Sapolsky, neuroendocrinologista de Stanford, é um dos principais nomes a questionar o livre-arbítrio. Em seu livro “Determined: A Science of Life Without Free Will”, ele argumenta que nossas escolhas são resultado de uma complexa interação entre genética, histórico de vida e condições ambientais. Para ele, tudo que fazemos é uma resposta baseada em informações prévias, algumas que não conseguimos sequer identificar.
Segundo Sapolsky, aceitar que não temos livre-arbítrio total não significa desistir de mudar. Pelo contrário: permite que a sociedade estruture melhores maneiras de prevenção, educação e tratamento para comportamentos indesejados, com mais empatia e menos punição.
Se tudo já foi moldado, é possível mudar?
Sim, e esse é um dos pontos mais importantes da fala de Andressa Leal. Compreender que não escolhemos muitas das nossas bases emocionais não nos impede de transformar o presente. A consciência desses condicionamentos pode abrir espaço para novas respostas e escolhas mais saudáveis. Terapias como a Cognitivo-Comportamental, por exemplo, ajudam o paciente a identificar padrões automáticos e substituí-los por atitudes mais conscientes.

A neurociência também confirma que o cérebro é plástico, ou seja, tem capacidade de mudar suas conexões com o tempo. Isso significa que, embora condicionados, não estamos condenados a repetir os mesmos erros. Reconhecer o que nos influencia é o primeiro passo para redirecionar nossos comportamentos.
Traumas e histórico de vida interferem nas decisões?
Completamente. A psicologia já demonstra, há décadas, que traumas infantis moldam a forma como reagimos a situações no futuro. A exposição constante a violência, negligência ou falta de afeto pode comprometer o desenvolvimento emocional e impactar diretamente a autoestima, a regulação emocional e a capacidade de tomar decisões equilibradas.
Ao mesmo tempo, históricos mais afetivos, com suporte emocional e acesso a educação de qualidade, tendem a favorecer uma maior percepção de autonomia. Isso não significa que uma pessoa está fadada a um destino. Mas sim que entender seu passado é essencial para compreender suas escolhas no presente.
Então o livre-arbítrio é uma ilusião?
A psicóloga Andressa Leal propõe um olhar mais gentil: talvez o livre-arbítrio não seja uma mentira, mas uma liberdade parcial. Somos influenciados, empurrados por vivências e contextos, mas ainda podemos fazer escolhas dentro desse espaço de consciência. Compreender os limites dessa liberdade nos permite ter mais responsabilidade emocional e menos culpa excessiva.
Portanto, entender que nem tudo que fazemos é consciente não é um convite à permissividade, mas à compreensão. Somos complexos e moldados por muitos fatores, mas também somos seres em constante construção.
Fontes oficiais consultadas
- Sociedade Brasileira de Neurociência e Comportamento: www.sbnec.org.br
- American Psychological Association (APA): www.apa.org
- Stanford University – Robert Sapolsky: www.stanford.edu