Sagrada vitória para Minas
Justiça ordena devolução da imagem de Santa Mestra, do século 18, a Santa Luzia, na Grande BH
compartilhe
Siga no
São mais de 70 anos de ausência do altar e de espera pelos fiéis. Alguns desses, infelizmente, não viveram o bastante para ver o retorno, mas, para as novas gerações, fica a lição positiva de luta pelo patrimônio cultural e valorização dos bens da comunidade. Agora, vem a notícia ansiosamente aguardada. A Justiça manteve a decisão que determinou a devolução da imagem barroca de Santana Mestra à Paróquia de Santa Luzia. O pedido partiu do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A peça sacra de mais de 200 anos foi identificada num leilão, quando estava exposta à venda em conjunto com outras esculturas e oratórios. Após análise técnica, o MPMG concluiu haver fortes indícios de que a Santana Mestra era de uma capela do município de Santa Luzia. A partir daí, ajuizou ação civil pública requerendo a restituição do objeto de fé ao seu local de origem.
Na sentença, foi negado o pedido de devolução à paróquia, sob o argumento de que o templo original, no qual a imagem estava exposta, havia sido demolido. Após recurso, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), em julho de 2024, determinou que a imagem retornasse à paróquia de origem. Posteriormente, os réus ajuizaram embargos de declaração, porém no último dia 27 o TJMG recusou o recurso e confirmou a decisão que determinou a devolução da peça sacra a Santa Luzia.
Conforme a decisão, em caso de não mais existir o templo religioso de origem, a imagem deve ser levada para outro espaço físico religioso da mesma comunidade paroquiana: “Traduz-se, assim, o sentido de pertencimento que une obra e comunidade e que orienta a preservação da memória artística e cultural”, afirma o coordenador das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural, Marcelo Azevedo Maffra. “A decisão do TJMG representa uma grande vitória para a sociedade, pois garante a manutenção de um bem cultural na comunidade ao qual está vinculado, preservando suas funções devocionais, históricas e artísticas.” Ele ressalta que merece destaque o teor do acórdão proferido no julgamento da apelação que, entre outros aspectos, reconheceu a importância do retorno dos bens sacros a seu local de origem em razão da vinculação da imagem sacra à comunidade.
Vozes femininas
Na longa batalha para resgate da imagem, que se compõe da Santana Mestra (62cm de altura), encostada no espaldar de uma cadeira (90cm), e da Virgem Maria (53cm), de pé, muitas vozes se levantaram. Na década de 1980, um documentário produzido pela Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia forneceu material valioso ao processo. Na gravação, a moradora do Centro Histórico, dona Augusta Dolabella (já falecida), falava sobre a venda da imagem de Santana Mestra, que pertencia ao acervo do santuário.
Leia Mais
Foi também fundamental à investigação a participação das moradores de Santa Luzia, Dalma Martins e Maria Francisca Augusta, a dona Mariínha (ambas então com 83 anos), com depoimentos prestados, em 2007, ao promotor de Justiça, Marcos Paulo de Souza Miranda, e a diretores do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha-MG). As duas se lembravam, com detalhes, da imagem desaparecida e mantinham a esperança de que retornasse à cidade. Dona Mariínha, que várias vezes disse que não gostaria de morrer sem ter a imagem de volta, declarou ao Estado de Minas, que acompanha a história desde o início: “Nosso desejo é que ela volte o mais rápido possível. Vamos fazer muita festa para recebê-la”.
O retorno da imagem deverá ocorrer entre agosto e setembro. Na página ao lado, conheça outra mulher de destaque no patrimônio – personagem de uma história que envolve o mesmo leilão ocorrido no Rio de Janeiro em 2003.
Casa da Cultura de Barbacena sofre...
Um pedido de socorro vem de Barbacena. O Instituto Histórico e Geográfico da Borda do Campo e Cercanias expressa “profunda preocupação e indignação” com o incidente ocorrido no interior do Arquivo Público Municipal Altair Savassi, onde houve rompimento de uma tubulação e posterior infiltração de água sobre parte do acervo. Nota de repúdio divulgada pela direção do instituto pede que o poder público municipal priorize políticas permanentes de conservação do patrimônio cultural. Sem perder tempo, o advogado Alex Guedes dos Anjos, vice-presidente do Instituto, denunciou o caso (na verdade, “descaso”) ao Ministério Público de Minas Gerais. Ele destacou a relevância do acervo, que abriga antigos processos judiciais, coleções documentais diversas e a integral coleção do jornal “Cidade de Barbacena”, reconhecido como patrimônio cultural municipal. Recentemente, o imponente sobrado no qual fica na Casa de Cultura foi pichado, o mesmo ocorrendo com o imóvel também tombado da Secretaria Municipal de Saúde.
...com a falta de conservação
A Casa da Cultura ocupa o prédio, do século 19, a primeira cadeia pública de Barbacena. Sua construção foi aprovada pela Assembleia Legislativa Provincial, em 1834, e concluída em 1840. O imóvel tombado pelo Iepha-MG foi o local de prisão de revolucionários da Revolta Liberal de 1842, movimento que teve início simultaneamente em Barbacena, liderado por Teófilo Ottoni, e em Sorocaba (SP), tendo à frente o Padre Feijó. Adquirido pelo estado em 1891, o prédio da antiga cadeia foi doado à Faculdade de Odontologia de Barbacena, em 1957. Em 1975, funcionou ali o Museu Municipal. Depois, a edificação ficou abandonada, dando início ao processo de arruinamento. Com paredes internas caindo e telhado desmoronando, foi feito o decreto de doação em 1980, ano de reformas de recuperação para funcionamento da Casa de Cultura de Barbacena.
Parede da memória
Na semana passada, falamos aqui sobre os atos de vandalismo na estátua do escritor mineiro Bernardo Guimarães, autor do célebre romance “A escrava Isaura”. Pois, na sequência, a Prefeitura de Conselheiro Lafaiete divulgou nota de repúdio ao triste episódio. E informou que já está tomando todas as providências para identificar e responsabilizar os envolvidos. Na prática, o local será incluído no sistema de videomonitoramento da cidade, como parte do reforço na segurança pública. Muito bem. Mas, além das câmeras, é preciso implementar um programa de educação patrimonial, principalmente nas escolas, mostrando aos jovens a importância dos monumentos para a cultura local.
Símbolo de luta
Todas as homenagens à servidora pública federal aposentada Luzia Vieira, que completou 100 anos no último dia 27. Há duas décadas, a mineira de Santa Luzia teve papel decisivo no resgate de três anjos barrocos postos em leilão no Rio de Janeiro. Corajosa e determinada, revelou ao EM que as peças pertenciam ao Santuário Arquidiocesano Santa Luzia, do século 18. O acervo teria sido vendido a um colecionador na década de 1950. À frente da campanha para retorno dos objetos de fé, por via judicial, esteve a Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia. No dia do aniversário, a aposentada recebeu uma placa comemorativa das mãos do presidente da associação, Adalberto Andrade Mateus, e da oficial do Cartório do Registro Civil local, Luciana Antunes. Os anjos podem ser admirados no santuário localizado no Centro Histórico da cidade da Grande BH.
Siga nosso canal no WhatsApp e receba notícias relevantes para o seu dia
Festa em datas
Ainda ecoa em Datas o brilhantismo da 183ª edição da Festa do Divino Espírito Santo, bem cultural registrado como patrimônio imaterial do município. Foi mais de um mês de celebrações, dentro do tema “No fogo do Espírito acende-se a esperança e floresce a misericórdia”. A realização da festividade contou com investimentos do Fundo Municipal do Patrimônio Cultural, com anuência do Conselho do Patrimônio Cultural de Datas, que vem zelando pela execução do plano de salvaguarda das festividades.
Exposições
Abertas até o dia 20, no Arquivo Público Mineiro, em Belo Horizonte, as exposições Registro de Memória & História - Escola Normal de Montes Claros e Helena Antipoff - Por uma educação humanista, dentro da programação do evento cultural Modernos Eternos BH 2025. O APM fica na Avenida João Pinheiro, 372, no Bairro de Lourdes.