Nova espécie de árvore é descoberta na Mata Atlântica mineira
Descoberta pelos pesquisadores da UFV, a árvore pode atingir até seis metros de altura e, por enquanto, só foi encontrada em São José dos Cocais
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Siga noUma nova espécie de árvore, até então desconhecida pela ciência, foi descoberta em um fragmento da Mata Atlântica no município de Coronel Fabriciano, no Vale do Rio Doce (MG). O achado, realizado por pesquisadores do Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa (UFV), traz à tona o potencial ainda inexplorado da biodiversidade brasileira.
A nova espécie pertence à família Myrtaceae - a mesma das jabuticabas, pitangas e goiabas - e foi nomeada Myrcia magnipunctata. Ela se destaca por suas folhas longas, caules cobertos por pelos marrom-avermelhados e pequenas pontuações translúcidas nas folhas, característica que inspirou seu nome científico, que em latim significa "com grandes pontuações".
A árvore pode atingir até seis metros de altura e, por enquanto, só foi encontrada em São José dos Cocais. A descoberta foi liderada pelo pesquisador e doutorando Otávio Miranda, em colaboração com o Grupo de Estudo em Economia e Manejo Florestal (GEEA) da UFV, com apoio da empresa de celulose Cenibra, responsável pela conservação da área onde a espécie foi encontrada.
Descoberta por acaso e realização de um sonho
A descoberta não estava nos planos iniciais da pesquisa do estudante. O pós-graduando havia iniciado um novo projeto no ano anterior com foco na influência de fatores ambientais e humanos sobre espécies raras da Mata Atlântica. Foi durante uma reavaliação das espécies em uma parcela de monitoramento que ele se deparou com uma árvore florida de aparência incomum.
"Ela tinha folhas muito grandes, o que é raro na família Myrtaceae. Chamei a atenção do meu colega Luiz Cláudio e começamos a investigar. A princípio achamos que fosse uma espécie já conhecida, mas nenhuma descrição batia completamente", conta.
A confirmação de que se tratava de uma espécie nova veio do professor Marcos Sobral, da Universidade Federal de São João del-Rei, considerado um dos maiores especialistas em Myrtaceae da América Latina. Ele validou a descoberta após análises detalhadas do material coletado, incluindo amostras com flores e frutos, elementos essenciais para a descrição botânica.
"Foi literalmente por acaso. Sempre sonhei em descobrir uma espécie nova, mas achava que era algo improvável. Quando percebi que tinha acontecido, foi uma realização pessoal enorme, ainda mais por estar dentro do escopo da minha pesquisa sobre espécies raras", relata Otávio, que atua na área florestal desde o ensino médio.
Fragmento isolado, biodiversidade única
Segundo o professor Carlos Torres, orientador da pesquisa e também integrante da UFV, a área onde a árvore foi descoberta é monitorada desde 2002, como parte de uma parceria entre a universidade e a empresa Cenibra. "É um fragmento pequeno, mas muito especial. Das mais de 200 espécies registradas ali, cerca de 80 são exclusivas desse local. Isso mostra como ainda existem ilhas de biodiversidade mesmo em regiões bastante impactadas", afirma.
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A descoberta chama a atenção para o conceito de espécie microendêmica, isto é, aquela que ocorre em uma área geográfica extremamente restrita. "Hoje, descobrir uma nova espécie na Mata Atlântica é, por definição, descobrir uma espécie rara. Esse bioma é um dos mais estudados do Brasil, e as espécies mais comuns já foram todas descritas. O que resta, muitas vezes, são espécies que só existem em poucos hectares de floresta", explica.
Importância da preservação e ameaça das mudanças climáticas
A existência da Myrcia magnipunctata só foi revelada graças à conservação da floresta nativa pela Cenibra, empresa que atua com plantio de eucalipto, mas mantém reservas legais e áreas de preservação permanente. "Se essa área tivesse sido desmatada, queimado ou usada de forma indiscriminada, essa espécie provavelmente nunca teria sido encontrada", alerta Torres.
"Também é importante ressaltar a questão dos retrocessos ambientais que têm sido tentados no Brasil. Essas áreas preservadas pertencem à empresa e, se não fossem protegidas, provavelmente essa espécie jamais teria sido descoberta”, complementa Otávio. "Esse fragmento, especificamente, não tem histórico de queimada, mas a região do Vale do Aço, onde ele se localiza, frequentemente registra focos de incêndio. Por isso, a preservação da Mata Atlântica é fundamental para manter as espécies raras existentes e também permitir que outras ainda desconhecidas possam ser descobertas".
Ele também chama atenção para os efeitos das mudanças climáticas. "É possível que, em poucos anos, essa espécie nem exista mais, caso os impactos ambientais continuem se intensificando. É um risco real. As espécies mais frágeis são as que desaparecem primeiro", adverte.
Além do valor científico, a descoberta também levanta hipóteses sobre o potencial ainda desconhecido da flora brasileira. "Não sabemos se essa árvore tem propriedades medicinais ou outras aplicações. Estudar sua ecologia, anatomia e relações com o ambiente é o próximo passo", finaliza o orientador.
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Curiosidades sobre a nova espécie:
- Nome científico: Myrcia magnipunctata
- Família botânica: Myrtaceae (mesma da jabuticaba e pitanga)
- Altura: de 3 a 6 metros
- Habitat conhecido: Fragmento florestal São José, Coronel Fabriciano (MG)
- Características marcantes: Folhas grandes, caule coberto por pelos avermelhados, pontuações translúcidas visíveis nas folhas
- Status de ocorrência: Provavelmente microendêmica
*Estagiária sob supervisão do subeditor Humberto Santos