Morreu na manhã do último domingo (10/8), aos 68 anos, o musicólogo Carlos Palombini, uma das figuras mais importantes da musicologia contemporânea no Brasil. Palombini sofreu um infarto em seu apartamento em Belo Horizonte, cidade onde lecionou por décadas na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A morte foi confirmada à Folha de S. Paulo por sua irmã, Analice Palombini.
Respeitado como um dos primeiros estudiosos a tratar o funk carioca sob uma perspectiva estética dentro da academia, o musicólogo abriu caminhos para o reconhecimento do gênero como parte do repertório artístico e criativo nacional. Sua atuação, sobretudo a partir dos anos 2000, foi decisiva para legitimar o funk, especialmente o "proibidão", como objeto de pesquisa e como linguagem musical inovadora.
Pioneirismo e ruptura de paradigmas
Enquanto a maior parte das escolas de música e ciências sociais via o funk apenas como um fenômeno de ordem sociológica ou marginal, o ex-professor da UFMG ousou enxergar valor artístico e sofisticação técnica em suas batidas e letras. "O proibidão, musicalmente, é a coisa mais subvalorizada dos gêneros brasileiros", declarou em entrevista à Billboard Brasil em maio de 2025. "Se tornou algo extremamente experimental".
Foi ele quem criou o site Proibidão, uma plataforma dedicada a documentar a história do gênero, suas transformações sonoras e suas implicações culturais. Seu esforço mais conhecido no campo da publicação foi o capítulo "Funk Proibido", no livro Dimensões Políticas da Justiça (Civilização Brasileira, 2013), e o artigo "Como tornar-se difícil de matar: Volt Mix, Tamborzão, Beatbox", no qual traça uma cronologia técnica das batidas que marcaram a evolução do funk.
Enquanto a maior parte das escolas de música e ciências sociais via o funk apenas como um fenômeno de ordem sociológica ou marginal, o ex-professor da UFMG ousou enxergar valor artístico e sofisticação técnica em suas batidas e letras
Ele também foi um dos primeiros musicólogos brasileiros a abordar sistematicamente a relação entre música e questões de gênero. Essa abordagem crítica contribuiu para renovar o campo da musicologia no país, aproximando-o de temas urgentes e contemporâneos, como as representações de masculinidade, violência e sexualidade presentes nas produções do funk das favelas.
Em entrevista ao site Volume Morto, chegou a afirmar que o funk foi o "primeiro gênero brasileiro de música dançante", destacando sua originalidade e sua autonomia frente aos modelos tradicionais do MPB.
Trajetória internacional e estudos sobre música concreta
Antes de sua imersão no funk, Carlos Palombini já era nome consolidado internacionalmente por seus estudos sobre a musique concrète do francês Pierre Schaeffer, gênero criado a partir da manipulação de sons gravados, sem o uso de instrumentos musicais convencionais.
Foi com essa pesquisa que obteve seu Ph.D. pela Universidade de Durham, no Reino Unido, em 1993. O estudioso também viveu entre 2008 e 2009 no Institut Mémoires de l'Édition Contemporaine, na França, com bolsa da Capes, onde reconstituiu o inacabado "Ensaio sobre o rádio e o cinema: estética e técnica das artes-relé (1941–1942)", de Schaeffer. O trabalho foi publicado em 2010 numa edição crítica simultaneamente em Paris e em Belo Horizonte.
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Carlos Palombini foi professor da Escola de Música da UFMG por mais de duas décadas, onde formou gerações de pesquisadores e artistas
Formação e legado acadêmico
Graduado em direção teatral pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) em 1981, Palombini se especializou em tecnologia da informação musical na City University de Londres, em 1991, e concluiu seu doutorado dois anos depois.
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O musicólogo também foi professor da Escola de Música da UFMG por mais de duas décadas, onde formou gerações de pesquisadores e artistas.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Celina Aquino