A empreendedora mineira Margaret Siqueira ficou órfã aos sete anos, começou a trabalhar aos 14, viveu em orfanato até os 15 e, mesmo enfrentando uma sucessão de dificuldades, transformou sua dor em força. Hoje, aos 57 anos, é referência nacional em terapia capilar, com dois CNPJs ativos, uma carreira acadêmica consolidada e um instituto voltado para a formação de mulheres empreendedoras na área da beleza. Mas sua trajetória começou por um motivo muito realista: necessidade.
"Empreendi porque precisava. Tinha duas filhas pequenas, a renda era curta e eu queria estar presente. Então fui buscar alternativas", relembra Margaret, que é de Belo Horizonte. No início, tentou vender bolos, fez decoração para festas infantis e até ajudou o marido como secretária. Mas o retorno financeiro era escasso - e a valorização, ainda menor.
Foi quando o setor da beleza bateu à sua porta: primeiro, com vendas de equipamentos para salões e, depois, com cosméticos profissionais. Mas ainda que tivesse formação como cabeleireira pelo SENAC, nunca havia atuado na prática. "Comecei fazendo escova em amigas. Não sabia alisar, nem pintar. Mas fui aprendendo."
A verdadeira virada de chave veio com uma frase. "Uma profissional chamada Socorro olhou para o meu cabelo, que eu sempre tentei alisar, e disse: 'Não tem nada de errado com ele. Só precisa de cuidados adequados'". Aquela fala, aparentemente simples, reverberou fundo. Margaret, que já pensava em alisar o cabelo da própria filha, sentiu que era hora de mudar, não só o visual, mas a visão de mundo.
Margaret Siqueira (à esquerda) no começo na carreira de empreendedora de beleza
Crescimento com propósito
A partir desse momento, a mineira passou a enxergar o cabelo como um símbolo de identidade, autoestima e resistência. Ingressou em grupos do Orkut voltados à valorização do cabelo crespo e cacheado, como o "Em Crespa" e o "Caxeia", e começou a organizar encontros entre mulheres para discutir transição capilar, racismo e padrões de beleza impostos.
"Vi que não era só sobre cabelo. Era sobre como nos enxergamos e como fomos ensinadas a odiar nossos traços naturais. Era também sobre criar um espaço seguro para outras mulheres se reencontrarem com elas mesmas".
Em 2015, iniciou sua formação em terapia capilar, área ainda incipiente no Brasil, mas essencial para compreender os impactos da estética na saúde. Com isso, fundou o Instituto Capilare, no Bairro Santa Efigênia, Região Leste da capital, um espaço que une beleza, educação e inclusão. Lá, Margaret forma cerca de 60 mulheres por semestre, promovendo uma abordagem respeitosa e científica dos cuidados capilares, especialmente dos fios afros e ondulados.
Hoje, além de terapeuta capilar, é especialista em transição de texturas, coordena uma cadeira universitária na área e está na terceira pós-graduação, entre elas em tricologia e ciência cosmética. "Sou a primeira da minha família a entrar numa universidade. Isso aconteceu aos 44 anos. Hoje, ensino outras mulheres a acreditarem nelas mesmas", celebra.
Empreender é resistir e recomeçar
Margaret não esconde: empreender sendo mulher é solitário. "Tem dias em que você entrega o seu melhor, mas não é suficiente. O cliente não valoriza, a família não apoia e você se vê sozinha. É por isso que o apoio, as redes e o autoconhecimento são tão importantes".
Ela mesma já enfrentou o desânimo. "Vendia bolo, mas os parentes só queriam de presente. Vendia produtos, mas ninguém confiava na marca. Precisei voltar a estudar, aprender tudo de novo, construir minha autoridade do zero".
Leia Mais
Foi com essa resiliência que ergueu o Instituto Capilare. "Hoje, tenho duas empresas. Pago salários, cuido da equipe e sou pilar da minha família. Mas sei que só cheguei aqui porque nunca perdi o propósito de vista".
Para ela, empreender é mais que abrir um negócio: é uma missão. "A venda começa no olhar. Às vezes, uma cliente quer uma escova progressiva, mas o que ela realmente precisa é ser ouvida. Meu trabalho é cuidar do que está além dos fios".
Convite ao recomeço
A especialista faz questão de compartilhar seus aprendizados. "Quando uma mulher escolhe empreender, tudo depende da conexão com o que ela ama. Haverá estresse, dúvidas, cansaço. Mas se o desejo continua vivo, ele te move".
E conclui com um convite: "O Instituto Capilare está de portas abertas. Quero que mais mulheres vejam na beleza um caminho de cura, de força e de transformação. Porque, quando uma mulher se reconhece, tudo muda".
Instituto Capilare
Especializado em terapia capilar, formação de profissionais e transição de texturas.
Mais informações no site
*Estagiária sob supervisão da subeditora Celina Aquino