A viúva do gari Laudemir de Souza Fernandes, morto em 11 de agosto no Bairro Vista Alegre, na Região Oeste de Belo Horizonte, entrou com um processo cível contra Renê da Silva Nogueira Júnior, indiciado pelo crime. A ação, que pede indenização por danos morais, inclui a esposa do empresário, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, também indiciada pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG). 

O pedido foi protocolado na 3ª Vara Cível da Comarca de Contagem nesta terça-feira (2/9). No entanto, até o momento, a Justiça não se manifestou em relação ao processo. À reportagem, os advogados de Liliane França da Silva, esposa de Laudemir, afirmaram que não vão se posicionar sobre a ação. 

Desde a morte do marido, Liliane tem se manifestado publicamente sobre o crime. Com pedidos de Justiça não só por Laudemir, mas também por todos os coletores de resíduos da capital. Durante audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), em 20 de agosto, a mulher afirmou ter medo que a morte do marido caia no esquecimento e que Renê não pague pelo crime. 

“Tenho medo que isso caia no esquecimento e que ele saia pela porta da frente. Por mais que ele tenha confessado e que tudo que ele fala está sendo provado que não (é verdade), mas, infelizmente, na nossa lei existem algumas brechas e eu tenho medo que ele encaixe em uma dessas”, declarou.

Casal indiciado

Em 29 de agosto, 18 dias após a morte de Laudemir, Renê da Silva Nogueira Júnior foi indiciado por homicídio qualificado - por motivo fútil e meio que dificultou a defesa da vítima, ameaça contra a motorista do caminhão de coleta de resíduos e porte ilegal de arma de fogo. A esposa dele, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira, também foi responsabilizada e poderá responder judicialmente por porte ilegal de arma de fogo, por ter emprestado sua arma de uso pessoal para o marido. 

Os detalhes sobre o crime foram repassados pela Polícia Civil de Minas Gerais (PCMG) durante coletiva de imprensa. No dia seguinte aos fatos, em 12 de agosto, a corporação já havia afirmado que o depoimento das testemunhas, colegas de Laudemir, já indicavam que o empresário seria responsável pelo disparo.

Ao longo das investigações, ficou constatado que a arma usada no homicídio pertencia à mulher do homem. Na época, a balística comprovou que as duas munições encontradas na Rua Modestina de Souza, no Bairro Vista Alegre, eram compatíveis com a pistola calibre .380 da delegada. 

As dúvidas sobre a participação do investigado foram sanadas depois que a PCMG obteve imagens de câmeras de segurança que mostram o homem guardando a arma. As gravações reveladoras foram registradas pelo sistema interno do estacionamento do prédio em que Renê da Silva Nogueira mora, no Bairro Vila da Serra, em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. 

De acordo com o delegado Evandro Radaelli, o indiciamento de Renê foi baseado nas informações repassadas em oitiva de testemunhas, no próprio interrogatório do investigado, análises das imagens colhidas no local dos fatos, na empresa em que o homem trabalhava e em sua casa. Além disso, a quebra do sigilo telefônico e telemático do aparelho celular e do carro que o empresário dirigia no dia também forneceram dados para a conclusão do inquérito.

Além da comprovação do envolvimento do empresário na morte de Laudemir, as investigações indicaram que Renê tem "fascínio" por armas de fogo e o "poder" que o armamento o concedia. De acordo com o Radaelli, durante análises feitas no aparelho celular do investigado foram encontradas imagens em que ele exibe diversas armas.

Em alguns vídeos, o homem aparece fazendo disparos. Ainda segundo o chefe da investigação, o artefato não é o mesmo usado no crime registrado no Bairro Vista Alegre. Além disso, o homem também demonstrava “interesse” pelo cargo ocupado pela esposa. Em uma das fotos, ele chegou a exibir o distintivo da mulher.

“Acreditamos que na situação em que ele disparou contra o Laudemir ele estava sim demonstrando um poder, porque ele julgou que a pressa que ele tinha era mais importante que o trabalho que os garis realizavam na coleta de resíduo”, afirmou.

Qual o envolvimento da delegada no crime?

Assim como o marido, a delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira foi indiciada. Ela poderá responder judicialmente por porte ilegal de arma de fogo, conforme previsto na Lei de Desarmamento, por ter cedido ou emprestado sua pistola de uso pessoal para o companheiro. As investigações mostraram ainda que a servidora estadual permitia e tinha ciência que Renê usava sua pistola de uso pessoal.

Segundo o delegado Matheus Moraes, após a quebra do sigilo telefônico do acusado, foi possível analisar a conversa do casal. Ele explica que, em algumas mensagens, em datas anteriores ao crime, ficou claro que Ana Paula consentia o uso da arma pelo companheiro. Caso seja condenada, a delegada poderá pegar de 2 a 4 anos de prisão. Além disso, caso haja o entendimento pela Justiça, a pena pode ser ampliada em 50% por ela ser servidora pública. 

“Nós apuramos que ela [Ana Paula] tinha ciência que ele andava armado de forma habitual e que consentia com tal comportamento. Nós analisamos preteritamente todas as conversas que eles tiveram”, informou Moraes. 

Durante o depoimento prestado logo após sua prisão em flagrante, Renê afirmou que ligou para a esposa na manhã do dia 11 de agosto, por volta das 8h40, informando que o trânsito estava ruim. Segundo ele, a próxima ligação teria ocorrido às 14h, quando avisou que tinha saído para passear com os cachorros. Por fim, Renê disse ter entrado em contato novamente com a esposa assim que foi abordado pelos policiais militares.

Ao longo das investigações, a PCMG não conseguiu confirmar se a delegada sabia, ou não, que o marido matou uma pessoa a caminho do trabalho. Ainda segundo Matheus Moraes, no dia do crime diversas mensagens trocadas entre os dois foram excluídas e eles teriam passado a se comunicar por ligação via aplicativo de mensagem. O delegado explica que o conteúdo das chamadas não é possível ser acessado, mesmo com a quebra do sigilo telemático. 

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O que acontece agora?

  • O resultado das investigações e indiciamento do suspeito serão enviados ao Ministério Público de Minas Gerais;
  • Após o recebimento dos documento, o MPMG tem até dez dias para denunciar, ou não, o indiciado à Justiça;
  • Além dos crimes relatados na conclusão do inquérito o MPMG pode acusar o homem por outros delitos;
  • A delegada Ana Paula Lamego Balbino Nogueira vai continuar afastada por motivos de saúde;
  • A Corregedoria da PCMG continua as investigações administrativas contra a servidora.
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