Diamante gigante: empresário nega crimes e alega ser avaliador da gema
Advogados de Wado Borges afirmam que ele representava empresa compradora da gema e que vai adotar medidas contra ANM. Pedra foi apreendida por suspeita de furto
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Siga noO empresário Oswaldo Borges da Costa Netto, de 53 anos, conhecido como Wado Borges, negou por meio de advogados ter participado de crimes ou irregularidades investigadas pela Polícia Federal (PF) e a Agência Nacional de Mineração (ANM) no caso da apreensão do segundo maior diamante do Brasil. Declarou, ainda, que vai adotar medidas contra a ANM.
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O advogado Bernardo Arges, da Arges & Arges Advogados Associados, afirmou por meio de nota (confira o texto na íntegra ao fim da reportagem) que seu representado, Wado Borges, não era o comprador, mas um avaliador da empresa compradora da pedra preciosa.
A pedra de 647 quilates foi apreendida no dia 27 de agosto, quando receberia o lacre final do Certificado do Processo Kimberley (CPK), exigido para exportações, como divulgou com exclusividade a reportagem do Estado de Minas.
Uma vez com o lacre do CPK, o diamante poderia ter saído do país com qualquer pessoa.
“O Sr. Oswaldo Borges jamais esteve com representantes da empresa belga, compradora do diamante, em Belo Horizonte. Em razão de sua expertise - atestada por certificação HRD expedida pelo Antwerp Diamond High Council - o empresário representou a referida empresa apenas no ato de avaliação técnica, documentação e exportação da gema, procedimento que foi regularmente realizado até a data de sua apreensão”, afirma a nota dos representantes de Borges.
Depois da apreensão, o diamante foi retido por agentes da ANM de Brasília e policiais federais por suspeitas de furto e desvio da gema gigante. Crimes e irregularidades são apurados em processo administrativo sigiloso da agência e investigação da PF, como mostrou com exclusividade a reportagem do EM.
A empresa Diadel Mineração Ltda foi quem revelou a existência do segundo maior diamante do Brasil, ao afirmar que a extração se deu em seu garimpo no Rio Douradinho, em Coromandel (MG), no Alto Paranaíba. A pedra foi registrada no Relatório de Transações Comerciais (RTC) do Cadastro Nacional de Comércio de Diamantes (CNCD), em 29 de maio de 2025.
Contudo, a Polícia Federal (PF) investiga se a verdadeira origem da pedra preciosa foi uma extração legal no Rio Araguari, em Araguari (MG), no Triângulo Mineiro, pertencente à Carbono Mineração. A suspeita é de que o diamante possa ter sido furtado e desviado.
“A apreensão decorreu de denúncia apócrifa, destituída de qualquer embasamento fático, fundada em supostas conversas de aplicativos de mensagens eletrônicas, sem identificação dos interlocutores ou qualquer meio de autenticação que permita atestar sua veracidade”, salientou a defesa do empresário.
Os advogados de Wado são os mesmos contratados pela Diadel Mineração Ltda – empresa que afirma ter extraído a pedra de Coromandel - e ingressaram na Justiça Federal para obter informações sobre o processo administrativo na ANM, o que foi concedido. No entanto, o advogado Bernardo Arges informou que defende a "Diadel somente no âmbito administrativo”.
A Arges & Arges Advogados Associados afirmou que vai ingressar uma série de medidas judiciais, inclusive contra a ANM. “A empresa compradora informa que adotará as medidas judiciais cabíveis, adiantando que oficiará o Ministério das Relações Exteriores para ciência dos fatos, considerando que a atuação da ANM, em desconformidade com os procedimentos aplicáveis, pode repercutir negativamente na imagem do Brasil perante o setor minerário internacional, notadamente no âmbito do Processo Kimberley, atualmente sob a presidência dos Emirados Árabes Unidos”, afirma.
“Serão adotadas medidas junto à Corregedoria da ANM por violação aos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, diante da contraditória conduta de ter sido atestado e emitido o Certificado Kimberley para, logo em seguida, sem justificativa idônea, proceder à apreensão da gema, em flagrante contrariedade aos próprios atos administrativos anteriormente praticados”, finaliza a Arges & Arges, que defende Borges.
De onde surgiu o nome do empresário?
Reconhecido comerciante de diamantes em Minas Gerais, Wado Borges foi apontado como comprador do diamante e apareceu em diversas imagens de redes sociais com a pedra em mãos, antes da apreensão, em seu avião, em momentos de pesagem da pedra e assinando documentações com o diamante à sua frente. Há informações de que ele próprio teria levado a pedra para a ANM, de táxi, no dia da apreensão, em Belo Horizonte.
A residência do empresário em um condomínio de luxo que vive com a família em Nova Lima (MG), na Grande BH, foi alvo de um mandado de busca e apreensão da PF no último dia 24, às 6h. Ele não estava em casa no momento.
Um dia depois, na quinta-feira (25/9), a PF cumpriu mais dois mandados de busca e apreensão nos municípios mineiros de Coromandel e Nova Ponte, no Alto Paranaíba. A reportagem apurou que o alvo em Coromandel seria um homem conhecido no mercado de pedras preciosas e que é suspeito de ter agido como intermediário no suposto desvio do diamante.
Em Nova Ponte, o endereço vasculhado pelos policiais federais também é residencial. Segundo apurado pelo EM, o município é o mesmo de origem de garimpeiros que trabalham na mineração de diamantes do Rio Araguari.
A aparição repentina de Wado com o diamante, sem que houvesse um leilão ou que outros compradores brasileiros fossem consultados, gerou suspeitas no mercado. Negociadores brasileiros afirmaram que não foram procurados para a compra, o que é incomum para uma gema de tamanha importância.
Normalmente, uma descoberta desse porte resultaria em um leilão para inflacionar o valor do diamante e assegurar a melhor proposta. A estimativa de preço de venda entre R$ 16 milhões e R$ 18 milhões também chamou a atenção, pois é considerado um valor muito inferior ao que a pedra poderia alcançar no mercado.
Especialistas calculam que a gema poderia valer facilmente R$ 50 milhões. Essa grande diferença de preço, somada à falta de publicidade na negociação, sugere uma tentativa de fechar o negócio rapidamente, possivelmente antes que pudessem surgir questionamentos sobre a origem da pedra.
O fato de a divulgação ter sido discreta e amadora para uma descoberta de tal magnitude também causou estranheza, pois não atrairia investidores para a operação de mineração de onde o diamante foi extraído.
A principal suspeita investigada é se a pedra foi, de fato, furtada e transferida de Araguari para Coromandel para “esquentar” sua documentação na Diadel Mineração, conferindo-lhe uma aparente legalidade por meio de um garimpo lícito. Não se sabe se Wado é apenas um comprador que desconhece essas suspeitas ou se teria agido previamente e utilizado a Diadel para o suposto esquema.
Fundada em 2004, a Diadel Mineração tem como sócio-administrador, desde 2024, o empresário Carlos César Manhas, de 63 anos. Manhas é uma figura bem conhecida no setor de diamantes em Coromandel e estaria ligado a grupos de israelenses que atuam no mercado internacional de pedras preciosas.
Em 2002, Manhas foi detido pela PF em Rondônia, junto com um grupo de brasileiros e israelenses, por posse de 44 diamantes e uma ametista. As pedras seriam oriundas da Reserva Indígena Roosevelt, pertencente aos Cinta-Larga, uma área onde a mineração é proibida.
Manhas foi condenado por receptação de bem pertencente à União, com a acusação de facilitar o comércio ilegal de diamantes para compradores estrangeiros, especialmente israelenses, com quem ele manteria conexões até os dias de hoje.
A investigação da PF e da ANM também se dedica a rastrear todas as pessoas que tiveram contato com o diamante. Isso inclui desde os garimpeiros que supostamente encontraram a gema até possíveis compradores e intermediários, visando identificar seus vínculos de trabalho, valores recebidos e comprovar sua localização nos dias da suposta extração.
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Por meio de uma nota de seu sócio-administrador, a Diadel Mineração Ltda repudiou as suspeitas e reafirmou sua propriedade e a legalidade do processo. A empresa destacou ser regularmente constituída, com "histórico consolidado de descobertas de diamantes de grande porte" e possuir licenciamentos e direitos vigentes.
A empresa revelou que, "no dia da descoberta, representantes da (ANM), acompanhados de profissionais especializados, estiveram presentes no local, inclusive na frente de lavra, para atestar oficialmente o achado. Este fato comprova, de forma inequívoca, que o diamante foi extraído na área da Diadel e é legítima propriedade da empresa".
A reportagem procurou a ANM para saber sobre a presença de agentes, mas a agência reguladora do setor não confirmou. "Os processos de Certificação Kimberley são de natureza sigilosa, sendo vedado qualquer fornecimento de dados sobre seu andamento. A Agência possui competência para adotar medidas acautelatórias administrativas quando necessário, conforme previsto na legislação".
"Qualquer ação da ANM é pautada pela legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, princípios da Administração Pública", informou a agência por meio de nota.
Segundo a Diadel Mineração, nunca houve qualquer relação com a empresa responsável pela denúncia que resultou na apreensão do diamante, a Carbono Mineração, que ainda não se pronunciou sobre o caso.
Entenda o caso do diamante
- A pedra: 2º maior diamante bruto do Brasil, com 647 quilates, foi apreendido pela Polícia Federal (PF) e pela Agência Nacional de Mineração (ANM) em Belo Horizonte
- Suspeitas: a investigação apura se a pedra foi furtada de um garimpo legal no Rio Araguari e teve sua origem "esquentada" (legalizada fraudulentamente) em outro garimpo, em Coromandel
- Empresário: Wado Borges, filmado com a pedra e apontado como comprador, alega por meio de advogados que atuava apenas como avaliador técnico para a empresa compradora
- Origem declarada: empresa Diadel Mineração afirma ter extraído legalmente o diamante em Coromandel e que a ANM atestou o achado no local
- Medidas legais: defesa do empresário e da empresa compradora internacional promete acionar a Justiça, a Corregedoria da ANM e o Ministério das Relações Exteriores contra a apreensão
- Valores suspeitos: a gema, negociada por cerca de R$ 18 milhões, poderia valer até R$ 50 milhões, o que, somado à falta de um leilão, levantou suspeitas sobre a rapidez e a discrição do negócio
Nota da Arges&Arges Advogados Associados
Os advogados do empresário Oswaldo Borges da Costa Netto esclarecem que a investigação divulgada pela mídia se baseia em meras suposições, sem qualquer indício concreto que aponte para quaisquer irregularidades.
Ressaltam que, ao contrário do veiculado na reportagem, o Sr. Oswaldo Borges jamais esteve com representantes da empresa belga, compradora do diamante, em Belo Horizonte. Na realidade, em razão de sua expertise na área de pedras preciosas, atestada por certificação HRD expedida pelo Antwerp Diamond High Council, o empresário representou a referida empresa apenas no ato de avaliação técnica, documentação e exportação da gema, procedimento que foi regularmente realizado até a data de sua apreensão.
Informam, ainda, que a apreensão decorreu de denúncia apócrifa, destituída de qualquer embasamento fático, fundada em supostas conversas de aplicativos de mensagens eletrônicas, sem identificação dos interlocutores ou qualquer meio de autenticação que permita atestar sua veracidade.
Ao final, a empresa compradora informa que adotará as medidas judiciais cabíveis, adiantando que oficiará o Ministério das Relações Exteriores para ciência dos fatos, considerando que a atuação da ANM, em desconformidade com os procedimentos aplicáveis, pode repercutir negativamente na imagem do Brasil perante o setor minerário internacional, notadamente no âmbito do Processo Kimberley, atualmente sob a presidência dos Emirados Árabes Unidos.
Comunicam, por fim, que serão adotadas medidas junto à Corregedoria da ANM, por violação aos princípios da legalidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, diante da contraditória conduta de ter sido atestado e emitido o Certificado Kimberley para, logo em seguida, sem justificativa idônea, proceder à apreensão da gema, em flagrante contrariedade aos próprios atos administrativos anteriormente praticados.
Atenciosamente,
Arges & Arges Advogados Associados