Moradores de Belo Horizonte e cidades da região metropolitana têm percebido o aumento nos casos de virose nos últimos dias. De acordo com a Secretaria de Saúde de BH, entre 1° e 29 de setembro, 5.961 pessoas com sintomas típicos da infecção, como vômito e diarreia, buscaram cuidados em alguma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), quantidade que representa 7,8% dos atendimentos totais – 76.269 – realizados no período. Já o Hospital Vera Cruz, localizado no Bairro Barro Preto, na Região na primeira quinzena de setembro, comparado ao período do ano anterior.


Apesar de sutil, o crescimento é sentido pelos moradores da Grande BH, que precisaram de internação e sentiram uma alta de pacientes buscando o mesmo tipo de atenção. A cirurgiã-dentista Izabela Vanucci, que contraiu gastroenterite – a conhecida virose – no início do mês passado e precisou ficar internada por ser transplantada, contou que observou uma sobrecarga na unidade hospitalar particular que frequenta. Embora o hospital tenha negado o aumento, Izabela precisou ter alta antes do período ideal para liberar o quarto.


BAIXA IMUNIDADE

“Em um domingo, eu acordei me sentindo mal. Na madrugada de segunda, eu passei muito, muito mal. Fui correndo para o hospital com diarreia e vômito fortes. Chegando lá, estava até tranquilo no início. Quando começou a amanhecer, na segunda mesmo, começou a aumentar muito [o número de pessoas buscando atendimento]. Na própria salinha que eu estava, não tinha espaço, não tinha box, não tinha quarto. Estava tudo muito cheio. Não sei se é por causa da gastroenterite, mas de segunda para terça, chegaram vários casos de pessoas com diarreia e vômito”, relatou.


A dentista afirmou que o marido também teve os sintomas, mas não foram tão graves como os dela, o que pode ter sido causado pela baixa imunidade, em decorrência do transplante renal realizado. Os profissionais médicos priorizaram o caso de Izabela, porém depois de dois dias ela recebeu alta para continuar o tratamento em casa, envolvendo medicação e hidratação.


O Hospital Vera Cruz também informou que, devido a esse aumento, alguns casos também demandaram internação, indicando uma maior gravidade em certas situações. De acordo com a diretora médica, a doutora Reni Moreira, o hospital reforçou a equipe médica da emergência pediátrica para “otimizar o acolhimento e o cuidado dedicados aos pacientes mais jovens”.


BUSCA NO GOOGLE

Em outras cidades da Grande BH e do interior, o cenário é semelhante. A palavra gastroenterite disparou nas pesquisas feitas pela internet em Minas Gerais, em setembro, segundo o Google Trends. No ranking nacional de buscas pela doença, o estado ocupou o terceiro lugar, aparecendo com destaque municípios da região metropolitana como Lagoa Santa, Mateus Leme, Esmeraldas, Vespasiano, Ibirité, Contagem, Santa Luzia e Betim.


Segundo a aposentada Laíze Milan de Souza, moradora de Lagoa Santa, ela e os parentes tiveram virose. Ao todo, oito pessoas da mesma família, que são vizinhas, apresentam sintomas como vômito e diarreia. Conforme relatado, a doença começou com um integrante, no último dia 24/9, e foi sendo repassada entre os familiares.


“A gente estava bem, de repente vai ao banheiro várias vezes e continua. Alguns da família tiveram sintomas de vômitos também. Eu tive enjoo. É virose mesmo, porque um foi tendo e foi passando para o outro”, disse.


A reportagem do Estado de Minas procurou a Prefeitura de Lagoa Santa para saber se houve aumento de casos na cidade, mas não obteve retorno.


ÁGUA EM CONTAGEM

Já em Contagem, o aumento de registros de virose foi marcado por 3.693 casos de diarreia aguda e gastroenterite registrados entre 1° de agosto e 11 de setembro, uma média de 87 por dia no período. A Secretaria de Saúde não obteve os resultados das análises enviadas aos laboratórios para descobrir a motivação da doença em tantas pessoas. De acordo com o Executivo municipal, o aumento dos atendimentos foi acompanhado pelas equipes técnicas.


A Vigilância Sanitária encaminhou uma solicitação oficial à Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) para a disponibilização do plano de amostragem da qualidade da água na cidade. No dia 10 de setembro, a companhia enviou ao Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) mais de 300 páginas de documentos com resultados de análises laboratoriais e testes realizados em residências da região metropolitana e em todo o sistema de captação e abastecimento da companhia, que atestam a segurança e a potabilidade da água distribuída aos consumidores da Grande BH.


“As análises vêm sendo realizadas desde o início dos relatos pontuais sobre sabor e odor na água e fazem parte do escopo de testagem permanente da empresa, que contempla mais de 130 parâmetros de potabilidade. Adicionalmente, foi contratado um laboratório independente para realizar testes além do que prevê a portaria do Ministério da Saúde, os quais também confirmaram a segurança do produto”, informou a empresa em nota, que reafirmou que a água distribuída não oferece risco à saúde da população.


SUBNOTIFICAÇÃO

Embora os números sejam baixos na rede pública de saúde, a demanda aumentada também foi sentida por funcionários da UPA Centro-Sul, no Bairro Santa Efigênia, que relataram ter sentido um acréscimo na procura. Já na UPA Leste, no Bairro Vera Cruz, os profissionais também confirmaram um aumento, inclusive de funcionários que trabalham no atendimento, que precisaram de atestado médico na última semana.
O impasse no quantitativo dos atendimentos pode ser explicado pela subnotificação, uma vez que algumas pessoas optam por não procurar atendimento médico, se automedicam e aguardam os sintomas passarem naturalmente.


De acordo com a biomédica e mestre em microbiologia Lislaina Corrêa, nem sempre é necessário procurar o atendimento médico ao identificar os sintomas de gastroenterite. Em adultos saudáveis, a infecção geralmente é autolimitada e se resolve de forma espontânea em poucos dias, sendo suficientes medidas simples como hidratação adequada e repouso. No entanto, a avaliação médica é importante em situações como desidratação extrema, mais comum em crianças e idosos, episódios persistentes de vômito ou diarreia intensa, febre alta ou presença de sangue e muco nas fezes.


“Deve ser dada uma atenção especial aos grupos de risco, que são crianças pequenas, idosos, indivíduos com o sistema imunológico comprometido, pois nesses casos a evolução pode ser mais grave e a necessidade de acompanhamento hospitalar é maior, para prevenir complicações e garantir tratamento apropriado. Locais em que o saneamento básico é precário, facilitando a contaminação da água e alimentos também são fatores de risco”, explicou a biomédica.


Ela acrescentou que a gastroenterite pode ser considerada uma doença sazonal e pode ser viral ou bacteriana. De acordo com Lislaina, a viral costuma ser mais comum durante o inverno, pois as pessoas ficam em ambientes fechados, o que facilita a transmissão. Já a infecção bacteriana tende a aumentar no verão, devido às temperaturas elevadas que favorecem a proliferação de bactérias.


TRANSMISSÃO

A gastroenterite é uma inflamação do estômago e intestino, geralmente causada por bactéria, vírus ou parasitas. Segundo a médica infectologista Priscila Valéria do Carmo Carvalho Reis, a infecção ocorre principalmente por meio da ingestão de água e/ou alimentos contaminados, ou pelo contato direto com pessoas infectadas. O calor persistente em BH no início de setembro também pode ter contribuído para a proliferação.


“O aumento da temperatura ambiental favorece a proliferação de microrganismos, o que pode contribuir para o surgimento de surtos de gastroenterite, especialmente nos meses mais quentes do ano”, destacou a médica.


Por ser de transmissão fecal-oral, a infecção geralmente se inicia através da ingestão de água e alimentos contaminados. Algumas medidas básicas de higiene são eficazes para reduzir o risco de infecção, como lavar bem as mãos com água e sabão, consumir água tratada ou filtrada, lavar bem frutas, verduras e legumes, cozinhar bem os alimentos e evitar consumo de alimentos crus em locais de higiene duvidosa.
A vacina contra o rotavírus, um dos causadores da doença, está disponível no Sistema Único de Saúde (SUS) para crianças menores de seis meses. De acordo com o Ministério da Saúde, o esquema de vacinação é de duas doses exclusivamente por via oral, sendo a primeira aos dois meses e a segunda aos quatro meses de idade com intervalo mínimo de 30 dias entre as doses.


Quando procurar atendimento médico
. Persistência dos sintomas
. Febre alta
. Sinais de desidratação (como boca seca, pouca urina, sonolência ou fraqueza)
. Rebaixamento do nível de consciência
O tratamento baseia-se principalmente na hidratação adequada e na manutenção de uma alimentação leve e balanceada

Como prevenir?
. Evitar o consumo de alimentos de procedência duvidosa ou com higienização inadequada
. Consumir apenas água filtrada ou fervida
. Lavar bem as mãos antes das refeições e após usar o banheiro
. Lavar frutas, verduras e legumes com água tratada e solução de hipoclorito de sódio
. Manter alimentos bem conservados e refrigerados

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