Cadê o táxi que eu chamei? Em 2025, BH perdeu mais de um veículo por dia
Em 9 meses, frota ativa perdeu 352 táxis, em tendência que só mudou uma vez em 5 anos. Porém, categoria vê retomada na procura e pede mais permissões
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Em meio à histórica disputa com aplicativos de transporte, a frota de táxis de Belo Horizonte registrou queda de 352 veículos ativos neste ano, segundo dados da prefeitura. O número é equivalente à perda de mais de um táxi por dia. Por outro lado, apesar do número, motoristas e representantes do setor descrevem um cenário de retomada e aumento da procura pelo serviço.
A divergência marca o momento atual: enquanto os dados mostram redução na frota, profissionais relatam que passageiros voltam a escolher a modalidade diante de insatisfação com os serviços oferecidos por parceiros de plataformas digitais de transporte.
O motorista de aplicativo Marco Antônio de Resende trabalhou como condutor auxiliar de taxista em 2011, mas migrou para a Uber, em 2019, após perceber que as plataformas estavam conquistando clientes e dificultando a operação dos táxis. Para ele, o discurso de aumento da procura por táxis é mais um desejo do setor do que uma realidade.
“O sonho dos taxistas é que o serviço esteja voltando. Pode ser que uma ou outra pessoa mal atendida nos aplicativos queira voltar para o táxi, mas, no geral, não há um retorno significativo. Não vejo passageiros migrando em massa para o táxi. A população se adaptou às plataformas. A classe vê crescimento porque tem esperanças, mas os números e o comportamento do passageiro dizem outra coisa”, argumenta.
Na contramão
A série histórica de frota da Prefeitura de BH parece reforçar essa percepção. Em 2021, a cidade contava com 6.242 táxis em circulação. No ano seguinte, o número caiu para 6.042 e, em 2023, atingiu o menor patamar desde então, com 6.029 veículos ativos.
Em 2024 houve uma reação: o total saltou para 6.548, alta de mais de 500 carros em relação ao ano anterior. Mas a recuperação não se sustentou. Em 2025, a frota ativa voltou a cair, com perda de mais de 300 carros. Até este início de outubro, a capital conta com 6.912 permissões de táxi, das quais apenas 6.196 estão operando.
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São números oficiais que não apontam um crescimento contínuo na oferta de serviço, mas uma queda após a pandemia, seguida de uma recuperação pontual e nova redução. Essa variação, conforme a gestão municipal, se deve à possibilidade de cada taxista suspender temporariamente a operação do veículo por até dois anos, renováveis, sem que isso implique perda da autorização.
Transferência de permissões
Segundo Marco Antônio, muitos condutores auxiliares, como ele, tiveram que sair do serviço de táxi porque não havia possibilidade de transferir permissões e a competição com os aplicativos se intensificou. “A Uber chegou em 2014 e começou a tomar terreno e clientes. A maioria dos taxistas e auxiliares tiveram que ‘vazar’, porque a transferência de permissão era praticamente impossível em Belo Horizonte”, afirmou.
O motorista acredita que o aumento repentino da frota no ano passado, de 6.029 para 6.548 taxistas ativos, se deve à abertura de transferência de permissões. Decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) estabeleceu um prazo de dois anos, a partir de abril de 2023, para que as atuais permissões de tráfego fossem transferidas para herdeiros ou terceiros.
Procurada pelo Estado de Minas, a prefeitura esclareceu que as autorizações e permissões para a exploração do Serviço de Utilidade Pública de Transporte por Táxi são delegadas exclusivamente pela Superintendência de Mobilidade do Município de Belo Horizonte (Sumob) ou pela BHTrans.
“A alteração no número de autorizações ou permissões somente poderá ser autorizada pelo prefeito de Belo Horizonte, após a realização de estudos técnicos e econômicos conduzidos pela Sumob, respeitando os procedimentos previstos no processo de credenciamento”, informou a PBH, em nota.
No entanto, o prazo para a transferência de permissões do serviço de táxi foi encerrado em 10 de abril de 2025, conforme estabelecido pelo Decreto 18.410, de 9 de agosto de 2023, e pela Portaria Sumob 032, de 25 de agosto de 2023, e a prática está proibida na cidade desde então.
Novo perfil de condutores
Entre os taxistas, a percepção contrasta com os dados da frota. O presidente do Sindicato dos Taxistas Autônomos de Minas Gerais (Sincavir-MG), João Paulo Castro, vê um momento de ressurgimento da categoria. “O táxi passou por um momento muito difícil, devido à concorrência dos aplicativos e à pandemia. Muitos motoristas se afastaram por serem do grupo de risco. Mas hoje vemos um cenário positivo. Diminuiu o número de permissões na reserva, e isso mostra que mais pessoas estão voltando ao serviço”, disse ele.
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439
total de pontos fixos de táxi na capital, segundo a PBH, apesar de aplicativos de corridas terem tornado a estrutura menos necessária
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O representante afirma que a reabertura para transferências de permissões, encerrada em abril deste ano, renovou o perfil da frota com a entrada de profissionais mais jovens. “Motoristas mais antigos, aposentados ou cansados, transferiram suas permissões para herdeiros e pessoas mais novas”, argumenta João Paulo.
Tecnologia vira aliada
Mairon Melo é taxista há 15 anos, e concorda com a sensação de crescimento do serviço. Segundo ele, a demanda tem aumentado significativamente devido à integração do táxi às plataformas digitais. “O passageiro está voltando a usar o táxi por conta de muitas insatisfações com os aplicativos, como carro velho, motorista que não sabe dirigir ou até mesmo que cancela corrida”, disse o taxista.
Melo explicou que o funcionamento dos táxis mudou com a chegada dos aplicativos. Isso porque plataformas passaram a incluir o táxi, o que deu mais visibilidade ao serviço. “Antes eu trabalhava em um ponto fixo, atendia o telefone, corria até o cliente e voltava para o ponto. Agora é diferente: temos pontos flutuantes. Posso estar em qualquer bairro, receber a corrida pelo aplicativo e ir até o passageiro. É mais dinâmico, mais eficiente. Alguns colegas ainda usam o ponto tradicional, mas a maioria já está inserida na modernidade”, detalha.
7.500
permissões ativas de táxi em BH é a meta reivindicada pelo sindicato dos taxistas, sob argumento de fortalecer o serviço
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6.912
é o número atual de permissões de táxi na cidade, das quais apenas 6.196 estavam operando ao fim de setembro de 2025
6.912
é o número atual de permissões de táxi na cidade, das quais apenas 6.196 estavam operando ao fim de setembro de 2025
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O presidente do Sincavir também destaca a questão da tecnologia. “O táxi está dentro das plataformas, como Uber e 99, mas também temos o Táxi Belô, nosso aplicativo oficial, que segue o valor do taxímetro. Isso garante segurança e previsibilidade para o passageiro. É um diferencial frente aos aplicativos que cobram tarifas dinâmicas e podem cancelar corridas”, acrescenta João Paulo Castro.
Fiscalização e freio
A passageira Regina Mota é usuária tanto do serviço de táxi quanto dos aplicativos. Ela afirma não ter preferência por nenhum dos dois, mas quando precisa optar, o táxi é a escolha principal – sobretudo pela segurança. “A fiscalização é muito importante. Eles são vistoriados, os carros estão em bom estado. Eu já peguei carro de aplicativo sem freio”, compara ela.
O motorista de app Marco Antônio reconhece as vantagens das inspeções periódicas. “O táxi é mais seguro, os carros são vistoriados, confortáveis e seguem padrões de manutenção. Mas o cliente, na prática, olha preço e praticidade. Os aplicativos oferecem corridas rápidas, disponíveis a qualquer momento, mesmo com veículos menores e menos vistoriados”, destaca ele.
Ainda assim, Regina reconhece que a disponibilidade do serviço dos táxis é limitada. Segundo a percepção dela, a frota diminuiu visivelmente em BH nos últimos anos, o que torna o tempo de espera maior. “O número de táxis diminuiu, isso é claro. Muitas vezes, eu mando mensagem pelo aplicativo e ninguém responde, ou então demora muito. Já aconteceu de o prazo ser até de 10 minutos e mesmo assim o carro não chegar”, relata.
Demandas da categoria
Entre os taxistas, ainda há demandas pendentes relativas à melhoria do setor, e já encaminhadas pelo Sincavir-MG à Sumob. Entre as reivindicações estão a fiscalização, reativação dos táxis lotações em dia de grandes eventos em estádios e recomposição de frota.
De acordo com João Paulo Castro, a tarifa do serviço de lotação está muito defasada, o que impede os taxistas de fazerem viagens em dias de shows e jogos de futebol, por exemplo. No trajeto do Mineirão para o Centro da cidade, atualmente, o valor é de R$ 11,60.
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Passando por Contagem, na Grande BH, em direção à Região Central, o valor é R$ 16,10. Se o destino for a Cidade Industrial, a tarifa é de R$ 13. As quantias são as mesmas para a Arena Independência. As viagens da Arena MRV, por sua vez, têm preço fixo de R$ 11,60. O pedido do sindicato é que o serviço passe ao valor de R$ 20.
A recomposição da frota também faz parte das negociações. A categoria reivindica um chamamento público que reative permissões de táxi que se encontram paralisadas, com o objetivo de colocar mais veículos em circulação e fortalecer o serviço na capital.
“Há permissões paradas na BHTrans. Pedimos que essas permissões voltem para a ativa”, afirma João Paulo Castro. A meta, segundo o sindicalista, é chegar a 7.500 permissões ativas.