Pouco antes do anoitecer de terça-feira (27/05), o Starship SpaceX — foguete mais poderoso do mundo — decolou da sua base de lançamento no Texas para um voo de teste.

As expectativas para o sucesso da missão eram altas, após duas tentativas fracassadas em janeiro e março, que terminaram em explosões.

O foguete Starship é composto por duas partes principais: a nave, que é o estágio superior, e o super heavy (super pesado, na tradução livre para o português), que é um enorme propulsor sobre o qual a nave fica montada. Essas duas partes combinadas medem cerca de 120 metros.

Mas, minutos após se separar do propulsor, ficou claro que algo estava errado com a nave não tripulada. Ela começou a girar fora de controle.

"Perdemos o controle de atitude do Starship", disse um comentarista da SpaceX durante a transmissão ao vivo do voo de teste. Mais tarde, a empresa confirmou o que chamou de "desmontagem rápida não programada".

O resultado não foi tão ruim para a empresa de Elon Musk.

A espaçonave registrou seu maior progresso até o momento — superando as tentativas anteriores — e usou com sucesso um propulsor reutilizado, um passo importante para seus planos de desenvolver foguetes totalmente reutilizáveis.

Mas, o nono voo teste do foguete Starship foi a terceira tentativa consecutiva a terminar em um fracasso total.

A SpaceX tem um forte histórico de confiabilidade com seu foguete mais bem-sucedido, o Falcon 9. Contudo, três missões fracassadas em poucos meses podem levar algumas pessoas a se perguntar: está dando tudo errado para a SpaceX Starship?

No mesmo dia (16/1), a Blue Origin, de Jeff Bezos, realizou o primeiro voo orbital do foguete New Glenn. wikimedia commons/U.S. Space Force 45SW by Senior Airman Samuel Becker
O foguete Super Heavy, por sua vez, completou seu retorno à plataforma de lançamento aproximadamente sete minutos após a decolagem, seguindo o plano previsto. reprodução/spacex
Embora a abordagem de testes da empresa frequentemente leve os protótipos ao limite, a falha desta quinta-feira (16/1) ocorreu em uma fase já concluída com sucesso anteriormente. reprodução/spacex
Os testes representam parte do esforço multibilionário de Elon Musk para desenvolver um foguete capaz de transportar humanos e cargas para Marte, além de lançar grandes lotes de satélites. Victor Gonzalez Couso/Flickr
Para o 7º teste, a nave recebeu diversas atualizações, incluindo melhorias no sistema de propulsão, componentes eletrônicos, sensores e câmeras, oferecendo mais de 30 ângulos de monitoramento. reprodução/spacex
Apesar da falha, o administrador da Nasa, Bill Nelson, elogiou a empresa pelo teste. "O voo espacial não é fácil. É tudo menos rotina. É por isso que esses testes são tão importantes — cada um nos aproxima do nosso caminho para a Lua e em direção a Marte", escreveu. Bill Ingalls - Nasa
Esse lançamento representou a primeira tentativa de implantação de satélites da Starlink, serviço de internet da SpaceX. divulgação
"O sucesso é incerto, mas o entretenimento é garantido!", disse o bilionário em um vídeo publicado nas redes sociais. Reprodução do Instagram @elonmusk
Dessa vez, Elon Musk, CEO da SpaceX, sugeriu que o problema pode ter sido causado por vazamento de oxigênio e combustível. Victor Gonzalez Couso - Flickr
Outros quatro testes ocorreram em 2024, sendo o último em novembro. Na ocasião, o foguete não conseguiu retornar para a plataforma de lançamento e acabou pousando no Golfo do México poucos minutos depois do lançamento. reprodução/spacex
Em novembro/23, o Super Heavy (propulsor) explodiu, mas depois de se separar da nave. reprodução/spacex
A última falha similar da Starship ocorreu em abril de 2023. Na ocasião, após um problema nos motores, a empresa precisou ativar um sistema de autodestruição. Reprodução/Twitter SpaceX
Este foi o sétimo teste da Starship realizado pela SpaceX. Os estudos previam um pouso controlado no Oceano Índico, cerca de uma hora após seu lançamento do Texas. Divulgação
No Aeroporto Internacional de Miami, alguns voos tiveram que ser cancelados. flickr - Sharon Hahn Darlin
Pelo menos 20 voos comerciais precisaram ser desviados ou ter suas rotas alteradas, segundo o FlightRadar24. reprodução/flightradar24
"Perdemos toda a comunicação com a nave. Isso nos diz que tivemos uma anomalia com o estágio superior", explicou Dan Huot, gerente de comunicação da SpaceX. reprodução/spacex
Imagens captadas pela Agência de Notícias Reuters mostram bolas de luz laranja deixando rastros de fumaça no céu de Porto Príncipe, no Haiti. montagem/reprodução redes sociais
A falha forçou voos comerciais no Caribe a desviarem de suas rotas por questão de segurança. Sangga Rima Roman Selia Unsplash
O lançamento ocorreu no Texas, às 19h38 (horário de Brasília). Assim como todos os anteriores, esse voo da Starship não era tripulado. reprodução/spacex
Oito minutos após a decolagem, o controle de missão perdeu contato com a nave, que transportava sua primeira carga de teste com satélites simulados. reprodução/spacex
Uma falha no lançamento da Starship, que pertence à SpaceX, lançou uma chuva de destroços no ar dos Estados Unidos nesta quinta-feira (16/01). reprodução

O que deu errado no voo de terça-feira?

Ainda não se sabe o que realmente aconteceu. Os dados do teste devem ficar disponíveis em breve, e a SpaceX vai usá-los para fazer os ajustes necessários antes do próximo voo.

A missão teste desta terça-feira começou de uma forma muito melhor do que as anteriores, disse à BBC o astrônomo do Centro de Astrofísica da Harvard-Smithsonian Jonathan McDowell.

A nave "conseguiu completar toda a fase de inserção orbital com sucesso, o que significa que o foguete funcionou durante todo o tempo previsto", destacou.

Contudo, os problemas da equipe já haviam começado nesse ponto, com a perda de contato com o propulsor, que acabou caindo no Golfo do México em vez de realizar o pouso controlado como planejado.

Logo em seguida, a espaçonave foi forçada a abortar a liberação dos satélites simulados da Starlink depois que a porta do compartimento de carga ficou presa e precisou ser fechada.

Para McDowell, a "grande falha" foi a incapacidade da SpaceX de manter a "atitude do foguete — sua direção de apontamento — durante a órbita".

Apesar desse ser o maior progresso da Starship até agora, a espaçonave apresentou vazamentos, se partiu em órbita e caiu na reentrada.

'Falhe rápido, aprenda rápido'

Andrew Harnik/Getty Images
Elon Musk tem planos ambiciosos de levar seres humanos a Marte

A SpaceX opera com base no princípio de iteração rápida, tratando as falhas de teste como oportunidades de aprendizado e não como retrocessos.

Embora essa abordagem tenha levado a grandes avanços, as falhas repetidas levantaram questionamentos sobre a confiabilidade e segurança da espaçonave a longo prazo.

Ainda assim, a empresa espera que seu lema "falhe rápido, aprenda rápido", vai, eventualmente, trazer resultados, como aconteceu durante o desenvolvimento da linha de foguetes reutilizáveis Falcon.

Segundo Leah-Nani Alconcel, engenheira de espaçonaves e professora associada da Universidade de Birmingham, não é óbvio que o mesmo aconteça com o Starship.

"Cada lançamento do Starship é substancialmente mais caro do que foram os lançamentos do Falcon", ela disse à BBC.

"O principal objetivo é enviar seres humanos a Marte, uma meta que depende do desenvolvimento de um mercado que ainda não existe ainda, e que representa um risco financeiro maior", disse.

"As falhas repetidas, caras e destrutivas do Starship, e a indiferença ou até a celebração delas, também não passam a sensação de que segurança e confiabilidade são os principais motivadores do seu desenvolvimento."

McDowell também prevê mais falhas. "Há toda uma nova geração de tecnologia especial nesse foguete, então não me surpreende que eles estejam tendo problemas."

"Mas eu realmente acho que eles vão conseguir fazer funcionar, eventualmente", acrescentou.

A SpaceX tem sido ambiciosa demais?

Elon Musk e sua empresa têm planos ambiciosos de que o sistema de foguete levará, um dia, os seres humanos para Marte.

A Nasa quer usar o Starship como parte de seu programa Artemis, que tem como objetivo estabelecer uma presença humana de longo prazo na lua.

O primeiro voo tripulado está marcado para o meio de 2027, mas o tempo está se esgotando, disse o jornalista e autor David Whitehouse.

McDowell acredita que pode levar muitos anos até que o Starship esteja pronto para uma missão tripulada à lua, o que poderia deixar a Nasa em uma "uma situação bastante embaraçosa".

"No setor especial, nós falamos no 'tempo de Elon'. Se ele disser que ele vai fazer algo em um ano, marque no calendário para daqui três anos", acrescentou.

Há motivo para otimismo?

O voo espacial comercial se expandiu rapidamente, com empresas privadas buscando explorar recursos no espaço e construir novas economias além da Terra.

Com concorrentes como a Blue Origin, Jeff Bezos, e algumas iniciativas chinesas ganhando espaço, será que a SpaceX ainda mantém sua vantagem?

"Ninguém está tentando algo nessa escala do Starship", afirmou McDowell.

"Se eles [Space X] conseguirem fazer funcionar — e eles devem eventualmente conseguir — isso vai consolidar a posição da SpaceX como líder na indústria."

Então, apesar das últimas tentativas frustradas, ainda há motivo para otimismo?

"Talvez não otimismo, mas uma confiança moderada", finalizou McDowell.

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