Rodrigo Paz e Tuto Quiroga: quem são os candidatos à presidência da Bolívia
O moderado Rodrigo Paz e o conservador Jorge Tuto Quiroga disputam neste domingo a presidência da Bolívia, no primeiro segundo turno da história do país
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A Bolívia decidiu mudar de rumo; agora é hora de definir a direção.
Após a derrota da esquerda no primeiro turno, em 17 de agosto, os bolivianos vão às urnas neste domingo para escolher seu próximo presidente.
O centrista Rodrigo Paz e o conservador Jorge Tuto Quiroga disputarão os próximos cinco anos de governo na Bolívia no primeiro segundo turno da história do país.
O vencedor liderará o primeiro governo de centro-direita eleito nas urnas após duas décadas de domínio do Movimento ao Socialismo (MAS), partido que governou quase ininterruptamente desde 2006 sob a liderança de Evo Morales.
Em meio a uma das crises econômicas mais severas do país — com inflação anual acima de 23%, escassez de reservas internacionais e perda de valor da moeda —, uma ampla maioria optou por candidatos da oposição.

De um lado, Rodrigo Paz, do Partido Democrata Cristão (PDC), se apresenta como um reformista moderado que busca um "capitalismo para todos". Entre os pilares de sua proposta está um plano de ajuste fiscal com o qual pretende avançar em cortes de gastos públicos.
Deputado, prefeito e atual senador por Tarija, Paz é filho do ex-presidente Jaime Paz Zamora (1989-1993), que foi um dos principais líderes do histórico Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR).
Do outro lado, Jorge Tuto Quiroga, da aliança Liberdade e Democracia (Libre), busca voltar ao governo 23 anos depois de ter exercido a presidência, de 2001 a 2002, após a renúncia por doença do ex-presidente Hugo Banzer Suárez.
Quiroga se apresenta como um homem com experiência técnica e política, capaz de enfrentar os difíceis desafios da economia do país. Para isso, defende um rigoroso plano de austeridade e uma "terapia de choque".
Estes são os dois candidatos que disputarão a presidência da Bolívia neste domingo, 19 de outubro.
O senador Rodrigo Paz
Rodrigo Paz, de 58 anos, chega ao segundo turno deste domingo com um enfoque pragmático e a promessa de recuperar a estabilidade fiscal da Bolívia, sem abandonar os setores populares que dão dinamismo à economia.
"Não vamos prejudicar a saúde, a educação, a segurança nem os benefícios sociais", promete Paz, com um discurso moderado e estrategicamente afastado das ideologias.
Nascido na Galícia em 1967, durante o exílio de seu pai, o ex-presidente Jaime Paz Zamora (1989-1993), Paz viveu em dez países antes de chegar, aos 15 anos, à Bolívia.
Jaime Paz Zamora, de 86 anos, foi um dos principais líderes do Movimento de Esquerda Revolucionária (MIR), um partido de esquerda que se tornou centro-direita, onde o próprio Rodrigo Paz iniciou sua carreira política.
O candidato do Partido Democrata Cristão estudou Relações Internacionais e possui mestrado em Gestão Pública pela American University, em Washington, DC.

Aos 32 anos, Paz decidiu se dedicar à política e se candidatou a deputado por Tarija.
Desde então, Paz foi deputado, prefeito de Tarija e, atualmente, senador pelo departamento.
Formado no MIR de seu pai, Paz mudou de partido, passando pela Comunidade Cidadã de Carlos Mesa até chegar ao PDC, que hoje o leva como candidato à presidência.
"O PDC era um partido morto que foi recuperado para dar aos antigos eleitores do MAS, insatisfeitos com o partido, a oportunidade de manter certa identidade política", diz o jornalista boliviano Fernando Molina, autor de *As 4 crises: História econômica contemporânea da Bolívia*.
No primeiro turno, Paz não conseguiu se impor em Tarija, seu reduto político por mais de duas décadas. Pelo contrário, terminou em terceiro lugar, com apenas 19%; na capital, onde foi prefeito, alcançou apenas 15%.

Paz foi acusado de suposta corrupção em obras públicas durante sua gestão como prefeito de Tarija, incluindo sobrepreços e contratos irregulares.
Em sua campanha, garantiu que reduzirá impostos, dará acesso ao crédito e eliminará restrições às importações. Além disso, pretende cortar subsídios aos combustíveis e buscar descentralizar o orçamento.
"O que me importa é que as pessoas possam comer e trabalhar, que o Estado não atrapalhe a vida de ninguém", afirmou Paz à imprensa local, referindo-se ao que costuma chamar de "Estado travado".
Paz soube se apresentar como um outsider, embora não seja.
A inclusão de Edman Lara como companheiro de chapa — um policial conhecido entre os setores populares por denunciar corrupção no TikTok — ajudou em uma campanha que pedia caras novas, mas pode complicar sua posição no segundo turno, segundo analistas.
"Lara foi fundamental no primeiro turno, mas pode ter se tornado um problema. Muitos eleitores estão receosos com Lara", afirma Eduardo Gamarra, professor boliviano da Universidade Internacional da Flórida.
Enquanto Lara aproxima Paz dos eleitores do MAS, isso pode afastá-lo de outros setores que não querem saber nada de Evo Morales.
O ex-presidente Tuto Quiroga
Jorge Tuto Quiroga, de 65 anos, busca se apresentar como um homem com experiência técnica e política capaz de recuperar a economia e enterrar, de forma definitiva, os anos de socialismo na Bolívia.
Nascido em Cochabamba, o candidato da aliança Libre recebeu o apelido de seu pai, Jorge Tuto Quiroga Luizaga.
Após concluir o ensino médio, Tuto viajou aos Estados Unidos para estudar Engenharia Industrial na Texas A&M University e depois fez um mestrado em Administração de Empresas na St. Edward's University, em Austin.
Foi nos EUA que deu seus primeiros passos no setor privado, como engenheiro de sistemas na International Business Machines (IBM), até retornar à Bolívia em 1988.
Durante o governo do pai de Rodrigo Paz, Jaime Paz Zamora, Quiroga começou sua trajetória no setor público como parte das novas elites liberais formadas no exterior.
Tuto ocupou um cargo técnico no Ministério das Relações Exteriores de Paz Zamora, foi subsecretário do Ministério do Planejamento e ministro das Finanças.
Mas não chegou a esses cargos por afinidade com o antigo líder do MIR, e sim por acordos com a Ação Democrática Nacionalista (ADN).

Tuto integrou as fileiras da ADN, um espaço político fundado por Hugo Banzer Suárez, antigo ditador militar (1971-1978) e posteriormente eleito democraticamente presidente da Bolívia em 1997.
A aliança com o ex-ditador se consolidou com a candidatura de Tuto a vice-presidente de Banzer. Aos 37 anos, tornou-se o vice-presidente mais jovem da história da Bolívia.
Em 2001, Banzer renunciou por problemas de saúde, e Quiroga assumiu a presidência da Bolívia por sucessão constitucional, cargo que ocupou até agosto do ano seguinte.
Apesar de Tuto ter representado a ala renovadora dentro da ADN, carrega uma história que não lhe permite se apresentar como expressão de novidade em um momento que exige caras diferentes.
Nesse sentido, os estrategistas de campanha de Tuto entenderam que a confrontação não seria a melhor estratégia para esta eleição.
"Em vez de buscar o papel de candidato com carisma popular, Tuto optou por uma campanha como o bom sujeito, pai de família, carinhoso, em vez de assumir uma postura mais confrontativa", diz Molina.
Para renovar sua imagem, apostou em um empreendedor tecnológico de Santa Cruz, de 38 anos, como seu candidato a vice-presidente: Juan Pablo Velasco.

Nas eleições de 2005, competiu à presidência da Bolívia, mas perdeu para Morales, na primeira vitória eleitoral que permitiu ao MAS chegar ao poder.
Após essa derrota, Quiroga permaneceu afastado da política até dezembro de 2019.
Naquele ano, a presidente interina Jeanine Áñez o nomeou delegado presidencial para dialogar com a comunidade internacional, cargo que ocupou apenas algumas semanas.
Nesse contexto, Evo Morales o chamou de "especialista defensor das ditaduras".
Em dezembro de 2024, Quiroga lançou sua quarta candidatura à presidência da Bolívia, após uma tentativa frustrada de unidade.
Entre as medidas que propõe para enfrentar a crise econômica estão a eliminação de impostos sobre investimento estrangeiro, a abertura irrestrita à importação de combustíveis e a solicitação de um empréstimo ao FMI.
O voto da esquerda
O primeiro turno não apenas confirmou o declínio da esquerda, como também mostrou que os departamentos onde o MAS venceu nas eleições de 2020 passaram a ficar nas mãos de Rodrigo Paz.
Os resultados em La Paz, Cochabamba, Oruro, Potosí e Chuquisaca evidenciaram que esses distritos optaram por substituir o azul do MAS pelo verde do PDC.
No departamento de La Paz, o segundo maior colégio eleitoral do país, o candidato do PDC alcançou o primeiro lugar com 47% dos votos, enquanto em 2020 o MAS havia obtido 68%.
"Paz captura o voto, tanto rural quanto urbano, que o MAS perdeu", afirma Gamarra.
Em El Alto, a segunda cidade mais populosa da Bolívia, com população urbana indígena, Paz obteve o primeiro lugar com 59% dos votos, enquanto em 2020 o Movimento ao Socialismo havia vencido com 76%.

"Este setor não vê Rodrigo como um social-democrata nem como filho de seu pai, mas sim como alguém cujo discurso favorece mais seus interesses, embora ele não seja nenhum esquerdista", acrescenta.
Por sua vez, Morales, que havia chamado para anular o voto no primeiro turno, agora demonstrou algum reconhecimento a Lara.
"Evo aposta que Paz vença e que, portanto, seja um governo mais fraco, mais disperso, menos agressivo, que não o persiga e que caia o mais rápido possível", aponta Molina.
Apesar da boa base de apoio de Paz, os analistas afirmam que — segundo pesquisas privadas às quais têm acesso — isso pode não ser suficiente para derrotar Quiroga, que decidiu se mover para o centro no segundo turno da campanha.

"Tuto vai manter os votos de Santa Cruz e de Pando; a questão é se isso será suficiente. Santa Cruz é o maior colégio eleitoral, mas é preciso conquistar mais votos, possivelmente aqueles de Samuel Doria Medina", explica Gamarra.
Embora o candidato Doria Medina, que ficou em terceiro no primeiro turno com 20% dos votos, tenha declarado na noite da eleição apoio a Rodrigo Paz, os analistas concordam que grande parte desses votos pode migrar para Quiroga.
"Eu disse que, se não ganhássemos, apoiaria quem ficasse em primeiro, desde que não fosse o MAS. Esse candidato é Rodrigo Paz, e mantenho minha palavra", afirmou Doria Medina naquela noite.
Não há dúvida de que o primeiro turno marcou uma virada na história recente da Bolívia, após quase 20 anos de governos do MAS.
Agora resta definir qual proposta preencherá essa página em branco: a opção mais conservadora ou uma alternativa mais moderada.
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