Criador de comunidade católica no Minecraft se defende: "Queremos ajudar"
Intitulada Arquidiocese de Salvador Minecraft, a iniciativa foi acusada de usar indevidamente símbolos religiosos da capital baiana
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Siga noA Arquidiocese de Salvador da Bahia emitiu, na última quinta-feira (26/6), um alerta oficial contra uma comunidade de Minecraft que simula a estrutura da Igreja Católica dentro do universo do jogo. Intitulada Arquidiocese de Salvador Minecraft, a iniciativa foi acusada de usar indevidamente símbolos religiosos da capital baiana.
A instituição religiosa considera que o site da comunidade pode induzir os fiéis a erro, especialmente aqueles que desconhecem a natureza fictícia do projeto. O caso foi levado à Delegacia Virtual do Estado da Bahia, resultando na abertura de um boletim de ocorrência.
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A história do servidor
Por trás da denúncia está um projeto criado em 2015 por um grupo de adolescentes católicos do Ceará, que decidiu unir fé e diversão no ambiente de um dos jogos mais populares do mundo: Minecraft. O jogo, conhecido por permitir a construção de mundos com blocos pixelados, tornou-se palco de um verdadeiro universo simbólico cristão. A comunidade é formada por cerca de 430 jovens ativos, espalhados por cinco países: Brasil, México, Costa Rica, Colômbia e Argentina.
A ideia original era evangelizar jovens em um espaço onde muitos passam horas diariamente: o mundo dos games. Ao longo dos anos, foi construída uma rede de servidores com hierarquias que reproduzem, em forma de RPG (jogo de interpretação de papéis), a estrutura da Igreja Católica, na qual os participantes assumem funções como seminaristas, diáconos e “padres”. O projeto conta com 19 “Arquidioceses” em diferentes regiões, entre elas a da cidade de Salvador.
Procurado pela reportagem, um dos idealizadores do projeto — que atua como Papa Bento XVI no jogo — e preferiu não se identificar, explicou que o nome “Arquidiocese de Salvador” foi uma homenagem aos baianos que participam do projeto, sem intenção de causar confusão ou apropriação indevida. “Queríamos que esses adolescentes se sentissem representados. É um espaço de acolhimento simbólico, não institucional”, explicou.
“Nosso objetivo sempre foi levar a palavra de Deus para os jogos online, principalmente aos jovens que se afastam da fé ou vivem em contextos difíceis”, afirmou.
As atividades realizadas pelo grupo incluem encontros, estudos e simulações de celebrações religiosas: “As missas que acontecem são celebrações da Palavra em ambiente virtual. Nenhum dos participantes tem a ordenação real que os padres possuem. Tudo é simbólico, voltado à formação e à aproximação das pessoas com a fé.”
Para participar, a comunidade passa por uma espécie de “formação vocacional” fictícia. Os membros são incentivados a conhecer os ritos e a estrutura da Igreja por meio de um processo que simula a jornada religiosa: de seminarista a diácono e, eventualmente, a “padre” dentro do jogo.
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O propósito declarado não é substituir a prática religiosa na vida real, mas complementá-la. “O objetivo é que esses jovens participem mais ativamente de suas paróquias físicas, conhecendo melhor a fé. Muitos dos nossos membros hoje estão em seminários reais ou ocupam cargos na Igreja. O virtual tornou-se um ponto de partida para o engajamento no mundo real”, afirma o idealizador.
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Reação à denúncia
Os adolescentes foram pegos de surpresa com a denúncia. Segundo o representante do servidor, a Arquidiocese nunca entrou em contato diretamente com os administradores do site antes de tornar pública a acusação. “Ficamos sabendo pela matéria do G1. Foi um susto para todos, especialmente porque muitos dos jovens que participam do projeto têm ligação real com a Igreja e até trilham o caminho do sacerdócio”, lamentou.
O grupo afirma estar disposto a fazer as alterações necessárias para evitar conflitos com a Igreja oficial. “Já enviamos uma mensagem à Arquidiocese, nos colocando à disposição para mudar o nome do servidor e evitar qualquer tipo de mal-entendido. Nosso objetivo é ajudar, não confundir”, reforçou.
“O mundo está cada vez mais virtual, e a fé precisa encontrar espaço onde os jovens estão. É nisso que acreditamos”, conclui o idealizador.
Em uma nota divulgada no Instagram, a comunidade de Minecraft se manifestou sobre o ocorrido, ressaltando a surpresa e o mal-entendido da situação. Confira a nota na íntegra:
Recebemos com surpresa, por meio da reportagem do G1, a notícia sobre a ação da Arquidiocese de Salvador em relação à nossa comunidade de Minecraft. Já entramos em contato com o Setor Jurídico para buscar uma solução fraterna, fundamentada no Evangelho. Reiteramos que nosso objetivo no ambiente virtual é evangelizar e atrair jovens a Deus e à Sua Igreja, sem jamais nos passar pela Arquidiocese da vida real ou enganar os fiéis. Que Cristo nos guie para resolver essa situação com respeito e união cristã.
Após se pronunciarem nas redes sociais, receberam o apoio de diversos adolescentes que se sentem representados pela mensagem propagada pela comunidade.
“Vão processar um grupo de jogadores de Minecraft por criarem uma comunidade religiosa DENTRO DE UM JOGO”, comentou um usuário.
“Contra os abusos litúrgicos na própria Arquidiocese ninguém faz nada”, disse outra pessoa.
“O Arcebispo do Minecraft tem mais bom senso que o do mundo real KKKKKKKKKKKKKK”, falou outro.
Outro lado
O Estado de Minas procurou a Arquidiocese de Salvador para entrevista, mas ainda não obteve retorno até a publicação desta edição.
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Minecraft
Lançado em 2009, Minecraft, o jogo de computador mais vendido do mundo, é composto por um mundo de blocos e criaturas curiosas, cujo objetivo principal é a liberdade de ação e exploração. Ao contrário de muitos games com objetivos definidos, ele oferece um mundo aberto onde os jogadores podem escolher como querem jogar. Alguns preferem se concentrar em construir, outros em sobreviver, explorar ou lutar contra monstros, ou combinar todas essas atividades.
Estagiária sob supervisão da subeditora Fernanda Borges