É preciso falar do combate à desigualdade no mundo
No Brasil, segundo a Oxfam, pelo menos quatro dos cinco bilionários brasileiros mais ricos aumentaram em 51% sua riqueza desde de 2020. Nesse período, outros 129 milhões de brasileiros ficaram mais pobres
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Siga noO Fórum Econômico Mundial, que mais uma vez ocorre em Davos, nos Alpes suíços, vai se dedicar mais aos temas que envolvam a transição climática e a ponte para uma economia que descarboniza sua geração de riqueza, sob pena de não mais haver retorno na elevação da temperatura do planeta e na ameaça a milhões de seres humanos no futuro recente. Gerar mais empregos, fazer da inteligência artificial o motor para a economia e para a sociedade e a segurança e cooperação em um mundo fragmentado, e, obviamente, uma estratégia para o clima, a natureza e a energia, são os tempos do Fórum Davos 2024, que entre chefes de Estado, presidentes de empresas, representantes da sociedade civil, meios de comunicação globais e líderes juvenis, deve reunir 2.500 pessoas, nos dias de debate.
Visto como menos urgente do que as mudanças climáticas, mas tão necessário quanto, a desigualdade social não estará no foco direto das discussões, sobretudo porque um dos seus maiores defensores hoje, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, não participará do evento. Ao jogar o Fórum Econômico para segundo plano, o presidente Lula perde a primeira janela internacional para pôr em prática a prioridade fixada para sua gestão à frente do G20, de combater a fome e a desigualdade social.
Ao deixar a representação do Brasil em Davos 2024 como responsabilidade da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, do ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira e do assessor especial da Presidência, Celso Amorim, o governo brasileiro priorizou as mudanças climáticas em detrimento de uma agenda social. Isso exatamente no momento em que um estudo da Oxfam mostra que o mundo está perto de ter os primeiros trilionários até 2033, enquanto para erradicar a pobreza serão necessários 230 anos. E a aposta da Oxfam está exatamente no Brasil para encabeçar a demanda de se fixar metas de redução da desigualdade, assim como há metas para redução da emissão dos gases do efeito estufa.
Os dados do relatório “Desigualdade S.A – como o poder corporativo divide nosso mundo e a necessidade de uma nova era de ação pública”, divulgado na segunda-feira, mostram que a fortuna das cinco pessoas mais ricas do mundo mais que dobrou no ano passado, enquanto a renda de 5 bilhões de pessoas no mundo diminuiu. No Brasil, segundo a Oxfam, pelo menos quatro dos cinco bilionários brasileiros mais ricos aumentaram em 51% sua riqueza desde de 2020. Nesse período, outros 129 milhões de brasileiros ficaram mais pobres. A desigualdade social no mundo e no Brasil é gritante e está na origem da crise migratória nas Américas e da África para a Europa, assim como da fome a que estão condenados milhões de seres humanos.
A Oxfam estima que apenas os recursos usados em dividendos e recompra de ações para os 10% mais ricos em 2022 fossem redistribuídos aos 40% mais pobres e a desigualdade teria uma redução de mais de 20%. E ainda, se metade do valor pago aos 10% mais ricos em 2022 fosse distribuído seria suficiente para acabar com a pobreza global (US$ 6,85 por dia). Para a entidade, grandes empresas e monopólios estão aumentando a desigualdade social em toda a economia, sendo necessária uma ação dos governos no sentido de fortalecer os serviços públicos para a população e de cobrar impostos sobre grandes fortunas e a parcela dos mais ricos no sentido de aumentar a distribuição de renda e combater a desigualdade.
No Brasil, a desigualdade vem de longa data e se perpetua, hora tendo pequenas reduções, hora avançando. Na década de 1970, com o milagre econômico, se criou o conceito de que era preciso fazer o bolo crescer para depois distribuir e o economista Edmar Bacha cunhou a expressão “Belíndia” para mostrar a proximidade do Brasil rico com a Bélgica e a parcela pobre com a Índia. A representação precisa ser atualizada não porque a realidade brasileira mudou, mas sim porque os países que foram referência no passado mudaram. A retomada dos programas sociais ajuda a diminuir a desigualdade, mas de uma forma ínfima. É preciso efetivamente que as nações, e em especial o Brasil, adotem medidas para efetivamente combater a desigualdade, com estabelecimento de metas a serem cumpridas.