Nos últimos dois anos, o Brasil tem assistido a uma abertura desenfreada de cursos de medicina. A justificativa do Ministério da Educação (MEC), órgão que autoriza a criação das instituições de ensino, é a pouca oferta de médicos em determinados municípios e, consequentemente, a escassa prestação de serviços de saúde em algumas regiões, com destaque para as áreas mais remotas e periféricas do país.
No entanto, os médicos – contrários à abertura desmedida e à queda de qualidade das instituições de ensino – alegam que mesmo que os futuros profissionais estudem em faculdades de cidades menores ou mais distantes, isso não significa que eles permanecerão na região. O que geralmente ocorre, dizem os próprios médicos, é um êxodo para as grandes cidades e para polos onde há demanda por serviços médicos e condições de trabalho consideravelmente melhores.
Antes do programa Mais Médicos, lançado em 2013 pelo governo federal, havia cerca de 100 escolas de medicina no Brasil. Atualmente, são mais de 400 e o Conselho Federal de Medicina (CFM) tem divulgado, a partir de consultas ao MEC, que outras 292 aguardam na fila um parecer do ministério para serem criadas, somando quase 700 instituições de ensino médico no país.
Entre outras medidas, o CFM, assim como a Frente Parlamentar Mista da Medicina (FPMed), formada por deputados e senadores, apresentaram no Congresso Nacional, no ano passado, o Projeto de Lei 2.294/2024, criando o Exame de Proficiência em Medicina como forma de melhorar a qualidade da formação dos egressos de faculdade e o atendimento oferecido à população. O projeto é de autoria do senador Astronauta Marcos Pontes (PL-SP) e aguarda parecer da Comissão de Assuntos Sociais (CAS) do Senado.
O Exame de Proficiência seria uma espécie de Exame da Ordem (OAB), para os bacharelados em direito, só que na medicina. Os defensores do PL acreditam que a implantação do teste, inclusive exigido em dezenas de países, avaliaria competências profissionais e éticas, conhecimentos teóricos e habilidades clínicas com base em padrões mínimos para o exercício da profissão, reduzindo, assim, erros de diagnóstico, prescrição e conduta, muitos com danos irreversíveis aos pacientes e aos sistemas público e privado de saúde.
Fato é que abrir escolas de medicina virou uma atividade lucrativa em decorrência de incentivos fiscais, créditos tributários, redução de valores do ISS, IRPJ, parcerias público-privadas, além de ser um atrativo a mais para os municípios.
Mas nesse debate é fundamental uma profunda reflexão acerca do nível de profissional que as escolas estão formando. Sem falar em outras questões como a judicialização do ensino médico (abertura de escolas via liminar), lobbies nas negociações, contratação de não médicos tanto para aulas do ensino básico quanto do ensino clínico e substituição da anatomia (cadáveres) por robôs e peças de plástico, o que cada vez mais afasta os estudantes da prática. Ainda há muito o que se discutir.