Aos gritos, acorrentados ou com fita adesiva na boca, parlamentares tentaram transformar o Congresso Nacional em palco de chantagem institucional. O que dizem ser uma forma de resistência democrática é, na verdade, um motim orquestrado contra a democracia, em favor do ex-presidente Jair Bolsonaro, que foi derrotado nas urnas em 2022, está inelegível e cada vez mais enredado no Supremo Tribunal Federal (STF) por provas de envolvimento na tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023.
Os episódios que ocorreram no Congresso nesta semana, cujo ápice foi o sequestro simbólico das Mesas Diretoras da Câmara e do Senado, são muito graves e não têm precedentes na história republicana. Trata-se de uma inadmissível agressão à ordem constitucional, ainda mais em se tratando do principal lócus de representação popular e de diálogo político entre as partes, no qual não cabem atos de violência e imposição de vontade pela força física, próprios das ditaduras.
Nada é mais radical do que uma turba. Foi exatamente o que mostrou o comportamento dos parlamentares de oposição que tentaram impedir que os presidentes do Senado, Davi Alcolumbre, e da Câmara, Hugo Motta, exercessem o papel para o qual foram eleitos pelos próprios pares – ou seja, conduzir os trabalhos legislativos de forma democrática e produtiva. Exigiam anistia ampla, o impeachment de Alexandre de Moraes e o fim do foro privilegiado, propostas sob medida para exibir Bolsonaro de qualquer responsabilidade em relação à tentativa de golpe de Estado.
O que se viu não foi um movimento político em defesa de princípios democráticos e do respeito à Constituição. Por essa razão, a resposta dos líderes do Congresso será decisiva para o futuro da democracia brasileira. Ceder a chantagens desse tipo equivale a legitimar futuros atentados às instituições e uma nova escalada golpista, que já está sendo fomentada a partir dos Estados Unidos por um deputado licenciado da Câmara.
O ataque à democracia brasileira não se restringe às fronteiras nacionais. A The Economist expôs com lucidez as contradições da política externa de Donald Trump. Resume a revista britânica: Trump fala em soberania nacional, mas interfere diretamente na política de outro país. Fala em democracia, mas critica o STF por cumprir seu dever constitucional. Fala em proteger os americanos, mas impõe tarifas que, segundo a própria Economist, vão encarecer hambúrgueres e café nos Estados Unidos – para proteger um “amigo” que idolatra sua figura. Seu slogan “America First” serve mais como licença para arbitrariedades do que como diretriz de política externa. Trump se apresenta como isolacionista, mas age como intervencionista. Usa a retórica da liberdade a serviço da impunidade. O seu método é a incoerência. E, nesse caso, o preço será pago por produtores brasileiros e consumidores americanos.
O Brasil deve responder com firmeza aos ataques à democracia. No plano interno, os parlamentares que violaram o Regimento e sequestraram as Mesas do Congresso devem receber punição exemplar de seus líderes responsáveis, para que os fatos não se repitam. No plano externo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva precisa adotar uma política comercial pragmática e altiva, buscar aliados multilaterais e denunciar o abuso de poder que contamina a relação com os Estados Unidos, uma nação amiga há 200 anos. A democracia brasileira não pode se curvar nem a motins nem a tarifaços com segundas intenções.