editorial

Crimes da pandemia devem ser apurados

O ministro Flávio Dino acerta ao determinar investigações sobre a condução da pandemia

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A tragédia da COVID-19 no Brasil não pode ser tratada como mera fatalidade. O país registrou mais de 700 mil mortes ao longo da pandemia, segundo dados oficiais do Ministério da Saúde, tornando-se uma das nações com maior número absoluto de vítimas no mundo. Essa cifra, por si só, evidencia a gravidade da crise sanitária e o peso das escolhas políticas no agravamento do cenário.


O ministro Flávio Dino acerta ao determinar investigações sobre a condução da pandemia. As apurações não se restringem a um balanço administrativo: elas dizem respeito à responsabilização por crimes contra a saúde pública, condutas que resultaram em perdas irreparáveis. Por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), a Polícia Federal dará seguimento às investigações da CPMI da COVID, que havia indiciado várias pessoas, inclusive o ex-presidente Jair Bolsonaro, cujas atitudes deliberadamente hostis à ciência orientaram a resposta do governo federal ao coronavírus.


Entre janeiro de 2021 e o início de 2022, enquanto o Brasil acumulava centenas de milhares de novos óbitos, o governo federal sabotava medidas básicas de contenção, como o incentivo ao uso de máscaras e o distanciamento social, além de defender tratamentos ineficazes. Ao mesmo tempo, atrasava negociações para a compra de vacinas, travando o processo de imunização em um país que historicamente tem uma das estruturas de imunização mais bem estruturadas do mundo: o Programa Nacional de Imunizações (PNI).


Esse quadro ficou mais dramático diante de episódios como a crise em Manaus, quando a falta de oxigênio hospitalar levou pacientes à morte por asfixia, numa cena que simboliza a incompetência e a negligência das autoridades. A omissão governamental, somada à politização do tema, custou milhares de vidas, que poderiam ter sido salvas com uma gestão responsável e coordenada. Relatório do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) divulgado ano passado sustenta que ao menos 300 mil mortes por COVID-19 poderiam ter sido evitadas no país.


A responsabilidade, portanto, não é apenas moral, mas também jurídica. Quando um governo se torna vetor de desinformação, desestimula a vacinação e compromete a cooperação internacional para aquisição de insumos, coloca em risco não só a saúde coletiva, mas a própria integridade do sistema público de saúde. O SUS, apesar de sua resiliência, não pode enfrentar pandemias dessa magnitude sem o apoio firme das mais altas instâncias do Executivo.


Investigar e responsabilizar é, assim, um imperativo democrático. O Brasil não pode naturalizar a perda de 700 mil vidas como se fosse parte dos “danos colaterais” de uma guerra. Pelo contrário, deve reconhecer que houve escolhas políticas conscientes que ampliaram a tragédia. Até porque isso serve de alerta: o país precisa manter a sociedade e o sistema de saúde em permanente vigilância. A COVID-19 não será o último desafio sanitário global. A experiência recente deve servir como lição para reforçar a ciência, as instituições de controle, o financiamento do Sistema Único de Saúde e as políticas de equidade em saúde.

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