A proposta de reforma administrativa apresentada na Câmara, na quinta-feira, pelo deputado Pedro Paulo deve ser tratada numa perspectiva positiva e com ponderação, porque é um desafio a ser transposto pelo Congresso e pela sociedade. Para se chegar às propostas, foram necessárias sete audiências públicas e mais de 500 horas de debates técnicos, reunindo representantes de diferentes segmentos da sociedade, incluindo servidores, prefeitos, especialistas e governo federal. O resultado é uma PEC, um projeto de lei complementar e um projeto de lei, com cerca de 70 proposições.
O primeiro eixo – de estratégia, governança e gestão – estabelece a obrigatoriedade de planejamento estratégico em todos os níveis da Federação, com prazos claros e metas definidas. Trata-se de um avanço fundamental: obrigar governos a apresentarem um plano de resultados em até 180 dias de mandato reduz o improviso e fortalece a prestação de contas à sociedade. É uma forma de institucionalizar a responsabilidade e dar continuidade a políticas públicas.
A transformação digital é o segundo eixo, que busca reduzir a defasagem entre os setores público e privado. A digitalização plena de serviços e processos não apenas moderniza a máquina pública, mas também aumenta a transparência e a eficiência no atendimento ao cidadão. Ingressamos na era da inteligência artificial, as transformações tecnológicas e as novas formas de produção e de trabalho colocam em xeque o status quo institucional, que alimenta os extremismos; exigem, portanto, um Estado capaz de responder rapidamente às demandas sociais.
Voltado para a profissionalização do serviço público, o terceiro eixo é igualmente relevante. Ele propõe a adesão de estados e municípios ao Concurso Nacional Unificado (CNU), a remodelagem do estágio probatório e a criação de uma tabela remuneratória única. Essas medidas dão maior previsibilidade e racionalidade à gestão de pessoal, combatem desigualdades salariais e criam condições mais justas para a progressão na carreira. A proposta, porém, preserva a estabilidade dos servidores, reconhecendo-a como pilar do bom funcionamento do Estado.
Finalmente, a extinção dos privilégios, o quarto eixo, vai ao encontro do clamor popular. É preciso acabar com os supersalários, os “penduricalhos” e a formação de castas na burocracia estatal. Ao disciplinar verbas indenizatórias e revisar práticas que criam passivos bilionários, a reforma corrige distorções sem estimular conflitos entre Poderes. O combate a excessos no Legislativo, Judiciário e Executivo é fundamental para restaurar a credibilidade do serviço público perante a sociedade e a eficiência do Estado brasileiro.
Outro aspecto importante é o modelo de avaliação de desempenho com base no Sidec, concebido pelo Ministério da Gestão. Ele será acompanhado por órgãos de controle, como os Tribunais de Contas, para evitar perseguições ou avaliações arbitrárias. O foco em metas institucionais, e não apenas individuais, reforça a lógica de premiação por resultados coletivos, como já ocorre em experiências municipais bem-sucedidas.
Uma das principais causas da crise de democracia representativa é justamente a ineficiência do Estado, aprisionado por interesses corporativos e pela captura das políticas públicas por grandes interesses privados. No mundo em grande transformação, a corrida mundial para reinventar o Estado promove campeões e deixa à margem os retardatários. A avaliação justa de desempenho, metas institucionais, coletivas e individuais; a plena inclusão das mulheres e o combate às discriminações são questões que precisam ser contempladas. O desafio é equilibrar modernização, justiça e responsabilidade fiscal sem transformar os servidores em “bode expiatório” das mazelas do serviço público. Para isso é preciso diálogo e pactos sustentáveis.
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