Como nasceram os personagens e as crônicas de Verissimo
Entre frases curtas, personagens inesquecíveis e crônicas que transformam melancolia em riso, Verissimo, morto no último dia 30, revelou sua rotina
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Porto Alegre – Mort. Ed Mort. Ou melhor: Verissimo. Luis Fernando Verissimo. Deveria estar na plaqueta. Vai ver, alguém roubou a plaqueta. Ou os credores levaram, sei lá. Procuro o dono do escri (o tório, a outra metade do cubículo, foi sublocado para uma empresa de segurança que fechou as portas depois de sofrer o 29º assalto só em fevereiro). Ele está, como sempre, sentado na cadeira giratória, mas algo me diz que entrei na história errada: este é um es-cri-tó-rio com todas as sílabas, grande e limpo.
Procuro em vão pelas baratas. Pelo que li, são 117. Talvez, só para contrariá-lo, estejam todas numa passeata a favor do Éfe Agá (como Verissimo se referia ao então presidente da república, Fernando Henrique Cardoso). Mas as baratas neoliberais e Voltaire não voltam. E, pior, nada de entrar uma daquelas mulheres que chegam em etapas: primeiro a frente, cinco minutos depois o resto. A vida real não tem happy end, baby.
Ed Mort é um detetive particular cínico e faminto que divide o ‘escri’ com um rato albino e as 117 baratas que se reúnem num canto do cubículo para rir dele. Seu único consolo são as clientes cujas vozes, se engarrafadas, seriam vendidas como afrodisíaco. Ed Mort usa frases curtas como o cano de um 38. Luis Fernando Verissimo também. Essa é uma das raras semelhanças entre o criador monossilábico e suas criaturas que falam pelos cotovelos. Já a diferença entre eles é explícita como um bourbon paraguaio.
Ed Mort, o Analista de Bagé, os tipos esquisitos e familiares das “Comédias da vida privada”, enfim, todos os personagens de Verissimo – inclusive os de carne e osso das “Comédias da vida pública” – nos matam de rir; já na vida real, Verissimo, de tão tímido, não sabe sequer contar uma piada.
E mais: não acha graça nenhuma no circo político brasileiro (reeleição, neoliberalismo, aliança do PFL com FH, ou como prefere, Éfe Agá etc). Mas sabe como poucos tornar risível essa gente metida a séria, na coluna que publica diariamente no Correio Braziliense e outros grandes jornais do país.
“Meu primeiro impulso é de revolta. Normalmente, reajo aos fatos de forma mais depressiva do que humorística. Mas quando eu sento para escrever...”, reticencia, em entrevista ao Pensar. É da cadeira giratória do ‘escri+tório’ de sua casa, em Porto Alegre, que ele irradia para o Brasil a crônica diária da depressão que virou motivo de riso. E de reflexão.
As melhores ideias
“Minha única musa é o prazo de entrega”, avisa Verissimo. O criador não acredita em inspiração. Acredita, isso sim, em sentar-se de segunda a sábado em frente ao computador com a obrigação profissional de escrever alguma coisa engraçada e enfiá-la às pressas no fax, às vezes em cima da hora do fechamento dos jornais. “Não sei ao certo de onde vêm as ideias. Sei que elas estão guardadas em algum lugar. E chegam, quase sempre, no momento exato em que tenho que produzir”, explica.
Às vezes, no entanto, elas chegam fora de hora, numa das 16 horas do dia em que o autor passa longe do computador. Para capturar essas ideias rebeldes, ele até instituiu um bloquinho, no qual anota os lampejos fugidios. O bloquinho está cheio de anotações telegráficas e enigmáticas: “Azeite de desdém”. “Palmas dos Zumbidos”. “Noite Americana”. “McLuhan: estribo/aristocratas na guerra”.... Alguém tem ideia do que significam? Nem ele. “O problema é esse. Eu anoto as ideias, mas depois não sei mais o que elas queriam dizer”, lamenta.
Mas Verissimo acabou descobrindo no drama pessoal das ideias perdidas a ideia de escrever uma crônica sobre... ideias perdidas. Começa assim: “A escrita deve ter nascido da ideia de não esquecer. O primeiro homem que pensou ‘preciso me lembrar disso’ deve ter olhado em volta procurando alguma coisa que ele não sabia ainda o que era. Era um lápis e um pedaço de papel”.
Tudo para dizer, no fim, que não sabia o que fazer com a anotação que um belo dia rabiscara a lápis num pedaço de papel: “Conhece-te a ti mesmo mas não fique íntimo”. No fim da crônica, conclui: “As melhores ideias são as que a gente esquece”. No caso de Verissimo, as boas ideias vêm até do esquecimento.
JOGANDO COM AS PALAVRAS
Grande parte das histórias de Verissimo vêm da capacidade do autor de reverter situações adversas. Por exemplo: irritado com a insistência de Fernando Henrique em criticar os críticos que definem seu governo como neoliberal, Verissimo reagiu com a ironia fina de sempre, na crônica “Definições”, que integra a recém-lançada coletânea “Novas Comédias da Vida Pública - A Versão dos Afogados”.
Na crônica, ele diz concordar com Éfe Agá quando o presidente da República reivindica para seu governo a definição que julga mais adequada: neo-social. “Quem de nós, escritores e pseudo-escritores, ensaístas ou ficcionistas, cronistas ou romancistas, nunca sonhou em fazer a resenha da própria obra, livrando-a da incompreensão dos críticos?”, finge concordar Verissimo.
A cirurgia cardíaca sofrida em 1991, por sua vez, virou uma crônica sobre o espírito de competição dos parceiros de infortúnio, que às vezes lembra um jogo de pôquer: “Tenho três pontes de safena e uma mamária. Algo como uma trinca, mas de ases. Não faço feio em nenhuma roda de safenados e já humilhei alguns”, escreveu o autor, que mantém uma inútil bicicleta ergométrica encalhada na porta do escritório. “Tenho que fazer exercício, mas não consigo”, confessa.
Se os 61 anos - comemorados (comemorados?) em setembro - incomodam, não existe melhor remédio do que recuperar-se da “doce tragédia” desabafando numa crônica entre o humor e a melancolia. “Por motivos que não interessam, fiz aniversário ontem”, informa, antes de concluir: “Há coisas piores do que fazer 61 anos, mas ninguém consegue se lembrar de nenhuma”.
Verissimo tem também uma respeitável safra de histórias brotada da sua paixão pelas palavras. Foi assim que, em 1982, nasceu o personagem predileto. “Ed Mort surgiu de um trocadilho bobo, de tanto ouvir as pessoas dizerem: 'fulano é de morte'. A partir daí, foi só fazer uma imitação daqueles detetives dos romances policiais, como o Phillip Marlowe, do Raymond Chandler, que eu sempre gostei de ler", conta. Ed Mort deveria aparecer numa história solitária, mas tornou-se estrela de uma série de crônicas, ganhou livro, virou história-em-quadrinhos e até filme, com Paulo Betti no papel do detetive difícil de matar. Literalmente. “O Ed Mort já morreu uma duas ou três vezes, mas eu acabei ressuscitando-o. Uma vez, ele simulou a própria morte para enganar os credores, mas foi desmascarado: era o único que chorava no velório", lembra Verissimo.
O Analista de Bagé, que cura as frescuras freudianas de seus pacientes com a técnica de aplicação do “joelhaço” (adivinhem onde), também nasceu de um jogo de palavras. Primeiro, Verissimo descobriu semelhanças entre chez (casa), do francês, e tchê, do gauchês. Inventou, então, para um programa humorístico do Jô Soares, um gaúcho da fronteira grosseirão que trabalhava como garçom num restaurante francês muito chique. O personagem foi usado por Jô Soares duas ou três vezes, no início dos anos 1980, e depois esquecido. Verissimo resolveu, então, ressuscitá-lo, desta vez em forma de crônicas e agora na pele de um psicanalista nada ortodoxo. E assim nasceu o analista criado e formado em Bagé, cidade na fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai.
“Eu só fui conhecer Bagé depois da publicação do livro. A prefeitura me convidou para uma homenagem. Inauguraram placa e tudo”, lembra. Quer dizer então que os gaúchos da fronteira não se sentiram ofendidos pelo personagem? De jeito nenhum. Os psiquiatras, tampouco. “Os gaúchos da fronteira acham que é uma crítica aos psicanalistas. E os psicanalistas, que é uma gozação aos gaúchos da fronteira”, ri o autor, gaúcho da capital. Ele nunca fez psicanálise (mas leu ‘Totem e tabu’, de Sigmund Freud, aos 12 anos de idade), não toma chimarrão, não usa bombacha e montou cavalo uma única vez na vida - experiência que nem ele nem o cavalo gostam de lembrar.
A vocação e a técnica
Introvertido, Verissimo se considera "o cara mais sem graça do mundo". Até jura: "No meu caso, o humor é mais técnica que vocação". Mas sabe que é inútil convencer os leitores de que está longe de ser um humorista em tempo integral. Exemplo: amante do jazz, toca saxofone na Aqui Jazz Tancredo Band, que criou em parceria com os gêmeos cartunistas Paulo e Chico Caruso. Certa vez, em Brasília, os músicos resolveram, alguns uísques depois, entrar no palco com as luzes apagadas. Verissimo - o único que não havia bebido - errou o caminho, caiu da escada, tentou proteger o sax e quebrou o joelho. Em pânico, os irmãos Caruso informaram o acidente ao público e perguntaram se havia algum médico na plateia. “Claro que ninguém acreditou. O público morria de rir enquanto eu morria de dor”, lembra Verissimo. Mas não é só. Quem leu as “Comédias da Vida Privada”, ou acompanhou a série exibida pela Globo - e costuma achar que todo autor e sua obra são sempre carne e espelho, é bem capaz de imaginar Verissimo vivendo crises conjugais permanentes, adultérios, porres carnavalescos homéricos, divórcios e afins. Nada disso. Da mesma forma que nas ‘Comédias da Vida Pública’ ele inventa para si uma reação bem-humorada a fatos políticos que na verdade o revoltam e deprimem, Verissimo escreve sobre turbulências amorosas que desconhece - pelo menos no próprio coração.
“Lui” - como é chamado pelo grande amor da sua vida - casou-se com Lucia em 1964. O casamento dura, portanto, inexpugnáveis 33 anos. Rendeu três filhos e, até agora, para desespero de Verissimo, nenhum neto. Lucia, extrovertida, é o oposto de Verissimo. Talvez por isso os dois se encontrem a anos-luz de distância do universo das “Comédias da vida privada”, povoado por casais eternamente à beira do abismo. “Quem se casa com uma pessoa parecida, na verdade está se casando consigo próprio. É uma forma de incesto e não pode dar certo”, acredita Verissimo.
Lui e Lucia poderiam ser, no máximo, aquele casal da crônica ‘Lar Desfeito’ que vive às mil maravilhas, mas decide se separar para poupar os filhos da vergonha de terem pai e mãe ainda casados, ao contrário de todos os coleguinhas. Lúcia não tem ciúme das outras mulheres do marido, que são (não necessariamente nessa ordem): Ingrid Bergman, Rita Hayworth, Maureen O'Hara, Catherine Deneuve: Mulheres solidárias, que socorrem Verissimo sempre que ele precisa descrever uma das clientes de Ed Mort. Lucia não deve ter ciúme sequer das mulheres de carne e osso. Verissimo nunca foi de namorar muito.
“Acho que não cheguei a ter namoradas no sentido clássico”, confidencia Verissimo. “Mas uma vez, quase fiquei noivo de uma menina de programa. Ela se chamava Maria. Só que eu fui para o Rio e ela continuou em Porto Alegre. A distância invencível venceu o amor. No Rio, conheci a Lucia e nós nos casamos em março de 1964. Para não dizer que não aconteceu nada de bom no Brasil em março de 1964”, brinca. Mas, afinal, de onde vem esse profundo e desconhecido conhecimento de causa? “Sou uma pessoa introvertida, mas não enclausurada, afastada do mundo. Escrevo sobre coisas que vivi, ou que ouvi dos outros, ou que vi acontecendo. É bom ter a experiência, mas é preciso distanciamento para refletir sobre ela”, explica. Já dos porres homéricos, ele tem uma vaga lembrança. “Na juventude, gostava dos bares. Mas minha vida de playboy durou pouco e foi há muito tempo”, ressalva Verissimo, que quando sai de casa prefere os restaurantes aos bares. Mesmo assim, algumas de suas crônicas mais engraçadas têm como cenário as mesas dos botequins. “Gosto de juntar os personagens nos bares e ver o que acontece”, revela.
Às vezes, acontece que a comédia dá lugar à melancolia. Dois amigos de juventude se reencontram no bar depois de muitos e muitos anos. Relembram o passado: jogavam no mesmo time de pelada, formavam um respeitável meio-campo com um terceiro amigo, Cadarço, o melhor de todos. Um dos amigos que se reencontram é frequentador assíduo desse bar. O outro está ali pela primeira vez. Pergunta por onde anda o Cadarço, imagina que ele foi jogar num grande time, ganhou muito dinheiro e hoje vive feliz da vida. É quando o outro pede que ele olhe com mais atenção o velho garçom que anda arrastando os pés, de cabeça baixa: é Cadarço, o futuro Nilton Santos que acabou pobre e triste.
“Uma vez, encontrei um amigo dos tempos de playboy, que teve uma vida terrível. Foi pungente”, lembra Verissimo. “O que eu quis contar nessa história é que com o passar do tempo a gente perde a igualdade que tinha na infância e juventude. Quando criança, convivi com garotos de rua que eram meus heróis, jogavam bola muito bem, mas depois cresceram e perderam toda aquela aura, porque não tinham como se manter. Essa injustiça social é que me entristece”, desabafa. No final da crônica, o frequentador assíduo do bar pede ao garçom mais dois chopes e propõe ao amigo reencontrado um último brinde: A vida!. Não. A vida não, responde o outro personagem, com a concordância do autor, numa das raras ocasiões em que preferiu não transformar a dor em riso.
O TEMPO E A FALTA DE TEMPO
Verissimo passa oito horas por dia no escritório que já foi quarto de hóspedes da casa ampla onde vive, com breves intervalos, desde os seis anos de idade. Foi comprada pelo pai, o romancista Erico Verissimo, em 1942. O autor de “O tempo e o vento” só terminou de pagar o financiamento perto de morrer, em 1975. “Esta casa me dá uma ideia de solidez emocional”, afirma Luis Fernando Verissimo. O computador não passa de uma máquina de escrever glorificada, distante da criatura onipotente que transformou em coadjuvante de algumas tirinhas de “As Cobras”.
Ao lado do micro, uma coleção de canetas denuncia o prazer que só não é secreto por causa dos répteis tornados públicos pela primeira vez há 20 anos, no jornal Zero Hora. Era um sonho antigo. Desde menino, quando colecionava e copiava histórias do Batman, Fantasma e Capitão Marvel, Verissimo queria ser desenhista. Mas tinha vergonha, achava que não sabia desenhar. Até inventar As Cobras, “que são facílimas de fazer, porque só têm pescoço e olhos”. Modéstia exagerada à parte, esses perplexos observadores do país e da alma humana, que ganharam recentemente uma antologia em livro, têm uma importância especial para o autor.
“Escrever não é um prazer. Desenhar, sim. Aliás, não me considero escritor. Sou um desenhista. O único problema é que não sei desenhar direito”, insiste. Se pudesse, desenharia mais. Se pudesse, escreveria bem menos. “Eu preferia não trabalhar tanto. Mas não sei dizer não”, resigna-se.
O excesso de trabalho o afasta da paixão que alimenta desde a infância: a leitura. Verissimo ainda se define como um leitor voraz e onívoro. A verdade é que lê de tudo, mas não com a voracidade desejada. Por absoluta falta de tempo. “Há muito não leio um livro inteiro, só fragmentos”, queixa-se. No momento, tem nada menos que 78 livros (!!!) na cabeceira da cama (da nova edição, corrigida, de “The Great Gatsby”, de F. Scott Fitzgerald, a “Visão do Paraíso”, de Sergio Buarque de Holanda) esperando a hora de serem lidos. Em pouco tempo não restará cabeceira: Verissimo não consegue passar na porta de uma livraria sem entrar; e se entra, compra. “Acho perfeitamente possível botar minha leitura em dia. Basta viver até os 120 anos”, calcula. E que leitor não gostaria de estar vivo para ler a crônica que Luis Fernando Verissimo escreverá no docemente trágico dia do 120º aniversário?
• Texto publicado originalmente em 9 de novembro de 1997 pela série “A arte de escrever”, no caderno Pensar, do Correio Braziliense, dos Diários Associados
COMO NASCE UM LIVRO
ORIGEM DAS HISTÓRIAS
“Não acredito em inspiração. As ideias ficam guardadas em algum lugar e quando eu preciso, elas vêm. Mas nada a ver com uma coisa misteriosa chamada inspiração. Tenho a obrigação de produzir e produzo. Escrevo sobre o que vivi, ou me contaram, ou vi acontecerem, ou li. Algumas vezes, retomo ideias que tive há muito tempo, de crônicas já publicadas. Como diz o Fernando Sabino: depois de cinco anos, tudo fica inédito de novo.”
DESENVOLVIMENTO DA NARRATIVA
“Geralmente, escrevo a história numa sentada só. Algumas vezes tenho a ideia precisa do que quero. Outras, começo sem saber como vou terminar. Geralmente o começo é difícil. O meio, depois que a gente decidiu para onde quer ir, é fácil, e o fim, o arremate final, demora. Tem dia que é mais fácil, você está mais disponível: depende de ter dormido bem, de não ter muita preocupação. A sensação, lendo o texto publicado, de que não era bem aquilo que a gente queria dizer, é constante. Melhor não ler o texto publicado."
CRIAÇÃO DOS PERSONAGENS
“O Analista de Bagé, por exemplo, nasceu de um jogo de palavras e do contraste entre indivíduo e meio. Já a Velhinha de Taubaté foi criada no governo Figueiredo, quando o Delfim Netto garantiu que o Brasil não iria ao FMI. E o Brasil foi ao FMI. A Velhinha, então, era a última pessoa a acreditar no governo. Hoje ela não teria mais sentido de existir. Touco mundo acredita nesse governo.”
ROTINA E COTIDIANO
“Acordo muito cedo, lá pelas 6h, 7h, e fico na cama lendo os jornais até as 8h. Tomo um café com uma fatia de torrada, para engolir os comprimidos do coração. Começo a trabalhar às 9h, paro para almoçar às 12h30, durmo sentado diante da televisão, vendo o Jornal Hoje. Recomeço à tarde e vou das 14h à 17h30. A verdade é que eu trabalho demais, não consigo dizer 'não' ao que me pedem. Escrever não é prazeroso. Mas é sempre melhor do que quebrar pedra na rua.”
Trecho
(comentado pelo autor)
ED MORT VAI FUNDO
“As baratas tinham me encurralado num canto e preparavam o ataque final quando a porta se abriu. Dizer que era uma mulher é fazer uma injustiça. Era um estágio superior, o que vem depois da mulher. Fantástica: As baratas se dispersaram. Ela perguntou se estava interrompendo alguma coisa.
- Só o meu ritmo cardíaco, respondi.
Ela sorriu. Compreendi, finalmente, o que Deus estava pensando quando criou os dentes. Convidei-a a sentar-se. Meus móveis eram escandinavos. Caixotes de bacalhau norueguês. Ela vestia calças tão apertadas que daria para ver as imperfeições de sua pele, se houvesse alguma. Começou a falar.
Eu...
Meu assunto favorito - interrompi.(...)
Mort. Ed Mort. Está na plaqueta.”
(“Ed Mort: Todas as Histórias”, pág. 32)
Fala, Verissimo
“As frases curtas e o estilo pseudoduro são da paródia aos detetives de romances policiais como
os de Raymond Chandler. Já a referência às baratas e aos móveis de caixote situam nosso detetive ‘americano’ no Terceiro Mundo.”