No próximo sábado (16/8), durante a convenção nacional do Partido Novo, Romeu Zema lançará oficialmente sua pré-candidatura à Presidência da República. Em São Paulo, o mineiro de Araxá tentará fazer sua força local se valer nacionalmente. Embora possa soar natural que o governador do segundo maior colégio eleitoral do Brasil se aventure em direção ao comando do nacional, o movimento pretendido pelo atual chefe do Executivo Mineiro é inédito nas últimas sete décadas.
A última vez que um governador mineiro deixou o posto para concorrer à Presidência da República aconteceu em 1955, quando Juscelino Kubitschek fez a ponte entre o Palácio da Liberdade e o Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, então capital federal. Passados 71 anos, nenhuma das duas antigas sedes sequer abriga o poder, que, em Minas, migrou para a Cidade Administrativa e, no Brasil, foi para Brasília, construída no governo do próprio JK.
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Neste longo ínterim, dois governadores mineiros da mesma família buscaram o Palácio do Planalto, mas há ressalvas importantes nas duas trajetórias. Em 1984, o então chefe do Executivo de Minas Gerais, Tancredo Neves (à época no MDB), aceitou se licenciar do cargo para concorrer à Presidência da República.
Tancredo venceu eleição indireta
Tancredo foi bem sucedido em sua empreitada, foi eleito em janeiro de 1985, mas teve complicações relacionadas a uma diverticulite e faleceu sem tomar posse. A ressalva neste caso é que a eleição em questão não foi direta. No âmbito da redemocratização após 21 anos de ditadura militar, a participação no pleito ficou restrita a um colégio eleitoral formado pelos integrantes do Congresso Nacional e por delegados eleitos nas assembleias legislativas dos estados.
Quase duas décadas depois, o neto de Tancredo concorreu à Presidência da República. Em 2014, Aécio Neves (PSDB) se lançou na disputa pelo Palácio do Planalto com dois mandatos governando Minas na bagagem. No entanto, ele não passou direto do Executivo Estadual para a campanha presidencial. Entre 2010 e 2014, o tucano foi senador.
Ao contrário do ocorrido com o avô, a tentativa de Aécio se eleger presidente foi frustrada. No primeiro turno, ele foi o segundo mais votado, com 33,55% dos votos válidos, e se credenciou para a disputa de segundo turno contra a então presidente Dilma Rousseff (PT). Na segunda votação, a petista venceu com 51,64% dos votos válidos na eleição mais apertada da história até então.
A campanha anterior
A pré-campanha não garante que Zema estará mesmo entre os nomes disponíveis para o eleitor brasileiro em 2026. Muita negociação pode ocorrer até o início oficial da campanha, em agosto. Uma coisa, no entanto, é certa: se o governador mineiro entrar definitivamente na disputa, encontrará desafios de campanha muito distintos dos enfrentados por seu antecessor em 1955.
A campanha presidencial de JK se deu em um momento importante da democracia brasileira. A chegada de Getúlio Vargas ao poder em 1930 encerrou um período de poder das oligarquias da chamada ‘República Velha’. A permanência do caudilho gaúcho na presidência até 1945 o tornou uma figura irremediável na política nacional. Ele fez seu sucessor em Eurico Gaspar Dutra, voltou ao poder em 1950 e suicidou-se em 1954.
JK disputou, então, uma das primeiras eleições em que a campanha dos candidatos foi tratada como um fator realmente relevante para o resultado das urnas. Ainda que carregasse a tocha do varguismo, o mineiro trabalhou de forma intensa para tornar seu legado como prefeito de Belo Horizonte, deputado federal e governador conhecidos por todo o país e se notabilizou por colocar o pé na estrada, como afirma o doutor em história e pesquisador do Projeto República da UFMG, Bruno Viveiros.
“Ele vai para o corpo a corpo, sabia exatamente o que falar para os eleitores e como falar e apresenta um perfil de ruptura com a ideia do político mineiro, até então tratado como alguém extremamente conciliador e em cima do muro. JK em campanha era arrojado, apresentava uma ideia e estuda muito a questão do marketing político”, comenta.
Comício de Juscelino Kubitschek no Rio de Janeiro
“Energia e transporte”
Viveiros recorda que Juscelino utilizou em sua campanha presidencial a ideia do binômio ‘energia e transporte’ que guiou seu governo em Minas para se associar ao desenvolvimentismo de Vargas. Neste ponto, a situação de Zema difere bastante da de JK, já que ele precisará apresentar ao seu eleitor um legado de oposição à ideia do governo vigente, já que ele se posiciona como um ferrenho crítico de Luiz Inácio Lula da Silva e do PT em geral.
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“O governo de JK em Minas entre 1950 e 1955 vai ser lembrado pelo binômio ‘energia e transporte’ e ele vai ser conhecido como o ‘governador a jato’. Essa é outra construção de imagem muito eficaz. Além disso, ele visitou, só em 1954, mais de 360 municípios. Ele governou praticamente dentro de um pequeno avião em que ele viajava de cidade para cidade. Ele ficou tanto tempo viajando que existe uma anedota política que diz que toda família tem algum parente que tirou uma foto com o JK”, brinca o historiador.