Embora Minas Gerais tenha formalizado sua adesão ao Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag), o caminho até garantir os recursos prometidos para o abatimento da dívida bilionária com a União ainda tem vários degraus pela frente e boa parte deles passa pela Assembleia Legislativa (ALMG). O ofício enviado na semana passada pelo governo de Romeu Zema (Novo) à Secretaria do Tesouro Nacional estima em R$ 96 bilhões o valor dos ativos mineiros aptos a integrar o programa, mas cerca de metade desse montante depende de autorizações legislativas ou de operações que ainda geram controvérsias políticas.
Entre as fontes de recursos listadas estão participações acionárias na Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), a federalização de estatais como a Minas Gerais Participações (MGI) e a Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemge). Mas a formatação final do pacote ainda está longe de ser unânime. Até agora, somente o estado de Goiás conseguiu concluir a adesão ao Propag.
A principal incerteza gira em torno da Cemig. O governo mineiro quer usar parte das ações da companhia, avaliadas em R$ 13,5 bilhões, para compor o fundo de abatimento da dívida, estimada em R$ 181 bilhões. No entanto, para que isso aconteça, é necessário aprovar uma nova Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que autorize a venda sem a exigência de referendo popular.
A Constituição mineira exige consulta à população para qualquer processo de desestatização, regra criada na gestão de Itamar Franco, em reação às privatizações dos anos 1990. Na semana passada, a Assembleia aprovou a PEC 24/2025, que derruba a exigência apenas para a Copasa e sua subsidiária, Copanor, responsável pelo abastecimento no Norte e Nordeste de Minas, restringindo o alcance da proposta original do governo, que incluía também a Cemig e a Gasmig.
Outra peça importante é a Minas Gerais Participações (MGI), cuja federalização foi aprovada em primeiro turno no início de outubro, mas ainda precisa ser confirmada em segunda votação. O texto impede a transferência de controle para entes privados, mas não assegura estabilidade aos servidores, ponto que a oposição tentou incluir por meio de emendas rejeitadas. A proposta ainda precisa ser distribuída novamente às comissões antes de retornar ao plenário. Só depois de sancionada a lei o governo poderá usar o ativo como parte do abatimento da dívida no Propag.
No caso da Codemge, a situação é mais adiantada, já que a federalização da estatal foi aprovada e sancionada. Avaliada em R$ 4,59 bilhões, a companhia reúne ativos estratégicos, entre eles a participação de 5% na Companhia de Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais (Codemig), empresa na qual o Estado detém os outros 95%, após alteração societária formalizada na última terça-feira (4/11).
A Codemig, considerada um dos ativos mais valiosos do portfólio mineiro e vista como peça central na adesão ao Propag, acabou ficando fora da lista enviada à União. A mudança na estrutura societária reduziu a participação da Codemge na Codemig. Dessa forma, o cálculo encaminhado pelo governo federal leva em conta apenas os 5% restantes da participação acionária como parte do valor estimado da estatal.
O Executivo mineiro, contudo, sinalizou que pode aumentar novamente a fatia da Codemge na Codemig, caso seja necessário para atingir o limite de abatimento de 20% do saldo devedor previsto pelo programa. Em ofício ao Tesouro Nacional, o governo informou que, se a Codemge passar a controlar 100% da Codemig, o valor de mercado da companhia poderia alcançar R$ 36,59 bilhões.
Imóveis
Ainda em discussão na ALMG, a lista de bens públicos apresentada por Zema também não entrou na conta. O Projeto de Lei 3.733/2025, que autoriza a transferência de mais de 200 imóveis à União, avança na Assembleia agora sem uma indicação de como os recursos serão utilizados. O texto permite que os bens sejam vendidos diretamente, caso o governo federal não queira incorporá-los ao seu patrimônio.
A proposta sofreu diversas alterações ao longo da tramitação. O relator, deputado Zé Guilherme (PP), reduziu ainda mais o número de imóveis passíveis de alienação, em seu parecer apresentado na última semana, sob o argumento de preservar patrimônios com valor simbólico e histórico, como o Palácio das Artes e a Cidade Administrativa, sede do governo. A lista inicial previa 359 imóveis.
Copasa
Um dos pontos que mais chamaram atenção foi a ausência da Copasa na lista de ativos enviados ao governo federal. Mesmo após a aprovação da PEC que permite sua privatização sem referendo, o governo mineiro decidiu destinar os valores arrecadados com a venda das ações a outro objetivo: cumprir as contrapartidas exigidas pelo Propag, e não reduzir diretamente o saldo da dívida.
Pelas regras do programa, os estados precisam aplicar entre 0,5% e 2% do saldo devedor em políticas públicas. Minas planeja destinar 1% ao Fundo de Equalização Federativa (FEF) e mais 1% a investimentos internos em áreas como saúde, educação, segurança e infraestrutura, o que representa cerca de R$ 3,8 bilhões por ano.
O governo defende essa estratégia para que o estado tenha condições de realizar os investimentos necessários à modernização do saneamento e ao cumprimento das metas do Marco Legal do setor, que estabelece prazos para a universalização do abastecimento e do esgotamento sanitário. “Não há recursos suficientes para cumprir todas as metas sem usar o produto da venda da Copasa”, defende a equipe econômica do estado, em nota.
O QUE FALTA APROVAR NA ALMG
• Fim da exigência de consulta popular para vender a Cemig
• Federalização da MGI Participações (Aprovada em 1º turno, falta o 2º turno)
• Proposta que permite a alienação de mais de 200 imóveis pertencentes ao estado
