Muitos canadenses estão irados com Trump. Primeiro, houve ameaças de que o Canadá se tornaria o 51º Estado dos EUA. Depois veio o anúncio de que ele imporia tarifas sobre produtos canadenses. E mais recentemente, a notícia de que uma mulher canadense foi detida por duas semanas nos EUA e submetida a "tratamento desumano" pelo ICE (Serviço de Imigração e Alfândega dos EUA).

Esses acontecimentos não apenas deterioraram o relacionamento entre os dois países — uma aliança estável de mais de oito décadas —, como também desencadearam um grande movimento de cidadãos defendendo um "boicote" aos EUA.

E uma das maneiras de fazer isso é parando de viajar para seu vizinho do Sul.

A agência Statistics Canada registrou uma queda de 23% nas viagens de carro de residentes canadenses para os EUA em fevereiro de 2025, em comparação ao mesmo mês do ano anterior. Além disso, as viagens aéreas caíram 13%.

A jornalista canadense Kate Dingwall está entre os canadenses que cancelaram suas viagens aos EUA.

"Meu parceiro e eu decidimos não prosseguir com nossas férias planejadas para os EUA este ano", disse ela.

"Estou preocupada com a fronteira e por ficar presa lá por algum motivo, especialmente com Trump sendo tão exigente com o Canadá. Há uma sensação de desconforto em visitar os EUA agora", ela acrescentou.

Keith Serry, um escritor e comediante de Montreal, cancelou cinco shows em abril em Nova York devido à situação política.

Ontario Science Centre (1969) – Museu interativo focado em ciência e tecnologia, ideal para todas as idades. Possui experimentos práticos, planetário e exposições sobre o corpo humano e o espaço. É um dos principais centros educacionais do país. Divulgação
Hockey Hall of Fame (1943) – Museu dedicado ao hóquei, esporte nacional do Canadá. Exibe troféus, equipamentos históricos e homenageia grandes jogadores. Tem interatividades, incluindo um simulador onde visitantes podem testar habilidades. Evan Delshaw, Ian Muttoo e :RasputinAXP/Wikimédia Commons
Nathan Phillips Square (1965) – Praça central da cidade, onde fica o letreiro "Toronto" famoso. Abriga o prédio da prefeitura e eventos culturais ao longo do ano. No inverno, sua pista de patinação ao ar livre se torna uma grande atração. Reprodução do Instagram @nathanphillipssquare
High Park (1876) – Maior parque de Toronto, combina áreas verdes, lagos e trilhas. Na primavera, atrai milhares de visitantes por suas cerejeiras em flor. Conta com jardins, um pequeno zoológico e espaços para esportes. Reprodução do X @norm
St. Lawrence Market (1803) – Mercado histórico, famoso por sua variedade gastronômica e produtos locais. Tem bancas que vendem queijos, frutos do mar, carnes e especiarias. Eleito um dos melhores mercados do mundo pela National Geographic. Reprodução de Instagram @stlawrencemarket
Ripley’s Aquarium of Canada (2013) – Um dos maiores aquários do Canadá, com mais de 16 mil animais marinhos. Possui um túnel subaquático com tubarões nadando acima dos visitantes. Exibe arraias, águas-vivas e espécies exóticas do mundo todo. Reprodução do Instagarm @ripleysaquaca
Distillery District (2003, revitalização) – Antiga área industrial transformada em espaço cultural e gastronômico. Tem ruas de paralelepípedos, galerias de arte, lojas e bares. No inverno, abriga um dos mercados de Natal mais famosos do Canadá. Canmenwalker e Gatorfan252525/Wikimédia Commons
Casa Loma (1914) – Castelo histórico construído no estilo europeu, oferece uma viagem ao passado. Conta com móveis de época, jardins exuberantes e passagens secretas. É um dos cenários mais usados em filmes e séries. Larry Koester/Wikimédia Commons
Royal Ontario Museum (1914) – Maior museu do Canadá, combina arquitetura moderna e clássica. Possui coleções sobre história natural, arte e cultura mundial. Exibe fósseis de dinossauros, artefatos egípcios e exposições sobre civilizações antigas. Raysonho/Wikimédia Commons
Torre CN (1976) – Um dos cartões-postais de Toronto, tem 553 metros de altura. Seu observatório oferece vistas panorâmicas incríveis da cidade e do Lago Ontário. Também abriga o EdgeWalk, onde visitantes podem caminhar na borda externa da torre. Wladyslaw, Canmenwalker e shankar s/Wikimédia Commons
Toronto recebe cerca de 27,5 milhões de turistas por ano, sendo uma das cidades mais visitadas da América do Norte. Seu turismo é impulsionado por atrações icônicas, diversidade cultural, grandes eventos e a proximidade das Cataratas do Niágara. Veja alguns atrativos. Saffron Blaze/Wikimédia Commons
Os moradores de Toronto valorizam diversidade cultural, vida urbana ativa e esportes como hóquei e basquete. Há também um grande apreço por cafés, festivais e atividades ao ar livre, especialmente no verão. Shaheen Karolia/Wikimédia Commons
Toronto tem um governo municipal liderado por um prefeito e um conselho da cidade. Como parte do Canadá, segue o sistema parlamentarista e está dentro da província de Ontário. Taxiarchos228 ?Wikimédia Commons
Toronto é classificada entre as cidades com melhor qualidade de vida do mundo. Oferece infraestrutura moderna, sistema de saúde eficiente, transporte público bem desenvolvido e segurança relativa. Montagem com imagens Freepik
Toronto é classificada entre as cidades com melhor qualidade de vida do mundo. Oferece infraestrutura moderna, sistema de saúde eficiente, transporte público bem desenvolvido e segurança relativa. Divulgação
A cidade possui cerca de 2,9 milhões de habitantes, sendo a cidade mais populosa do Canadá. Sua diversidade cultural é marcante, com mais de 200 etnias e cerca de metade da população nascida fora do país. Reprodução do X @6ixbuzztv
Toronto tem 630 km², sendo a maior cidade do Canadá em extensão urbana. Seu crescimento ocorreu rapidamente ao longo do século XX, tornando-se um dos principais centros metropolitanos da América do Norte. Google Maps
Além disso, sua economia é diversificada, com setores como tecnologia, cinema, saúde e indústria prosperando constantemente. Allen McGrego, Maksim Sokolov, Jeff Hitchcock e John/Wikimédia Commons
A cidade mais forte economicamente do Canadá é Toronto, pois é o maior centro financeiro e comercial do país. Abriga a Bolsa de Valores de Toronto (TSX), grandes bancos e empresas multinacionais. SkiEngineer?Wikimédia Commons

"A verdade é que não me sinto seguro viajando para os EUA agora. Além disso, tenho uma forte aversão a gastar meu dinheiro de qualquer forma que possa ajudar a economia de um país hostil", ele escreveu em sua página do Facebook.

Muitos também optaram por substituir os produtos americanos que costumavam comprar por produtos canadenses, como mostram centenas de postagens nas redes sociais com a hashtag #BuyCanadian.

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A cada ano, os EUA recebem mais visitas de moradores do Canadá do que de qualquer outro país

Turismo interno

A decisão de viajantes como Dingwall e Serry está alinhada à mensagem dada pelo ex-primeiro-ministro Justin Trudeau em resposta ao anúncio de Donald Trump de que imporia tarifas de 25% sobre produtos canadenses.

"Os canadenses estão magoados. Os canadenses estão bravos. Vamos escolher não tirar férias na Flórida ou em Old Orchard Beach, no Maine", disse Trudeau.

"Agora é a hora de escolher o Canadá. Isso pode significar mudar seus planos de férias de verão para ficar aqui", disse ele em outra declaração.

Em 2024, o Departamento de Viagens e Turismo dos EUA registrou 20,2 milhões de visitas de residentes canadenses.

Embora seja muito cedo para saber quanto esse número diminuirá como resultado do atual sentimento antiamericano, especialistas preveem um impacto econômico significativo.

A Travel Association, organização que representa o setor de turismo dos EUA, alerta que uma redução de 10% no número de viajantes canadenses significaria mais de US$ 2 bilhões perdidos anualmente nos EUA e 14 mil empregos perdidos.

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Várias províncias canadenses retiraram bebidas alcoólicas americanas de suas prateleiras

As medidas e mensagens de Trump

Donald Trump se referiu ao Canadá como "o 51º Estado" pela primeira vez em dezembro de 2024, um mês antes de sua posse.

O que inicialmente parecia uma piada se transformou em uma séria ameaça quando ele declarou que planejava usar sua "força econômica" para anexar o Canadá, uma mensagem que naturalmente provocou rejeição dos canadenses.

Dias depois, foram anunciadas tarifas.

"O que ele quer é ver um colapso total da economia canadense, porque isso tornará mais fácil para ele nos anexar", disse Trudeau na época.

Recentemente, o novo primeiro-ministro do Canadá, Mark Carney, elevou o tom da discussão, dizendo que o relacionamento histórico de seu país com os EUA, baseado na cooperação econômica e militar, "acabou".

Somando-se às tarifas e à ameaça de anexação está o caso da atriz canadense Jasmine Mooney, que disse ter sido detida e "algemada" pelo Serviço de Imigração e Alfândega por 12 dias.

Seu testemunho deixou muitos canadenses com medo de viajar.

Ryan Northcott, um canadense que diz ter cancelado sua viagem para Nova York, afirmou em um vídeo no TikTok: "Eu vi o que aconteceu com Jasmine Mooney e vi vídeos de quando você vai para a fronteira, eles verificam tudo [...] Há algo que simplesmente não parece certo para mim, sem mencionar como o Canadá está sendo tratado."

Além disso, uma ordem de Trump que afeta diretamente os viajantes canadenses também gerou reação negativa.

Como parte de seus planos para "proteger o povo americano da invasão", o governo dos EUA começou a exigir que viajantes canadenses que entram no país por terra se apresentem às autoridades após completar 30 dias no país.

Anteriormente, os canadenses podiam entrar sem registro e permanecer por até seis meses sem visto.

Agora, o próprio governo canadense indica em seu último aviso aos viajantes que "o não cumprimento do requisito de registro pode resultar em penalidades, multas e processos por contravenções".

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"Nunca 51º estado", dizia um cartaz em uma manifestação em Ottawa

'Snowbirds'

Os mais afetados por essa medida foram os snowbirds, apelido dado aos canadenses, muitos deles aposentados, que viajam todos os anos durante o inverno para destinos mais quentes, como Flórida ou Arizona, geralmente por mais de 30 dias.

De acordo com a Associação Canadense de Snowbirds, esse número é superior a um milhão.

Em um grupo do Facebook para canadenses que viajam para o exterior, a irritação com Donald Trump está por toda parte.

"Não há como nós, canadenses, continuarmos a nos aglomerar nos EUA durante o inverno", dizia uma postagem.

"Sou canadense e não suporto Trump. Eu não culparia nenhum compatriota canadense por não querer viajar ou tirar férias nos EUA", disse outro.

Stephen Fine, presidente da Snowbird Advisor, uma empresa dedicada a fornecer informações e serviços para migrantes sazonais canadenses, disse à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) que, como as relações entre os dois países se deterioraram com o fim do inverno, não é segredo que menos canadenses estão indo para os EUA.

No entanto, "em geral, há um sentimento negativo entre os canadenses que viajam para o inverno, e alguns dizem que não têm intenção de retornar aos EUA no ano que vem", diz Fine.

Os professores Valorie Crooks e Jeremy Snyder, que estudaram o fenômeno dos migrantes sazonais do Canadá para os EUA, argumentam que "acessibilidade e facilidade de movimento são dois fatores importantes que permitem viagens sazonais de longo prazo".

"Portanto, não é de se surpreender que estejamos ouvindo falar dos 'snowbirds' novamente em vista dos eventos recentes", acrescentam.

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Centenas de milhares de canadenses viajam durante o inverno do norte para Estados americanos como Flórida e Arizona

Efeito econômico

A Tourism Economics, empresa especializada em previsões do setor de turismo, passou de uma previsão de crescimento de 8,8% nas viagens aos EUA em 2025 para um declínio de 5,1% até 2024.

A empresa observou que a mudança se deve à "tensão nas relações diplomáticas" e às "tarifas excessivas".

Para as companhias aéreas, o impacto da situação atual no relacionamento Canadá-EUA já parece ser significativo.

De acordo com Mike Vernot, porta-voz da empresa de análise de dados de aviação Cirium, "as companhias aéreas reduziram o número de assentos em voos entre o Canadá e os EUA em aproximadamente 4,4% em abril, maio e junho, em comparação com suas programações publicadas em 31 de janeiro".

Alguns destinos nos EUA serão particularmente afetados, de acordo com dados da Cirium. Em 31 de janeiro, 2.024 voos estavam programados do Canadá para os aeroportos de Fort Lauderdale e Miami para abril, maio e junho de 2025. Em 25 de março, esse número caiu para 1.799.

Além disso, a Flair Airlines, uma companhia aérea canadense de baixo custo, não operará mais sua rota Toronto-Nashville. E a WestJet, que havia anunciado que abriria um voo de Calgary para o Aeroporto LaGuardia, em Nova York, confirmou recentemente que não o fará mais.

E não é porque os canadenses estão parando de viajar para o exterior. Eles estão apenas viajando menos para os EUA.

"Recebemos perguntas de pessoas procurando destinos alternativos para o ano que vem. Os mais populares são México, Espanha, Portugal e Caribe", disse Stephen Fine, da Snowbird Advisor.

Diarmaid O'Sullivan, diretora de vendas e marketing de um hotel nas Bermudas, descreveu um aumento incomum de clientes canadenses interessados ??em realocar eventos que haviam planejado inicialmente nos EUA.

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A WestJet, segunda maior companhia aérea do Canadá, já ajustou sua oferta de voos para refletir as tendências de mudança da demanda

Curiosamente, tudo isso está acontecendo no momento em que os EUA vivenciavam um crescimento recorde no setor de viagens e turismo.

De acordo com um relatório do Conselho Mundial de Viagens e Turismo, a indústria do turismo dos EUA movimentou US$ 2,26 trilhões, o maior valor do mundo.

"Esses números nos ajudam a entender a importância do setor nos EUA e demonstram que um declínio no turismo dos principais países de origem pode prejudicar significativamente a economia dos EUA", disse Marta Soligo, professora da Universidade de Nevada, em Las Vegas.

"As consequências desses problemas podem afetar tanto grandes corporações sediadas nos EUA quanto pequenas empresas", acrescentou.

O boicote canadense também acendeu alarmes no setor imobiliário, já que os canadenses são os maiores compradores estrangeiros de imóveis nos EUA, de acordo com a Associação Nacional de Corretores de Imóveis.

Amar Charles Marouf, um cidadão canadense, resume o boicote como uma questão de valores: "Somos um país que se orgulha, imperfeitamente, mas intencionalmente, de valores como inclusão, equidade e direitos humanos. Quando esses valores parecem fora de sintonia com o que está acontecendo do outro lado da fronteira, fica mais difícil justificar nossa participação lá."

O Canadá não é o único país que vê as medidas do governo Donald Trump com desconfiança.

Desde 20 de janeiro, França, Dinamarca, Alemanha, Finlândia e Reino Unido também emitiram alertas para seus cidadãos que planejam viajar para os EUA.

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