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Estado de Minas COLUNA HIT

Mineiros enfrentaram a censura para cantar 'Viva Zap�tria' em festival

Murilo Antunes relembra, na se��o 'Qual � a m�sica?', o esdr�xulo interrogat�rio na Pol�cia Federal, em 1972, para que a can��o dele e de Sirlan fosse liberada


19/09/2021 04:00 - atualizado 12/12/2024 22:59
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Murilo Antunes*
Compositor e poeta

Ilustração mostra bota militar pisando no chão e sufocando notas musicais
“Por que existo, Senhor, quando n�o posso cantar?”. Este clamor � da poeta Jacinta Passos, falecida em 1973, que ilustra bem o per�odo que viv�amos no Brasil. A ditadura militar mandava e desmandava, pisando na Constitui��o com suas botas soturnas e impedindo a popula��o de expressar sua indigna��o e revolta.

A censura ceifou a vida de muitos artistas, calou vates e humilhou a n�s todos, j� que t�nhamos de submeter nossas cria��es a julgamentos de quem desprezava a cultura e as artes.

Meu primeiro parceiro, Sirlan, foi v�tima dessa atrocidade. O ano era 1972, a nossa parceria, “Viva Zap�tria”, concorreu ao 7º Festival Internacional da Can��o (FIC), tendo sido aclamada e uma das finalistas daquele evento transmitido ao vivo para todo o pa�s. Mas, para concorrer, fomos obrigados a ir ao Rio e a nos submeter a um longo interrogat�rio, na sede da Pol�cia Federal. Perguntas esdr�xulas, prim�rias, de censores importados de outras reparti��es federais, que n�o sabiam nada de arte, os pr�prios capachos dos generais.

A partir dali, come�ou nossa batalha para liberar nossas m�sicas. A gravadora Som Livre ofereceu um contrato de grava��o ao meu parceiro, mas t�nhamos de conseguir previamente o carimbo de APROVADA em nossas letras.

Os parceiros do Sirlan �ramos eu e Fernando Brant. Envi�vamos nossas letras para a Censura e, a cada remessa de 8 a 10 letras, uma ou duas voltavam liberadas. O que fizemos? Trocamos as parcerias: eu letrava as melodias que o Fernando j� havia feito e vice-versa.

O tempo passava. O calor do festival arrefecia. A oportunidade de Sirlan se lan�ar no mundo da m�sica foi se esvaindo. Tanto que, s� quatro anos depois, ter�amos 10 m�sicas liberadas para que ele lan�asse seu primeiro elep�.

Frustra��o, decep��o, inj�ria e des�nimo tomaram conta daquele promissor compositor brasileiro que teve sua vida art�stica ceifada na raiz. Assim como inumer�veis artistas, jornalistas, escritores, cientistas, soci�logos, historiadores, antrop�logos, juristas, religiosos, ativistas e pol�ticos progressistas tiveram carreiras interrompidas pelas m�os pesadas da ditadura.

O ex�lio, a pris�o, a tortura ou a morte foi a recompensa que deram a tantos s�bios brasileiros, construtores e defensores da democracia.

"Quando vejo manifesta��es recentes pedindo o retorno da ditadura, me pergunto: o que querem esses pusil�nimes e seus seguidores?"


� isso que queremos que aconte�a novamente? Quando vejo manifesta��es recentes pedindo o retorno da ditadura, me pergunto: o que querem esses pusil�nimes e seus seguidores? Como parar a sanha desses retr�grados apologistas da viol�ncia e do emburrecimento do pa�s?

S� a indigna��o n�o basta, sabemos disso. H� de haver alguma forma de barrarmos a insanidade dos atuais d�spotas que zombam da nossa intelig�ncia e cultivam interesses de grupos de poder ao massacrar o sonho de um pa�s que andava a passos largos para certa igualdade social.

Deixo aqui a lembran�a dos versos de Paulo C�sar Pinheiro, cultivados naqueles tempos turvos para levar esperan�a e for�a a todos n�s. “Voc� corta um verso/ Eu escrevo outro/ Voc� me prende vivo, eu escapo morto/ De repente, olha eu de novo/ Perturbando a paz, exigindo troco.”

E outros versos extra�dos da sabedoria popular, os quais inserimos, eu e Tavinho Moura, em uma das nossas can��es bem-sucedidas: “Meu fac�o guarani quebrou na ponta, quebrou no meio/ eu falei pra morena que o trem t� feio.”

*A Coluna Hit publica aos domingos a se��o 'Qual � a M�sica?'. A cada semana, um convidado escreve sobre can��es marcantes lan�adas durante a ditadura militar e a rela��o delas com o Brasil contempor�neo.

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