
O presidente Jair Bolsonaro est� em vias de transformar um lim�o em limonada, com a nomea��o da atriz Regina Duarte para o cargo de secret�ria da Cultura, no lugar do neonazista enrustido Ricardo Alvim. Ontem, o Pal�cio do Planalto confirmou que a protagonista da s�rie Malu Mulher e das novelas Minha doce namorada, na qual era a jovem Patr�cia, e Roque Santeiro, na qual interpretou a Vi�va Porcina, entre outros pap�is de destaque, vir� a Bras�lia amanh� para conhecer a Secretaria Especial da Cultura. Foi convidada por Bolsonaro para assumir o �rg�o. Os dois tiveram uma reuni�o no Rio de Janeiro na qual foi convidada. Depois da conversa, ela escreveu que est� "noivando" com o governo.
Bolsonaro resumiu os entendimentos no Twitter: “Tivemos uma excelente conversa sobre o futuro da cultura no Brasil. Iniciamos um 'noivado' que possivelmente trar� frutos ao pa�s", escreveu o presidente. “Conservadora assumida, antipetista de primera hora, Regina Duarte participou das campanhas das Diretas, j�!, de Tancredo Neves (1985) e Jos� Serra (2002). Reconhecidamente, � uma grande atriz e tem o respeito da maioria de seus colegas, mas nunca teve unanimidade. Agora, sofrer� uma campanha de feroz oposi��o, porque assume o cargo em circunst�ncias muito desfavor�veis, uma vez que seu antecessor desnudou um projeto reacion�rio de cultura, cuja inspira��o estava na m�quina de propaganda nazista. A quest�o �: far� uma inflex�o nos rumos da pasta ou seguir� a mesma orienta��o?
No governo Bolsonaro, a fronteira entre o conservadorismo e o reacionarismo � muito sinuosa, por�m, j� foi atravessada nas �reas da educa��o, cultura, direitos humanos e meio ambiente. Agora, o que foi barrado pela forte rea��o da opini�o p�blica, do mundo art�stico-cultural, da imprensa e at� mesmo de setores militares no governo foi a narrativa fascista, que orienta a deriva contra a democracia de setores do governo. A crise provocada por Ricardo Alvim, ao reproduzir em v�deotrechos de um discurso de Joseph Goebbels, o ministro da Cultura e Propaganda de Adolf Hitler, levou-o � demiss�o, a contragosto do presidente. Pouco antes do “sinceric�dio”, numa “live”, Bolsonaro havia elogiado o seu ent�o secret�rio de Cultura, que estava ao seu lado.
O epis�dio serviu para corroborar a narrativa dos setores da oposi��o que caracterizam o governo como fascista ou protofascista, ou seja, que denunciam a fascistiza��o do pa�s. Essa � uma discuss�o muito relevante por todas as suas implica��es. Em todas as crises do governo, at� agora, o que se viu foi um recuo de Bolsonaro diante das rea��es da sociedade civil e dos demais poderes da Rep�blica. No caso de Ricardo Alvim, esse recuo se deu em menos de 48 horas, ap�s os presidentes da C�mara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), terem solicitado a demiss�o de Alvim, al�m das cr�ticas do presidente Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli, e da opini�o p�blica nas redes sociais, principalmente no Twitter, o principal instrumento de comunica��o direta de Bolsonaro com a sociedade. Ou seja, nesses momentos a democracia se fez mais forte do o presidente da Rep�blica.
Bonapartismo
A narrativa reacion�ria e chauvinista n�o basta para caracterizar um governo fascista, a rigor, uma ditadura aberta, que recorre ao terror de Estado para esmagar a oposi��o. A express�o protofascista carrega ideia err�nea de inevitabilidade da fascistiza��o do regime pol�tico, porque proto significa primeiro ou o que antecede. Essa discuss�o n�o � nova. Historicamente, ocorreu na Alemanha da Rep�blica de Weimar, �s v�speras da ascens�o de Hitler ao poder, quando os espartaquistas (comunistas) liderados por Rosa Luxemburgo e Karl Liebeneck chamavam a Social-Democracia Alem� de social fascista, abrindo caminho para a ascens�o do Partido Nazista.
Aqui no Brasil, situa��o semelhante ocorreu em pleno Estado Novo, de clara inspira��o fascista, mas o Brasil acabou entrando na II Guerra Mundial ao lado dos Aliados, porque, em seu interior, os american�filos liderados por Osvaldo Aranha, Amaral Peixoto e Gustavo Capanema demoveram o ditador Get�lio Vargas e isolaram os simpatizantes do Eixo, encabe�ados por Francisco Campos, G�is Monteiro e Filinto M�ller.Agora, Ricardo Alvim ofendeu a mem�ria da For�a Expedicion�ria Brasileira (FEB), que lutou nos campos da It�lia contra o nazifascismo, da� a rea��o dos militares que integram o governo, que tamb�m pediram sua cabe�a.
O governo Bolsonaro tem caracter�sticas bonapartistas, ou seja, preserva autonomia relativa e se coloca acima das classes sociais, embora sua pol�tica econ�mica esteja alinhada ao mercado financeiro. Ao confundir alhos com bugalhos, a oposi��o unifica o governo e acaba, ela sim, se isolando. De certa forma, a presen�a de Regina Duarte na Secretaria da Cultura pode representar o fim da ofensiva obscurantista e reacion�ria contra a classe art�stica, e n�o o contr�rio. Trocando em mi�dos, pode ser pior sem ela.